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ANAIS DO<br />
IV SIMPÓSIO NACIONAL DOS PROFESSORES<br />
UNIVERSITÁRIOS DE HISTÓRIA<br />
Organizado pelo PROF. EURÍPEDES SIMÕES DE PAULA<br />
E<br />
XXXI<br />
Coleção <strong>de</strong> Revista <strong>de</strong> História sob<br />
a direção do Prof. Eurípe<strong>de</strong>s<br />
Simões <strong>de</strong> Paula.<br />
São Paulo<br />
1969
AS MIGRAÇOES NUMA CONJUNTURA CRíTICA:<br />
A PROPóSITO DOS MOVIMENTOS DE<br />
POPULAÇÃO NO FIM DA<br />
IDADE MÉDIA (*).<br />
VICTOR DEODATO DA SILVA<br />
Instrutor da Ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> História da Civilização Antiga<br />
e Medieval da Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Filosofia, Ciências e Letras<br />
da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo (SP).<br />
S<strong>em</strong> preten<strong>de</strong>rmos expor <strong>de</strong> forma sist<strong>em</strong>ática uma teoria concernente<br />
ao conhecimento histórico <strong>de</strong>sejaríamos, porém, reafirmar<br />
o relativismo inevitável <strong>de</strong> que êste se reveste. Com efeito, cada época<br />
t<strong>em</strong> dos vários períodos do passado uma visão própria que reflete<br />
<strong>em</strong> gran<strong>de</strong> parte os probl<strong>em</strong>as e preocupações do presente. Se tal<br />
fato, por um lado, po<strong>de</strong>ria aos olhos <strong>de</strong> alguns, que têm da ciência uma<br />
concepção excessivamente rígida, comprometer <strong>de</strong>finitivamente o caráter<br />
científico da história, <strong>de</strong> outro autoriza a afirmação da inesgotabilida<strong>de</strong><br />
do estudo do passado. Mas, ao mesmo t<strong>em</strong>po <strong>em</strong> que as maneiras<br />
<strong>de</strong> ver o passado se renovam constant<strong>em</strong>ente entre os que trabalham<br />
na t<strong>em</strong>ática histórica no nível da especialização e pesquisa, há<br />
uma estranha persistência <strong>de</strong> certas idéias feitas e esqu<strong>em</strong>as consagrados,<br />
mesmo entre pessoas que têm na história a sua ativida<strong>de</strong> profissional.<br />
S<strong>em</strong> preten<strong>de</strong>rmos que êles sejam mais raros <strong>em</strong> outros setores<br />
do conhecimento histórico, não hesitar<strong>em</strong>os <strong>em</strong> afirmar que os<br />
"clichés" são particularmente numerosos relativamente à história medieval.<br />
Assim, por ex<strong>em</strong>plo, ainda são numerosos aquêles que insist<strong>em</strong><br />
<strong>em</strong> afirmar o caráter estático da socieda<strong>de</strong> medieval, ten<strong>de</strong>ndo a ver<br />
na tendência estamental da organização social uma impermeabilida<strong>de</strong><br />
entre as várias camadas da população apenas menos acentuada<br />
do que a vigente num sist<strong>em</strong>a <strong>de</strong> castas. Ora, tal impermeabilida<strong>de</strong><br />
não existiu <strong>em</strong> nenhuma fase da Ida<strong>de</strong> Média e, inclusive, os mecanismos<br />
<strong>de</strong> formação dos vários grupos sociais b<strong>em</strong> como os processos<br />
(*). - Comunicação apresentada na 2" sessão <strong>de</strong> estudos, no dia 4 <strong>de</strong> set<strong>em</strong>bro<br />
<strong>de</strong> 1967 (Nota da Redação).<br />
(1). - Entre os trabalhos pioneiros convém mencionar as páginas magistrais<br />
<strong>de</strong> Marc Bloch, presentes <strong>em</strong> quase tôdas as suas obras, por ex<strong>em</strong>plo:<br />
La Société Féodale, Paris,<br />
Anais do IV Simpósio <strong>Nacional</strong> dos Professores Universitários <strong>de</strong> História – ANPUH • Porto Alegre, set<strong>em</strong>bro 1967
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<strong>de</strong> transferência <strong>de</strong> indivíduos <strong>de</strong> uma para outra camada da população<br />
têm sido recent<strong>em</strong>ente objeto recent<strong>em</strong>ente <strong>de</strong> estudos sist<strong>em</strong>áticos<br />
(1).<br />
Tal visão estática está igualmente presente na tendência a insistir<br />
no imobilismo espacial das populações medievais, ao menos <strong>em</strong><br />
certas fases e presente, por ex<strong>em</strong>plo, na noção do servo ligado à<br />
gleba. Ora, ao contrário do que se preten<strong>de</strong> por vêzes ainda <strong>em</strong> nossos<br />
dias, <strong>em</strong> todo o transcurso da época medieval a <strong>de</strong>slocação <strong>de</strong> indivíduos,<br />
ou <strong>de</strong> pequenos grupos <strong>de</strong> pessoas ou <strong>de</strong> massas consi<strong>de</strong>ráveis<br />
<strong>de</strong> população s<strong>em</strong>pre foi assaz intensa. Como afirma pertinent<strong>em</strong>ente<br />
<strong>em</strong> livro recente o medievista francês Le Goff: "la société médiévale a<br />
été s<strong>em</strong>i-noma<strong>de</strong>" (2).<br />
•<br />
No que diz respeito à chamada alta Ida<strong>de</strong> Média (período que,<br />
seguindo as convenções obe<strong>de</strong>cidas pela historiografia oci<strong>de</strong>ntal, caracterizar<strong>em</strong>os<br />
como aquêle compreendido entre os séculos V e X,<br />
grosseiramente) parece-nos não haver maiores dúvidas visto ser o<br />
mesmo predominant<strong>em</strong>ente caracterizado por sucessivas vagas migratórias<br />
<strong>de</strong> massas consi<strong>de</strong>ráveis <strong>de</strong> população, migrações essas vulgarmente<br />
<strong>de</strong>nominadas "invasões". Essas sucessivas vagas invasoras<br />
provocaram profundas e freqüent<strong>em</strong>ente duradouras alterações na<br />
fisionomia étnico-cultural da Europa, Ásia oci<strong>de</strong>ntal e norte da África,<br />
não só pela pressão entre povos migradores, mas também dêstes<br />
sôbre as populações das regiões ocupadas, freqüent<strong>em</strong>ente forçadas<br />
também a se <strong>de</strong>slocar<strong>em</strong>. Como casos clássicos, l<strong>em</strong>braríamos a fuga<br />
dos bretões, acossados pelos jutos e anglo-saxões, para o País <strong>de</strong><br />
Gales, Escócia e Armórica gauleza, ou ainda o das populações íberovisigóticas<br />
que, pressionadas pelos conquistadores muçulmanos, se<br />
refugiaram nos Pirineus. A partir dos meados do século XI verificou-se,<br />
porém uma crescente rarefação <strong>de</strong> tais formas migratórias,<br />
que tinham colocado <strong>em</strong> plano secundário outras formas <strong>de</strong> <strong>de</strong>sloca-<br />
volume; Seigneurie Française et Manoir Anglais, capo 1, pp. 23 sqq.; o<br />
capo para a The Cambridge Economic History of Europe, "The rise of<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nt cultivation and seigniorial institutions", Cambridge, 1941, pp.<br />
224-277. Mais recentes, os artigos <strong>de</strong> Léopold Génicot publicado nos<br />
Annales. Economies. Sociétés. Civilisations. Paris, ano XVII, n Q 1,<br />
jan.-fev. 1962, La noblesse au Moyen Age dans l'ancienne "Francie",<br />
pp. 1-22, e nos Comparative Studies in Society and History, tomo V.,<br />
n Q 1 out.-<strong>de</strong>z. 1962, La noblesse au moyen age dans l'ancienne "Francie".<br />
Continuité, rupture ou évolution?, pp. 52-59.<br />
(2). - La Civilisation <strong>de</strong> l'Occi<strong>de</strong>nt Médiéval, Paris, 1965, p. 13 e tb. pp. 172<br />
sqq. Em La Société<br />
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ção <strong>de</strong> indivíduos ou grupos. Estas, por fôrça <strong>de</strong> um aumento do<br />
índice <strong>de</strong> segurança, ganharam um nôvo impulso e a elas aos poucos<br />
se somaram novas modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> migração.<br />
Antes <strong>de</strong> enumerá-las <strong>de</strong>sejaríamos fazer algumas consi<strong>de</strong>rações<br />
sôbre as relações entre a d<strong>em</strong>ografia e as migrações. A teoria do<br />
espaço vital, <strong>de</strong>senvolvida por Ratzel e outros geógrafos do século<br />
passado e primeira meta<strong>de</strong> do atual, levaram freqüent<strong>em</strong>ente a uma<br />
associação estreita, quase <strong>de</strong>terminante, entre <strong>em</strong>igração e incr<strong>em</strong>ento<br />
d<strong>em</strong>ográfico. Tal noção t<strong>em</strong> sido contrariada <strong>em</strong> muitos casos concretos<br />
e, inclusive, no caso <strong>em</strong> exame estamos <strong>em</strong> presença <strong>de</strong> um<br />
caso <strong>de</strong> movimentação <strong>de</strong> populações provocada por uma verda<strong>de</strong>ira<br />
catástrofe d<strong>em</strong>ográfica, pelo menos <strong>em</strong> gran<strong>de</strong> parte. Todavia, no<br />
concernente às <strong>de</strong>slocações <strong>de</strong> populações verificadas a partir do<br />
século XI, cumpre salientar a existência <strong>de</strong> uma assaz pon<strong>de</strong>rável<br />
motivação d<strong>em</strong>ográfica. Não obstante a falta <strong>de</strong> cifras (por tratarse<br />
<strong>de</strong> época situada <strong>em</strong> pleno coração da ida<strong>de</strong> pré-estatística), hoje<br />
já não há mais lugar para dúvidas quanto a um notável incr<strong>em</strong>ento<br />
populacional a partir do século XI.<br />
A mais clara manifestação evi<strong>de</strong>nciadora <strong>de</strong> tal tendência, e<br />
que permitirá a retomada <strong>de</strong> nosso t<strong>em</strong>a específico, é um consi<strong>de</strong>rável<br />
movimento <strong>de</strong> arroteamentos que transformou <strong>em</strong> terrenos agrícolas,<br />
amplas extensões <strong>de</strong> terra ocupadas por florestas e pântanos,<br />
modificando consi<strong>de</strong>ràvelmente a paisag<strong>em</strong> agrária da Europa Oci<strong>de</strong>ntal,<br />
acompanhando-se da <strong>de</strong>slocação <strong>de</strong> massas consi<strong>de</strong>ráveis <strong>de</strong><br />
população (3). O aumento da produção agrícola, simultâneo a uma<br />
melhora consi<strong>de</strong>rável nas condições <strong>de</strong> segurança forneceu aos comerciantes<br />
uma maior quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mercadorias e também mais<br />
clientes, tendo aquêles ainda as suas fileiras aumentadas pela absorção<br />
crescente <strong>de</strong> el<strong>em</strong>entos da parte ociosa dos exce<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> população.<br />
:E:stes forneceram ainda o principal contigente dos artezãos<br />
cujo número aumentou consi<strong>de</strong>ràvelmente. Artezãos e comerciantes<br />
se constituiram nos el<strong>em</strong>entos característicos das cida<strong>de</strong>s renascentes,<br />
ainda que, dado o aspecto rústico das cida<strong>de</strong>s medievais, não<br />
se <strong>de</strong>va minimizar o papel dos camponeses. Igualmente o florescimento<br />
urbano implicou na <strong>de</strong>slocação <strong>de</strong> quantida<strong>de</strong>s consi<strong>de</strong>ráveis<br />
<strong>de</strong> pop1J.lação. Por outro lado é evi<strong>de</strong>nte que antes do século XI,<br />
mesmo nas fases mais agudas <strong>de</strong> invasão, subsistiam comerciantes,<br />
(3). - A síntese mais recente sôbre a vida agrária medieval é d? G. Duby,<br />
L' Économie Rurale et la Vie <strong>de</strong>s Campagnes dans l'Occi<strong>de</strong>nt M édiéval,<br />
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artezãos e conglomerados urbanos, porém numa escala muito mais<br />
reduzida (4).<br />
Igualmente com intensida<strong>de</strong> menor verificavam-se, no período<br />
anterior ao século XI, outras formas <strong>de</strong> <strong>de</strong>slocamento <strong>de</strong> indivíduos<br />
ou grupos e que ganharam a partir <strong>de</strong> então nôvo impulso. Por<br />
ex<strong>em</strong>plo, os monges giróvagos que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os inícios do monaquismo<br />
no Oci<strong>de</strong>nte, mereceram restrições da regra e autorida<strong>de</strong>s beneditinas<br />
e que, conhecidos como "vagantes", "goliardos" e outras <strong>de</strong>nominações,<br />
constituiram-se num setor característico do clero regular no<br />
período iniciado no século XI (5). As peregrinações nos fornec<strong>em</strong><br />
outro ex<strong>em</strong>plo <strong>de</strong> <strong>de</strong>slocações <strong>de</strong> indivíduos ou grupos cujo incr<strong>em</strong>ento<br />
então se verificou e cujas características <strong>de</strong> que se revestiam transformaram-se<br />
progressivamente, com as motivações religiosas encontrando<br />
rívais, freqüent<strong>em</strong>ente dominantes, no <strong>de</strong>sêjo <strong>de</strong> aventuras ou<br />
num verda<strong>de</strong>iro impulso turístico "avant la lettre". Em princípio, é<br />
b<strong>em</strong> verda<strong>de</strong>, as peregrinações não <strong>de</strong>veriam ser associadas às migrações<br />
ou_ colonizações, visto que, normalmente, o peregrino objetivava<br />
retornar aos seus, o que não acontecia com estas. Na verda<strong>de</strong><br />
n<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre êsse retôrno se verificava e também n<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre a morte<br />
era responsável por tal fato (6). Ainda mais se justifica tal associação<br />
se consi<strong>de</strong>rarmos que as Cruzadas pod<strong>em</strong> ser classificadas<br />
como <strong>de</strong>rivação das peregrinações e que as mesmas foram recent<strong>em</strong>ente<br />
classificadas como "le pr<strong>em</strong>ier ex<strong>em</strong>ple <strong>de</strong> colonialisme européen"<br />
(7). O impulso expansivo que configura a maior parte das<br />
modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>de</strong>slocações <strong>de</strong> populações que acabamos <strong>de</strong> examinar<br />
indica claramente uma conjuntura amplamente favorável: incr<strong>em</strong>ento<br />
d<strong>em</strong>ográfico, aumento da produção agrícola, progressos na<br />
circulação comercial, <strong>de</strong>senvolvimento artesanal e expansão urbana.<br />
Se aduzirmos a êsse quadro a generalização <strong>de</strong> melhorias técnicas<br />
consi<strong>de</strong>ráveis e uma notável renovação no campo cultural, ficará<br />
(4). - Da vasta bibliografia existente reter<strong>em</strong>os somente o tomo II da The<br />
Cambridge Economic History of Europe, Cambridge, 1952, b<strong>em</strong> como<br />
o tomo II da Histoire Générale du Travaü, "L'age <strong>de</strong> l'artisanat", <strong>de</strong><br />
F. Lot e F. Mauro, Paris, 1960.<br />
(5). - Entre as obras mais recentes registre-se o tomo XII (la. e 2a. parte) da<br />
Histoire <strong>de</strong> l'Église, dir. por A. Fliche e V. Martin, lnstitutions ecclésiastiques<br />
<strong>de</strong> la chrétienté médiévale por G. Le Bras, Paris, 1964.<br />
(6). - Ao lado da conhecida obra <strong>de</strong> Romain Rousel, Les Pelerinages a travers<br />
les Siecles, Paris, 1954, sobretudo 32 sqq, muito geral, anote-se o artigo<br />
<strong>de</strong> E.-R. nos Cahiers <strong>de</strong> Civüisation Médiévale, Poitiers, Tomo l, n. Q 2,<br />
abr.-jun. 1958, pp. 159-169, cuja continuação se encontra no n Q 3 do<br />
mesmo tomo, jul. -set. 1958, pp. 339-347, Recherches sur les pelerins<br />
dans l'Europe <strong>de</strong>s X/e. et XIle. siecles.<br />
(7). - Le Goff, op. cit., p. 98. Citar<strong>em</strong>os ainda o recente trabalho <strong>de</strong> Aziz<br />
Atiya, Crusa<strong>de</strong>, Commerce 6- Culture, N. York,<br />
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numa escala muito limitada, fato que, aliás, contribuiu po<strong>de</strong>rosamente<br />
para que a crise agrícola atingisse proporções catastróficas, era<br />
ela muito mais freqüente nos centros urbanos (sobretudo por comerciantes,<br />
que aproveitavam tais crises para proce<strong>de</strong>r a especulações<br />
altamente lucrativas) do que no campo (sobretudo entre as<br />
classes mais baixas, visto que pagas as contribuições <strong>de</strong>vidas aos senhores<br />
e comprados os bens <strong>de</strong> consumo indispensáveis somente restava<br />
ao camponês o estritamente necessário para esperar a colheita<br />
seguinte, e se esta falhava, a situação do mesmo tomava-se crítica) .<br />
Por outro lado, podiam as cida<strong>de</strong>s, por iniciativa <strong>de</strong> seus corpos diretivos.<br />
proce<strong>de</strong>r à importação <strong>de</strong> alimentos, o que representava uma<br />
perspectiva não <strong>de</strong>sprezível <strong>de</strong> abastecimento. Todos êsse fatos faziam<br />
com que os camponeses <strong>de</strong>sesperados e famintos, freqüent<strong>em</strong>ente<br />
reduzidos à indigência, viss<strong>em</strong> na cida<strong>de</strong> uma esperança <strong>de</strong> sobrevivência,<br />
contando com a assistência das entida<strong>de</strong>s caritativas lá<br />
existentes. O fato <strong>de</strong> tais esperanças ser<strong>em</strong> freqüent<strong>em</strong>ente frustadas<br />
não impedia a repetição do fenômeno a cada epid<strong>em</strong>ia <strong>de</strong> fome (17) .<br />
Igualmente consi<strong>de</strong>ráveis eram as repercussões negativas das<br />
guerras. Todavia, <strong>de</strong>ve-se frisar que estas, no conjunto, somente assumiam<br />
proporções realmente pon<strong>de</strong>ráveis <strong>em</strong> algumas regiões da<br />
Europa. Embora por tôda a parte a guerra constituisse um fato corriqueiro,<br />
seus efeitos se manifestaram <strong>em</strong> tôda a sua plenitu<strong>de</strong> no<br />
complexo franco-flamengo, palco da Guerra dos C<strong>em</strong> Anos, e na<br />
Itália, fragmentada numa multidão <strong>de</strong> repúblicas municipais rivais e<br />
cujos <strong>de</strong>sentendimentos se superpunham às rivalida<strong>de</strong>s entre partidários<br />
do Papado<br />
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uma forma <strong>de</strong> migração. De fato, tratava-se sobretudo <strong>de</strong> estrangeiros,<br />
al<strong>em</strong>ães, suiços, inglêses, catalães, etc., originários das mais diversas<br />
camadas sociais (bastardos ou filhos menores, portanto s<strong>em</strong><br />
herança, <strong>de</strong> nobres, foragidos da justiça, camponeses com obrigações<br />
para com seus senhores, etc.). Sobretudo na Itália, as perspectivas<br />
<strong>de</strong> sucesso provocou a multiplicação dos "condottieri" que, efetivamente,<br />
conseguiam por vêzes chegar a situações invejáveis, como o<br />
inglês John Hawkwood que, como prêmio aos serviços prestados a<br />
Bernabo Visconti, ao casar-se com uma filha bastarda dêste aparentou-se<br />
a ilustres famílias reinantes da Europa (21). Tais sucessos<br />
somente podiam estimular os el<strong>em</strong>entos <strong>de</strong>sejosos aventuras.<br />
Ainda no que concerne à guerra, como já ocorrera com as acima<br />
mencionadas crises alimentares, as migrações por ela provocadas obe<strong>de</strong>ciam<br />
o sentido campo-cida<strong>de</strong>, visto que as perspectivas <strong>de</strong> proteção<br />
oferecidas pelas muralhas <strong>de</strong>stas eram evi<strong>de</strong>ntes. Por outro lado,<br />
mais talvez do que as outras modalida<strong>de</strong>s agudas <strong>de</strong> crise, contribuiu<br />
a guerra para a dissolução dos vínculos senhor-<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, visto figurar<br />
como <strong>de</strong>ver número um do primeiro a proteção dêste (22) .<br />
Porém, <strong>de</strong> todos os componentes da grave crise dos séculos XIV<br />
e XV, aquêle que mais consi<strong>de</strong>ráveis repercussões econômicas e sociais<br />
apresentou, parece ter sido a Peste Negra <strong>de</strong> 1348-1349 que,<br />
aliás, conheceu reincidências menos mortíferas nas décadas seguintes.<br />
Tal se <strong>de</strong>veu não somente à sua violência mas, sobretudo, à sua universalida<strong>de</strong><br />
(<strong>em</strong> têrmos <strong>de</strong> Velho Mundo. é evi<strong>de</strong>nte), visto que a<br />
Eurásia e norte da África foram atingidos <strong>de</strong> forma generalizada<br />
(23). A íntensa e súbita onda <strong>de</strong> mortes trouxe perturbações muitas<br />
sérias <strong>em</strong> tôdas as ativida<strong>de</strong>s, provocando uma gran<strong>de</strong> efervescência<br />
social. E com ela uma vaga <strong>de</strong> migrações bastante intensa, ainda<br />
uma vez obe<strong>de</strong>cendo predominant<strong>em</strong>ente o sentido campo-cida<strong>de</strong><br />
(24). O mecanismo <strong>de</strong> tais migrações não é difícil <strong>de</strong> ser caracterizado.<br />
A súbita mortalida<strong>de</strong> (que, aliás, parece ter sido mais intensa<br />
nas cida<strong>de</strong>s, on<strong>de</strong> tanto a promiscuida<strong>de</strong> quanto às más condições<br />
<strong>de</strong> higiene eram maiores) provocou uma repentina redução nos mercados<br />
consumidores dos produtos agrícolas da qual resultou uma momentânea<br />
baixa nos gêneros alimentícios, trazendo aos agricultores<br />
gran<strong>de</strong>s dificulda<strong>de</strong>s financeiras. Tendo se verificado concomitant<strong>em</strong>ente<br />
uma notória carência <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra, os salários conheceram<br />
(21). - Laban<strong>de</strong>, L'Italie ... , p. 192.<br />
(22). - Robert Boutruche, La crise d'une Société. Seigneurs et Paysans du<br />
Bor<strong>de</strong>lais pendant la Guerre <strong>de</strong> Cent Ans. Paris, 1947. V. sobretudo<br />
pp. 295 sqq. e 429-432.; Herrs. op. cit., p. 108.<br />
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dos ex<strong>em</strong>plos característicos é a passag<strong>em</strong> <strong>de</strong>dicada ao probl<strong>em</strong>a na<br />
Or<strong>de</strong>nação portuguêsa, que reproduzimos <strong>em</strong> seguida:<br />
"E sse achar<strong>de</strong>s que alguuns homens e molheres sson taaes que<br />
possam servir <strong>em</strong> algumas das cousas sobre ditas, quI:. andam pedindo<br />
pelas portas e non quer<strong>em</strong> servir e Ihis dam as esmollas que<br />
<strong>de</strong>vyam a seer para os velhos e mancos e cegos e doentes e outros<br />
que nom pod<strong>em</strong> guaanhar, por que vyvam que razom e daguysado<br />
as <strong>de</strong>vyam d'aver poys nom an corpos para fazer n<strong>em</strong> huum<br />
servyço, constrengendoos que sirvham <strong>em</strong> aquelo que vyr<strong>de</strong>s que<br />
compre. Esse nom quyser<strong>em</strong> fazer açouta<strong>de</strong>-os e <strong>de</strong>ita<strong>de</strong>-os fora da<br />
vila. E nom conssenta<strong>de</strong>s que os colham nas albergarias e espitaaes.<br />
E da<strong>de</strong> pena qual vyr<strong>de</strong>s que he aguisada aos albergueyros e a<br />
outros quaesquer que os en essas casas colher<strong>em</strong>" (27).<br />
Essa permanente preocupação com a mendicância teria, uma<br />
primeira explicação no fato <strong>de</strong> parte da população ter-se realmente<br />
arruinado com as perturbações ocasionadas pela peste. Assim, D.<br />
Pedro IV <strong>de</strong> Aragão, por ato <strong>de</strong> 22 <strong>de</strong> nov<strong>em</strong>bro <strong>de</strong> 1348, conce<strong>de</strong>u<br />
aos habitantes da al<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> San Miguel <strong>de</strong> Adamuz, que arruinados<br />
pela peste e crivados <strong>de</strong> dívidas pensavam <strong>em</strong> <strong>em</strong>igrar e mendigar,<br />
para tentar pagá-las, uma moratória <strong>de</strong> dois anos (28). Se pensarmos<br />
que n<strong>em</strong> todos os soberanos agiam com a mesma generosida<strong>de</strong> e presteza,<br />
po<strong>de</strong>-se fàcilmente admitir que muitos camponeses <strong>em</strong> condições<br />
similares saíss<strong>em</strong> a apelar para a carida<strong>de</strong> pública. Uma outra<br />
explicação residiria num possível aumento do espírito caritativo, que<br />
funcionaria como estimulante à mendicância e vagabundag<strong>em</strong>. E' hipótese<br />
que mereceria ser verificada, tanto mais que não são abundantes<br />
os trabalhos sôbre a assistência social no período consi<strong>de</strong>rado.<br />
Em todo o caso, um estudo recente sôbre as dotações testamentárias<br />
(29) revela uma clara tendência contrária, mas esta é apenas uma<br />
das modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> carida<strong>de</strong>, com a agravante <strong>de</strong> restringir-se o estudo<br />
<strong>em</strong> foco à sua incidência a um único grupo social, no caso a burguesia.<br />
Uma explicação mais simples e convincente ou, ao menos,<br />
aplicável talvez à maioria dos casos, seria talvez a do insucesso daqueles<br />
que se <strong>de</strong>slocavam à procura <strong>de</strong> uma ocupação r<strong>em</strong>unerativa.<br />
Na verda<strong>de</strong> é necessário não esquecer que na sua maioria êsses <strong>em</strong>igrantes<br />
não dispunham <strong>de</strong> qualificaçâo profissional que facilitasse sua<br />
(27). - Arquivo <strong>Nacional</strong> da Tôrre do Tombo, Livro <strong>de</strong> leis e posturas antigas,<br />
foI. 159, v Q , la. col. (126 yQ).<br />
(28). - Publ. por Amada Lopez <strong>de</strong> Menezes in Documentos acerca <strong>de</strong> la Peste<br />
Negra en los Domínios <strong>de</strong> la Corona <strong>de</strong> Aragon. Saragogoça, 1956, p. 40.<br />
(29). - F. Leclere, Recherches sur la charité <strong>de</strong>s bourgeiois envers les pauvres au<br />
XIVe. siecle à Douai, in Revue du<br />
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<strong>de</strong> lauoyra ou d'outro mester ou servyc;o mais honrrado que o que<br />
antes avya ... " (32).<br />
Todos êsses fatos atestam eloqüent<strong>em</strong>ente a mobilida<strong>de</strong> das populações<br />
medievais durante as epid<strong>em</strong>ias. Um estudo relativo à cida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> Albi, no sul da França, permite avaliar a renovação das populações<br />
urbanas durante a Peste Negra. Da comparação <strong>de</strong> dois<br />
"compoix" (espécie <strong>de</strong> cadastro municipal, <strong>em</strong> que erám registrados,<br />
para efeitos fiscais, os bens dos habitantes possuidores <strong>de</strong> patrimônio),<br />
um anterior (1343) e outro posterior (1357) obtêm-se os dados<br />
seguintes: <strong>em</strong> um dos bairros da cida<strong>de</strong>, sôbre 638 nomes recenseados<br />
<strong>em</strong> 1343, 74 ocupavam o mesmo bairro <strong>em</strong> 1357, enquanto<br />
68 tinham se transferidos para outros bairros e 496 (78%) <strong>de</strong>sapareciam<br />
totalmente; <strong>em</strong> outro bairro <strong>de</strong> 242 nomes recenseados <strong>em</strong><br />
1343, 118 eram novos na cida<strong>de</strong> (47,5 % ). Tais porcentagens permitiram<br />
avaliar <strong>em</strong> mais <strong>de</strong> 50% a população urbana <strong>de</strong>saparecida<br />
pela doença ou pela fuga (33). Tais números são suficient<strong>em</strong>ente<br />
expressivos e é pena que a rarida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>documento</strong>s dêsse gênero não<br />
permita a multiplicação <strong>de</strong> tais estudos.<br />
Em vista do expôsto acreditamos ter ficado salientados a extensão<br />
e a natureza das migrações verificadas no fim da Ida<strong>de</strong> Média.<br />
Para elas contribuiu a reduzidí$sima difusão do sist<strong>em</strong>a <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong>,<br />
sobretudo na zona rural, que fazia com que os camponeses se<br />
sentiss<strong>em</strong> menos ligados à terra e moralmente autorizados a partir <strong>em</strong><br />
busca <strong>de</strong> maior segurança, no momento <strong>em</strong> que o senhor não podia<br />
oferecer a proteção <strong>de</strong>vida aos seus <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes, <strong>em</strong> troca dos serviços<br />
prestados por êstes. Assim, uma crise da amplitu<strong>de</strong> daquela<br />
verificada no período que nos ocupa somente po<strong>de</strong>ria contribuir para<br />
enfraquecer os laços <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência.<br />
Todavia, tal crise apresentou outras conseqüências importantes.<br />
O abandôno do campo, como o <strong>de</strong>saparecimento t<strong>em</strong>porário ou <strong>de</strong>finitivo<br />
das al<strong>de</strong>ias permitiu que a floresta recuperasse parte do terreno<br />
perdido. A gran<strong>de</strong> mortalida<strong>de</strong> favoreceu renovação pon<strong>de</strong>rável<br />
nos vários setores da socieda<strong>de</strong>. Ainda que prolongadas, as provações<br />
da Europa <strong>de</strong>veriam conhecer seu fim na segunda meta<strong>de</strong> do século<br />
XV, quando se verificou o início <strong>de</strong> nova fase <strong>de</strong> expansão, <strong>em</strong> têrmos<br />
novos, com o capitalismo parcialmente liberado <strong>de</strong> muitas das<br />
ca<strong>de</strong>ias feudais. O quanto possam ter sido intensas as movimentações<br />
<strong>de</strong> populações durante a crise, viriam elas a ter suas proporções consi<strong>de</strong>ràvelmente<br />
reduzidas <strong>em</strong> comparação com as que se iniciavam, que<br />
abririam à Europa as portas dos outros continentes.<br />
(32). - Id<strong>em</strong>, foI. 159, r Q , la. col. (126 rI».<br />
(33). - Genevieve Prat, Albi et la Peste<br />
Anais do IV Simpósio <strong>Nacional</strong> dos Professores Universitários <strong>de</strong> História – ANPUH • Porto Alegre, set<strong>em</strong>bro 1967
173<br />
•<br />
• •<br />
INTERVENÇÕES.<br />
Do Prof. Eurípe<strong>de</strong>s Simões <strong>de</strong> Paula (FFCL. da USP. ) .<br />
Pergunta se os arquivos paroquiais pod<strong>em</strong> fornecer dados sôbre<br />
a diminuição <strong>de</strong> populações, não só <strong>de</strong>vido ao êxodo rural, como<br />
também à Peste Negra?<br />
Pergunta também se o Autor t<strong>em</strong> conhecimento do livro <strong>de</strong> Elisabeth<br />
Carpentier sôbre Orvieto, on<strong>de</strong> ela trata dos efeitos da Peste<br />
Negra nessa cida<strong>de</strong>?<br />
•<br />
Do Prof. Luís César Bittencourt (Faculda<strong>de</strong> Fluminense <strong>de</strong> Filosofia.<br />
RI.) .<br />
Indaga se as Cruzadas seriam apenas, como afirma o Autor, a<br />
continuação das peregrinações, ou teria um caráter <strong>em</strong>inent<strong>em</strong>ente migratório,<br />
com ocupação <strong>de</strong> terras no Oriente?<br />
Pergunta se a expansão aragonesa, com a implantação da Atica<br />
catalã não mostra um aspecto dos mais importantes da colonização<br />
no Oriente por oci<strong>de</strong>ntais?<br />
•<br />
Da Profa. Emília Thereza Alvares Ribeiro (Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Filosofia <strong>de</strong><br />
Campo Gran<strong>de</strong>. GB.).<br />
Inicialmente cumprimenta o Autor pelo fato do mesmo "sentir"<br />
a Ida<strong>de</strong> Média, não como um período <strong>de</strong> trevas e, por isso, dar-lhe<br />
atenção. Pergunta se atrás das migrações não se po<strong>de</strong> entrever muitos<br />
fatôres positivos para o <strong>de</strong>senvolvimento medieval?<br />
Continuando, diz que a reforma <strong>de</strong> Cluny, já que o Autor inicia<br />
seu trabalho citando o século V e a reforma é do século X, indaga se<br />
êsses monges viajantes não levavam consigo el<strong>em</strong>entos culturais <strong>de</strong><br />
uma região para outra? Além dêsses, os cistercienses, os franciscanos,<br />
os dominicanos, etc., que pela filiação dos mosteiros transferiam-se<br />
<strong>de</strong> uma região da Europa para outra, sendo os dois últimos grupos <strong>de</strong><br />
gran<strong>de</strong> importância para o fim da Ida<strong>de</strong> Média. Indaga também se<br />
êsses movimentos tiveram importância na migração cultural?<br />
Pergunta ainda, no caso das migrações dos senhores feudais,<br />
Anais do IV Simpósio <strong>Nacional</strong> dos Professores Universitários <strong>de</strong> História – ANPUH • Porto Alegre, set<strong>em</strong>bro 1967
- 174-<br />
a administração e até para a alimentação, quando eram fracas a produção<br />
local). Não teriam também importância cultural?<br />
Indaga o papel dos jograis itinerantes (transmissores da geste n03<br />
primeiros t<strong>em</strong>pos e <strong>de</strong>pois da literatura trovadoresca), pois acredita<br />
que êles têm gran<strong>de</strong> importância, inclusive para os dados históricos<br />
(como os mosteiros também o tiveram)?<br />
A criação <strong>de</strong> escolas especializadas <strong>em</strong> diversos assuntos e Universida<strong>de</strong>s,<br />
fazendo com que as pessoas cultas viajass<strong>em</strong> e trocass<strong>em</strong><br />
dados culturais (inclusive com o aparecimento <strong>de</strong> bôlsas <strong>de</strong> estudos)<br />
Os comerciantes, também levavam essas influências <strong>em</strong> suas viagens<br />
chegando a ser criados os tribunais dos piepow<strong>de</strong>rs?<br />
Também não teriam influência nas migrações a divisa cristã "crescei<br />
e multiplicai-vos", criando probl<strong>em</strong>as <strong>de</strong> excesso <strong>de</strong> população e<br />
<strong>de</strong> herança?<br />
Diz querer l<strong>em</strong>brar as perseguições políticas na Itália e os exílios,<br />
como o <strong>de</strong> Dante (causa comum) levando indiretamente a gran<strong>de</strong>s<br />
trocas culturais.<br />
Finalmente, l<strong>em</strong>brando que o Autor citou, e muito b<strong>em</strong>, Marc<br />
Bloch, pergunta se a sua conclusão <strong>de</strong> que a socieda<strong>de</strong> medieval,<br />
excessivamente particularistas e maravilhosamente universalistas (consilerando<br />
no primeiro aspecto os traços particulares e no segundo os<br />
gerais) não é um reflexo <strong>de</strong>ssas migrações?<br />
*<br />
Do Prof. Ricardo Mário Gonçalves (FFCL. da USP.) .<br />
Pergunta se a expedição mongol <strong>de</strong> Batu, neto <strong>de</strong> Gengis Khan<br />
à Europa Oriental provocou algum movimento migratório das populações<br />
<strong>de</strong>ssa área?<br />
*<br />
Da Profa. Helga Picolo (FFCL. da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Rio<br />
Gran<strong>de</strong> do Sul. RS.).<br />
Diz que o Autor na página 170<br />
Anais do IV Simpósio <strong>Nacional</strong> dos Professores Universitários <strong>de</strong> História – ANPUH • Porto Alegre, set<strong>em</strong>bro 1967
- 175-<br />
Do Prof. laime Pinsky (FFCL. <strong>de</strong> Assis. SP.).<br />
Afirma que o Autor após citar (pág. 164) o entesouramento<br />
excessivo como importante fator <strong>de</strong> <strong>de</strong>pressão, diz que "provàvelmente<br />
mais graves ainda seriam o imobilismo tecnológico ... " <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong><br />
" ... certo tipo <strong>de</strong> entesouramento excessivo e improdutivo ... (pág.<br />
165).<br />
Pergunta se não parece ao Autor que voltamos ao primeiro fator<br />
(entesouramento excessivo) não sendo como b<strong>em</strong> coloca o seu<br />
trabalho, o imobilismo tecnolÓgico conseqüência ou <strong>de</strong>sdobramento<br />
do mesmo?<br />
*<br />
Da Profa. Maria Yedda Leite Linhares (FFCL. da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral<br />
do Rio <strong>de</strong> Janeiro. GB.).<br />
A propósito da importância social dos movimentos <strong>de</strong> população<br />
na parte final da Ida<strong>de</strong> Média, diz que <strong>em</strong> primeiro lugar é necessário<br />
notar que a legislação mencionada pelo Autor representa uma medida<br />
dos consumidores, bàsicamente el<strong>em</strong>entos das classes dominantes,<br />
contra a fuga, o encarecimento e as reivindicações (inclusive revoltas<br />
na Inglaterra, jaqueries, etc.) dos "camponeses" (<strong>em</strong> sentido geral);<br />
<strong>em</strong> segundo lugar a migração para os centros urbanos é o resultado<br />
do <strong>de</strong>smantelamento do sist<strong>em</strong>a agrário dominante, agravado, certamente,<br />
pela Peste Negra; finalmente, convêm ressaltar a utilização do<br />
po<strong>de</strong>r político <strong>em</strong> mãos das classes dominantes para tentar fixar o<br />
hom<strong>em</strong> à terra e obter ao mesmo t<strong>em</strong>po mão-<strong>de</strong>-obra a preços satisfatórios.<br />
Diz ainda que é evi<strong>de</strong>nte que o t<strong>em</strong>a é inexgotável, po<strong>de</strong>ndo ser<br />
abordado <strong>de</strong> vários ângulos, como por ex<strong>em</strong>plo, o impacto da Peste<br />
Negra sôbre a cultura característica das classes eruditas na Inglaterra<br />
medieval, verificando-se que a obra <strong>de</strong> Chaucer reflete a popularização<br />
da língua inglêsa.<br />
*<br />
Do Prof. Eddy Stols (FFCL. <strong>de</strong> Marília. SP.).<br />
Declara que não se <strong>de</strong>veria, para melhor compreensão do t<strong>em</strong>a,<br />
levar <strong>em</strong> I.!onta a estrutura mental e psicológica do hom<strong>em</strong> medieval<br />
que ten<strong>de</strong> a resolver seus probl<strong>em</strong>as pelas migrações. Um filósofo<br />
francês, Michel Foucault, no seu livro Histoire <strong>de</strong> la folie à l'époque<br />
classique,<br />
Anais do IV Simpósio <strong>Nacional</strong> dos Professores Universitários <strong>de</strong> História – ANPUH • Porto Alegre, set<strong>em</strong>bro 1967
- 177-<br />
Média. No que tange ao período que é objeto <strong>de</strong> seu trabalho,<br />
essa importância já estava bastante atenuada, com o<br />
<strong>de</strong>senvolvimento do ensino universitário. Ad<strong>em</strong>ais as suas<br />
preocupações se dirigiam antes a outras formas <strong>de</strong> migrações.<br />
2Q). - Não acredita que as <strong>de</strong>slocações dos senhores feudais <strong>de</strong><br />
um domínio para outro, por vêzes bastantes distancildQs,<br />
po<strong>de</strong>riam ser caracterizados como migrações. Constitu<strong>em</strong>,<br />
s<strong>em</strong> dúvida, um ex<strong>em</strong>plo <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong> da socieda<strong>de</strong> medieval,<br />
mas tratar-se-ia antes <strong>de</strong> um caso <strong>de</strong> transumância.<br />
3Q) • Diz que observação do mesmo gênero da anterior po<strong>de</strong>ria<br />
ser feita quanto aos jograis.<br />
4Q). - Afirma também que a fixação do estudante <strong>em</strong> terra estrangeira<br />
não constituia a regra.<br />
5Q). - Sôbre os comerciantes julga ter feito alusões diretas no texto<br />
da comunicação.<br />
6Q) • Diz que se a "multiplicação" era acelerada, a mortalida<strong>de</strong><br />
era também elevada e o objetivo do seu trabalho foi mostrar<br />
que não só o incr<strong>em</strong>ento d<strong>em</strong>ográfico é suscetível <strong>de</strong><br />
provocar migrações, o mesmo ocorre por ocasião das perdas<br />
catastróficas <strong>de</strong> população.<br />
7Q). - O enquadramento dos exílios, assaz esporádicos, como forma<br />
<strong>de</strong> migração e (ou) colonização po<strong>de</strong>ria fazer com que<br />
essas palavras passas<strong>em</strong> a ter um sep.tido<br />
Anais do IV Simpósio <strong>Nacional</strong> dos Professores Universitários <strong>de</strong> História – ANPUH • Porto Alegre, set<strong>em</strong>bro 1967
À Profa. Helga Pico lo .<br />
- 178-<br />
Afirma que tal t<strong>em</strong>ática (a das crises dos séculos XIV e XV)<br />
tendo passado a ser abordada somente após a 11 Guerra Mundial,<br />
a bibliografia <strong>em</strong> geral é escassa, <strong>em</strong> boa parte citada no correr do<br />
trabalho. Relativamente a Portugal tal carência é particularmente<br />
acentuada. A exigüida<strong>de</strong> do t<strong>em</strong>po que lhe fôra concedido somente<br />
lhe permitiria dar mais pormenores <strong>em</strong> diálogo direto, fora do quadro<br />
das sessões do Simpósio e <strong>de</strong>clara estar a disposição da sua interlocutora<br />
.<br />
Ao Prof. Jaime Pinsky.<br />
*<br />
Diz que <strong>em</strong> seu espírito faz uma distinção clara entre a crise<br />
monetária enquanto gerada pelo caráter <strong>de</strong>ficitário das relações comerciais<br />
com o Oriente e a insuficiência do meio circulante enquanto<br />
originada por <strong>de</strong>ficiências <strong>de</strong> mecanismos financeiros a<strong>de</strong>qüados<br />
e pela falta <strong>de</strong> mentalida<strong>de</strong> investidora das classes mais altas. Preten<strong>de</strong><br />
rever a redação da comunicação para sanar qualquer ambigüida<strong>de</strong>.<br />
*<br />
Anais do IV Simpósio <strong>Nacional</strong> dos Professores Universitários <strong>de</strong> História – ANPUH • Porto Alegre, set<strong>em</strong>bro 1967
- 179-<br />
vez agravada por <strong>de</strong>ficiências alimentares suscetíveis <strong>de</strong> perturbar o<br />
equilíbrio <strong>em</strong>ocional dos indivíduos <strong>de</strong> então (vi<strong>de</strong> Lucien Febvre,<br />
Le Probl<strong>em</strong>e <strong>de</strong> l'Incroyance au XVle siecle - La Religion <strong>de</strong> Rabetais).<br />
Seria<br />
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