Capítulo 04.pdf - PUC Rio
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293<br />
autores contemporâneos, como Roberto de Souza Causo a Karin Volobuef, o livro de<br />
contos publicado postumamente tem sido reconhecido como a ponte mais bem acabada<br />
do romantismo brasileiro com as experiências narrativas deflagradoras de um estado<br />
limítrofe, dentro do qual as criaturas distorciam-se para o deleite de um olhar<br />
sonambúlico ou embriagado.<br />
O autor de Noite na taverna também obteve um lugar de destaque quando se<br />
buscou afinidades formais com as excentricidades narrativas de Hoffmann, autor citado<br />
logo no primeiro capítulo do conto-romance (“Uma noite no século”) e a cuja presença<br />
o autor de Se eu morresse amanhã fazia questão de recorrer em vários momentos de sua<br />
obra. Guimarães Jr., um dos seus biógrafos, chegou a afirmar que Álvares de Azevedo<br />
era mais hoffmanniano do que o próprio Hoffmann, por exagerar nas “manifestações de<br />
sonambulismo, espectros, aparições arrepiantes, raptos, crimes monstruosos, passes<br />
magnéticos, elixires mágicos, velhos castelos misteriosos”, e outros maneirismos<br />
conhecidos deste tipo de literatura denominada na França como “frenética”. 248<br />
Por ver seu nome ligado tão visceralmente a Hoffmann, em especial nos<br />
momentos em que enveredou pela prosa de ficção, Álvares de Azevedo acabou, de<br />
quebra, atraindo para si todo um repertório ligado à recepção crítica do autor nos<br />
periódicos e revistas europeus. Desde que começaram a ser publicados na França, em<br />
1828, os contos do alemão foram interpretados à sombra de uma biografia tendente às<br />
extravagâncias de uma personalidade nervosa e sujeita aos delírios advindos com o uso<br />
indiscriminado do álcool. 249 A reação negativa a sua prosa desmedida partiu<br />
inicialmente dos próprios “colegas de trabalho”, pois Goethe considerava-o mais um<br />
caso patológico do que um autor sublime, e a campanha insistente de Walter Scott<br />
contra o escritor, iniciada em 1827 no ensaio On the supernatural in fictious<br />
composition; and particularly on the works of Ernest Theodor William Hoffmann, só<br />
somaram no sentido de impor uma imagem fora dos padrões “clássicos” para o criador<br />
de O homem de areia 250 :<br />
podia conhecer Álvares de Azevedo. Entretanto, ou por isso mesmo, a sua originalidade. Toda a<br />
perversidade do amor aí está: todas as fatalidades possíveis da vida, também”. PEIXOTO, Afrânio. “A<br />
originalidade de Álvares de Azevedo”, Apud VOLOBUEF, E.T.A. Hoffmannn e o romantismo brasileiro,<br />
op. cit., p. 3.<br />
248<br />
JÚNIOR, R. Magalhães Jr. Poesia e vida de Álvares de Azevedo. São Paulo: Editora das Américas,<br />
1962, p. 122.<br />
249<br />
BATALHA, Maria Cristina. “A importância de Hoffmann na cena romântica francesa”. Revista Alea<br />
vol. 5 número 2, <strong>Rio</strong> de Janeiro, Julho/dezembro de 2003.<br />
250<br />
“Scott associe ce fantastique mode à l’oeuvre de lécrivain allemand E.T.A. Hoffmann dont le<br />
tempérament et les habitudes lui auraient provoqué um élan d’originalité et de bizarrerie très vifs, qui<br />
expliqueraient cette tendance vers l’irrégularité. Même l’incertitude et la nature précaire de son existence