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A CULTURA E SEU CONTRÁRIO TC def.pmd

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Embora se procure evitar esta discussão, o que está por trás desse<br />

fenômeno de cópia de um modo de vida é a ideia ou sensação de<br />

superioridade de uma cultura em relação a outras, pelo menos sob<br />

alguns aspectos. E é esse sentimento que hoje põe em xeque,<br />

mostrando suas limitações, o conceito de cultura como podendo<br />

dispensar, para entender-se o que se passa nesse campo, o recurso à<br />

ideia de civilização 13 . No mínimo, torna-se inevitável constatar que a<br />

cultura mostra-se como o outro lado da civilização, e como o outro<br />

lado quase necessariamente negativo da civilização, o outro lado em<br />

negativo da civilização assim como se fala no positivo e no negativo de<br />

uma foto — sejam quais forem a cultura e a civilização em questão.<br />

Torna-se hoje sempre mais presente a possibilidade de admitir-se não<br />

apenas como inevitável mas também talvez aceitável, se não a diluição<br />

das culturas, isto é, das culturas locais, nacionais, identitárias, em<br />

favor do adensamento de um ideal civilizatório global, pelo menos<br />

a íntima convivência física, real, concreta, de umas com as outras —<br />

como ocorre no Japão, onde o cultural mais arcaico posiciona-se ao<br />

lado do civilizatório pós-moderno mais radical, não sem espanto e<br />

estranhamento porém sem conflito insuperável. Diluição não quer dizer<br />

desaparecimento mas exatamente aquilo que o nome indica em seu<br />

significado técnico primeiro: diminuição da concentração de alguma<br />

coisa mediante a adição de alguma outra coisa; esmaecimento de<br />

alguns tons diante de outros; interpenetração entre uns e outros ao<br />

passo em que outros ainda permanecem com seus matizes atuais, em<br />

estreita interação com outros tantos. Esse sempre foi o objetivo de<br />

muitos internacionalismos, o católico e o socialista tanto quanto o de<br />

muitos entendimentos da arte. Enquanto isso não ocorre, o confronto<br />

entre culturas distintas (na direção do que uma delas considera uma<br />

forma civilizacional mais apropriada, embora contestada pela outra ou<br />

outras), não tem como ser negado. A recente promulgação, em janeiro<br />

de 2004, de uma lei na França proibindo o uso do véu islâmico nas<br />

escolas públicas do país é um reflexo desse conflito de culturas, senão<br />

de civilizações, que um certo hábito de pensar politicamente correto<br />

procura negar e que configura no entanto uma realidade cada vez<br />

13 No sentido em que a ideia de civilização sempre inclui a noção de um conjunto de valores<br />

em crescimento que levam ao “desenvolvimento do espírito em direção à liberdade”,<br />

nos termos de J. Burckhardt (e que poderiam ser os termos de muitos outros). Para<br />

alguns, o estudo de uma cultura deveria estar isento de juízos de valor, de críticas<br />

valorativas. Essa é a posição dos relativistas culturais, para quem todas as culturas seriam<br />

ou estariam igualmente “corretas”, e para os quais a ideia de um desenvolvimento, de<br />

uma progressão do espírito em relação à liberdade é uma ideia complicada ou mesmo<br />

inadmissível a não ser no interior de uma mesma cultura e segundo seus próprios<br />

termos...<br />

NEM TUDO É <strong>CULTURA</strong> 39<br />

<strong>CULTURA</strong><br />

E<br />

CONFLITO

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