Capítulo 04.pdf - PUC Rio
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explícita a uma cultura liberal e a entrada viciosa nos círculos do apadrinhamento cortês<br />
expunha os desajustes presentes na recepção dos produtos expressivos da modernidade<br />
e a condição paradoxal daqueles que, escrevendo muitas vezes em primeira pessoa,<br />
forçavam o verbo no sentido de conjugá-lo a interesses de uma coletividade<br />
escravocrata, enfunada na burocracia imperial. Os arroubos de uma personalidade<br />
marcante, especialmente no nível ficcional, deveriam ser cuidadosamente dosados de<br />
modo a não anular a conseqüente moralidade e os desligamentos momentâneos da<br />
psique amarrados novamente sobre o corretivo após a efêmera aparição inquietante. Por<br />
isto, as fantasmagorias, em grande parte das vezes, acabavam escondidas pela série de<br />
reservas amotinadas para impedir o seu fluxo inconstante e elíptico.<br />
Se levarmos adiante a busca de índices mais contrastados desta aparição<br />
espectral e de seus desdobramentos narrativos, devemos observar obras cujo<br />
acabamento soube melhor experimentar os desvios perceptivos causados na absorção do<br />
“realismo filosófico” pelas ficções em prosa brasileiras. Foi justamente na década de<br />
1850, no momento em que Joaquim Manuel de Macedo escrevia “eu digo as coisas<br />
como elas são; só existe uma coisa no mundo: é o Eu”, que se publicavam os escritos<br />
mais representativos da fantasmagoria. Um deles vinha à luz três anos após a morte de<br />
seu autor, justamente no ano de publicação de O sobrinho de meu tio: o livro de contos<br />
Noite na taverna, de Álvares de Azevedo.<br />
4.11-Noite na taverna<br />
Por mais que se tente ampliar o espectro do fantástico pela contextualização de<br />
obras aparentemente tão distantes do estilo, os olhos sempre acabam se voltando para<br />
aquela peça unanimemente festejada como o modelo do gênero no Brasil. Noite na<br />
taverna adquiriu um lugar de destaque nos esforços para o encontro de uma escritura<br />
que dignificasse os recursos fantasmais vastamente utilizados na Alemanha, na França,<br />
nos Estados Unidos, admitindo o país nas vertigens de imagens peregrinas do<br />
sobrenatural para o cientificismo próprio a modernidade. De Afrânio Peixoto 247 a<br />
247 “Noite na taverna é um conto fantástico e um conto perverso: aí duas influências explícitas citadas – de<br />
Byron, dominante na perversidade, de Hoffmann, na fantasia –, que não chega ao mistério, mas vai até a<br />
fatalidade, que assombra. Sem que se possa derivar, como fonte, há similitudes, precedências,<br />
concordâncias, com o maravilhoso do gênero, que fazem pensar em Gerardo de Nerval, Edgard Poe,<br />
Gautier, Merimée, Villiers de L´lisle Adam, que provavelmente uns, certamente outros, não conheceu ou