Capítulo 04.pdf - PUC Rio
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198<br />
remordimentos de consciência diante do pecado. 28 Na época em que lecionava no<br />
Seminário São José, as iluminações do escritor haviam sido indexadas ao pensamento<br />
liberal cristão francês (De Maître, De Bonald, Lamennais, de Gerbert, Falloux e<br />
Frederico Ozanam) 29 , cujos esforços dialéticos almejavam novas fórmulas de integração<br />
entre religião e cultura. 30 Deduzindo a concepção de vida religiosa pela atuação firme e<br />
pessoal de indivíduos, imbuídos de gênio, personalidade, a evolução da igreja passou a<br />
ser uma galeria de vultosos campeões da fé. Conforme as palavras de Cândido:<br />
Não espanta, pois, que a religião lhe haja parecido como experiência, como emoção e<br />
modo de sentir. Uma das suas teclas preferidas é justamente que o Cristianismo veio<br />
completar as necessidades da alma, proporcionando ensejos de amar e, assim,<br />
experimentar a emoção em sua plenitude. “O coração tinha necessidade de emoções que<br />
fixassem o vago dos seus desejos e saciassem completamente esta sede inextinguível de<br />
gozar, que faz sua ventura e seu tormento” (“Panegírico de São Sebastião”). O homem<br />
se apega, pois, ao Catolicismo, não apenas pelos motivos éticos e metafísicos, mas,<br />
porque faz vibrar nele essa corda de sentimentos inefáveis, que definem o que há de<br />
próprio e incomunicável na experiência individual. Daí um conceito bastante romântico<br />
de religião como harmonia, mistério, exaltação – acrescentando à devoção um elemento<br />
mais flexível e gratuito, quase uma atitude estética. 31<br />
Pulsava sob a constituição do princípio de individualidade propagado nos<br />
sermões e documentos pessoais de Monte Alverne experiências de leitura variadas,<br />
adquiridas paralelamente à recepção de O gênio do cristianismo. A ordem dos<br />
franciscanos, à qual o sermonista fazia parte, desde o século XVIII adquirira prática<br />
contínua no estudo experimental, abdicando de uma análise eminentemente escolástica<br />
dos fenômenos naturais. Desde 1776 já havia modificado totalmente seu ensino<br />
conforme o estipulado pela reforma do Marquês de Pombal, de modo que em 1798<br />
padres como Azeredo Coutinho podiam criar iniciativas como a do Seminário de<br />
Olinda, referência na pedagogia ilustrada, ministrando cursos de retórica, matemática,<br />
28<br />
CHATEAUBRIAND. Le génie du christianisme. Paris: Librairie Hachette, 1906.<br />
29<br />
LARA, Tiago Adão. As raízes cristãs do pensamento de Antônio Pedro de Figueiredo. Londrina:<br />
Editora UEL, 2001, p. 19.<br />
30<br />
“Antes de tudo, sublinhemos a sua personalidade romântica, esteio do fascínio exercido sobre os<br />
contemporâneos. Homens fogosos e apaixonados, capazes de tornar contagiosa a própria emoção foram,<br />
por exemplo, Frei Sampaio e Cônego Januário. Em Monte Alverne, porém, acresce o culto do próprio eu<br />
e a necessidade de torná-lo público. Nos sermões onde parece realmente empenhar-se há uma procura de<br />
efeitos pessoais, de referências ou alusões à sua capacidade, tanto quanto permite um gênero em que<br />
orador cristão deve, teoricamente, pôr-se à margem. De tal modo, que mesmo nas costumeiras afirmações<br />
profissionais de indignidade e desvalia o eu apenas se abaixa para subir mais alto, reinvindicando o ‘lugar<br />
de honra em que devem aspirar’ os pregadores, como diz no exórdio do ‘Panegírico de São Domingos’.<br />
No ‘Sermão sobre a palavra de Deus’ podemos avaliar o alto sentido que atribuía à carreira do púlpito ‘o<br />
ministério sublime’, referido no ‘Sermão sobre o pequeno número dos escolhidos’”. CÂNDIDO, op. cit,<br />
p. 273.<br />
31<br />
Idem, p. 274.