10.05.2013 Views

A CULTURA E SEU CONTRÁRIO TC def.pmd

A CULTURA E SEU CONTRÁRIO TC def.pmd

A CULTURA E SEU CONTRÁRIO TC def.pmd

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Brasil é coisa bem recente) embora tenham sido postos de lado por<br />

alguns pesquisadores mais jovens e por um autor senior “alternativo”,<br />

digamos, no quadro teórico brasileiro, como Roberto Da Matta, que<br />

corretamente insistiu mais na abordagem relacional dos componentes<br />

da cultura brasileira e na <strong>def</strong>esa da necessidade de se considerarem<br />

dois sistemas de valor paralelos, como o de nação e sociedade e o de<br />

espaço público e privado, do que nas lógicas de oposição e exclusão do<br />

tipo “ou...ou” (uma coisa ou outra, nunca as duas ao mesmo tempo),<br />

que ele substitui, talvez sem dizê-lo expressamente, pela lógica pósmoderna<br />

do “e...e” (uma coisa e outra, ao mesmo tempo). Eu iria um<br />

pouco mais longe do que Da Matta ao considerar insuficiente a ideia de<br />

que, para recusar a lógica dualística tradicionalmente aplicada ao estudo<br />

da cultura brasileira, basta dizer que a verdade está no terceiro excluído<br />

desse jogo de opostos. 30 Atrevo-me a contestar também como<br />

fundamental para a cultura brasileira a pergunta no entanto sempre<br />

reafirmada e revalidada por ensaístas: “Mas afinal, quem sou eu?” Para<br />

justificar este duplo ponto de vista será preciso insistir, rapidamente,<br />

em dois ou três dos principais traços da cultura contemporânea, que é<br />

flutuante e móvel ou praticamente não é. E com isso voltamos ao<br />

momento em que a cultura começou a revelar-se, um pouco por toda<br />

parte, no esplendor de sua flutuação.<br />

* * *<br />

Uma rápida volta ao passado, para depois seguir adiante. Ao longo<br />

dos anos 60, sobretudo após o golpe militar de 64, a cultura brasileira<br />

parecia um navio atracado no porto. Um navio com as âncoras descidas<br />

e a proa e popa firmemente amarradas ao cais por cordas poderosas.<br />

Como as águas do porto são rasas — e tão mais rasas em tempos de<br />

ditadura, quando se procura retirar de todos os líquidos vitais o máximo<br />

que podem conter de alimento e sustentação — esse barco da cultura<br />

brasileira praticamente não balançava, e certamente não se movia. Era<br />

assim que o comandante de direita desse barco, depois de 64, queria<br />

vê-lo: firmemente preso, parado. Como o barco era muito grande e o<br />

comandante não podia controlar todos seus recantos ao mesmo tempo,<br />

sobretudo quando algum piloto de algumas das esquerdas conseguia<br />

infiltrar-se no navio, nem tudo corria dentro dele como queria o militar<br />

de plantão. É verdade, de passagem, que era igualmente assim que<br />

30 Roberto Da Matta, “For an anthropology of the Brazilian tradition or ‘A virtude está no<br />

meio’”, in The Brazilian puzzle: culture on the borderlands of the Western World, David J.<br />

Hess e Roberto A. Da Matta (eds.). Nova York: Columbia University Press, 1995.<br />

UMA <strong>CULTURA</strong> PARA O SÉCULO 59<br />

UMA <strong>CULTURA</strong><br />

INCLUSIVA

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!