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A CULTURA E SEU CONTRÁRIO TC def.pmd

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na palavra poética do jazzista Dexter Gordon, as identidades dos que<br />

gostam de estar alone together, sozinhos porém junto de seus iguais<br />

que são diferentes dos outros sem os quais não há a mútua validação<br />

que é o sal da identidade (e como arde, às vezes, esse sal...).<br />

Alguém bem situado para falar de identidade, como Edward Said,<br />

por estar envolvido numa questão identitária pessoal (nasceu no Egito,<br />

de família cristã, educou-se nos códigos ocidentais e reside no ocidente)<br />

e por <strong>def</strong>ender uma identidade coletiva que vê ameaçada (a palestina),<br />

manifesta-se de forma incisiva sobre a questão: “Uma das coisas que<br />

considero, não diria mais repelente mas, em todo caso, antagonística,<br />

é a identidade. Quer dizer, a noção de identidade única. O que me<br />

interessa, e aquilo sobre o que escrevo, é a identidade múltipla, a<br />

polifonia de muitas vozes jogando-as umas contra as outras sem<br />

precisar reconciliá-las, fazendo apenas o suficiente para mantê-las<br />

juntas”. 32 Outro modo de falar em identidades flutuantes numa cultura<br />

flutuante. As identidades polifônicas na verdade já começam a existir<br />

nestes tempos de globalização. As migrações aceleradas para a Europa<br />

e para os EUA colocam os imigrantes num estado de tensão mas seus<br />

descendentes imediatos, numa situação de possível polifonia<br />

identitária. A reação a esse fenômeno nem sempre entusiasma os mais<br />

conservadores. Em lugar de aceitar a polifonia como uma das coisas<br />

mais positivas e um instrumento dos mais encantadores para o<br />

desdobramento da personalidade e da cultura — e não se deve olvidar<br />

a voz de Montesquieu 33 dizendo que nossa maior obrigação para<br />

conosco é ampliar a esfera de presença de nosso ser — em vários países,<br />

mesmo no aberto Canadá (aberto nos termos da realidade anglo-galesa),<br />

começam a vir à tona aspectos inquietantes desse deslocamento,<br />

realocação e re<strong>def</strong>inição de identidades. Em contrarreação, as<br />

comunidades étnicas minoritárias (ainda minoritárias) nesses países,<br />

em vez de superarem a questão do território cultural e passarem a<br />

participar de um espaço cultural mais amplo, como aquele do cozinheiro<br />

ou do vinicultor na TV, e que é sem dúvida nosso futuro lugar comum,<br />

começam a acreditar que o problema é preservar, contra as<br />

depredações intencionais do Outro ou contra as corrosões naturais<br />

provocadas pela dinâmica cultural contemporânea, uma identidade<br />

própria que é agora pouco mais que mera ficção. Mesmo assim, a<br />

aceleração rumo a uma identidade polifônica é uma realidade por toda<br />

parte.<br />

32 Edward Said, Power, Politics and Culture, Nova York: Vintage Books, 2002.<br />

33 No ensaio sobre O gosto, publicado na Encylopédie; editado pela Iluminuras, São Paulo, sob<br />

o título O gosto, em 2005.<br />

UMA <strong>CULTURA</strong> PARA O SÉCULO 65<br />

POLIFONIAS<br />

NO LUGAR DO<br />

TERRITÓRIO<br />

<strong>CULTURA</strong>L,<br />

O ESPAÇO<br />

<strong>CULTURA</strong>L

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