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Capítulo 04.pdf - PUC Rio

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299<br />

elementos comuns entre o livro do brasileiro e Os irmãos Serapião, especialmente<br />

presentes no conto Doge und dogaresse, lido provavelmente em versão francesa, já que<br />

o jovem autor não dominava a língua alemã. As parescências sobressaíam na história<br />

narrada por Bertram, na qual o motivo do casamento de uma mocinha com um homem<br />

mais velho, chefe de uma corveta, dissolvia-se no mar tempestuoso com o embarque de<br />

um estranho. 262 Outras tramas do autor alemão assemelhavam-se estruturalmente à<br />

construção dramática criada por Álvares de Azevedo, abrindo perspectivas de analogias<br />

para além do nível temático, como, por exemplo, a forma como o conto O magnetizador<br />

fora introduzido por uma longa discussão filosófica antes da entrada das inúmeras<br />

versões em torno do estranho médico mesmerizador, Alban, algo muito próximo do<br />

capítulo inicial escrito pelo inventor de Macário.<br />

Noite na taverna começava com um diálogo no qual se expunha, através do<br />

choque de idéias, os valores filosóficos encampados pelo autor, característica<br />

compartilhada pela prosa romântica de maneira geral. Os rompimentos dos limites<br />

entre a filosofia e a poesia tornaram naturais as interseções de ambas as formas do<br />

discurso no corpo da prosa romântica. 263 No prólogo, Álvares de Azevedo teve a chance<br />

de provar que seu mundo imaginário nutria-se com bastante proveito das grandes<br />

questões estampadas nas folhas culturais, especialmente dos tópicos presentes nos<br />

estudos em teoria do conhecimento vinculados pelo espiritualismo eclético. No<br />

ambiente fechado de uma birosca, o autor brasileiro construiu cenograficamente um<br />

microcosmo muito ilustrativo dos debates reunidos pela imprensa do período, como a<br />

Polêmica dos cegos do Marmota fluminense ou as provocações de João da Veiga Murici<br />

de O crepúsculo.<br />

262 “A despeito dessas simetrias temáticas, e não obstante a afinidade que o próprio Azevedo sentia em<br />

relação a Hoffmann, cada um dos dois autores tem uma índole literária própria. Hoffmann – em Doge und<br />

Dogaresse, como em outros textos – discute como a sociedade, munida de sua dogmática visão da moral<br />

e dos costumes, tolhe o indivíduo e esse se vê privado de seu amor e de sua realização pessoal, tendo de<br />

sujeitar-se a determinações de cunho materialista. Mas, se em Hoffmann temos um momento de supremo<br />

amor, em Azevedo estamos diante de um encontro carnal. Enquanto Hoffmann tematiza a esperança de<br />

dois amantes (que acaba malograda), Azevedo preocupa-se essencialmente em apresentar um quadro de<br />

ceticismo, de descrença, de afrontas e maldições – enfim, a expressão de um satanismo byroniano”.<br />

VOLOBUEF, “E.T.A. Hoffmann e o romantismo brasileiro”, op. cit., p.5.<br />

263 Friedrich Schlegel, no fragmento 60 da revista Lyceum, defendeu para a prosa romântica uma busca<br />

incessante pelo absoluto, uma dissolução dos gêneros em favor de formas híbridas que comportassem<br />

todos os elementos para a formação de uma “poesia universal”. O conto, mas especialmente o romance,<br />

possuía a estrutura sintagmática para abarcar a proposta totalizante. Segundo Volobuef, “Schlegel<br />

concebe o romance como uma forma de contornos indefinidos e elásticos, capaz de abarcar tudo –<br />

lirismo, filosofia, retórica, ciência, crítica, fantasia, Natureza, humor, grotesco etc. Conseqüentemente, o<br />

romance romântico rejeita a linearidade, a clareza e a objetividade clássicas, preferindo conferir ao texto<br />

uma multiplicidade de formas e estilos, uma amplitude e distensão ‘enciclopédica’, que refletem a<br />

vastidão do indivíduo criador”. VOLOBUEF, Frestas e arestas, op. cit., p. 41.

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