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Tocqueville e Beaumont - sobre o sistema penitenciário nos

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Disso resulta que em geral a opinião se mostra pouco favorável ao que é<br />

protegido pelo zelo religioso; e, por outro lado, os membros do clero demonstram pouca<br />

simpatia por tudo o que se apresenta sob os auspícios do favor popular.<br />

Na América, ao contrário, o Estado e a religião foram sempre perfeitamente<br />

separados um do outro, e lá se vêem as paixões políticas se levantarem contra o<br />

governo, sem jamais se dirigir contra o culto. Eis porque a religião está nesse país<br />

sempre fora de debate, e é isso que explica a ausência de toda hostilidade entre o povo e<br />

os ministros de todas as seitas.<br />

Devemos acrescentar nesse ponto uma última observação: <strong>nos</strong> Estados Unidos,<br />

se a ajuda dos homens dedicados ao culto faltasse, a reforma das prisões não<br />

encontraria, por esse motivo, privada do socorro da influência religiosa.<br />

Com efeito, a sociedade dos Estados Unidos é ela mesma eminentemente<br />

religiosa, e esse fato tem ainda uma grande influência na direção dos estabelecimentos<br />

<strong>penitenciário</strong>s. Um número grande de homens caridosos consagram uma parte de sua<br />

existência à reforma moral dos crimi<strong>nos</strong>os, mesmo não engajados em nenhum<br />

ministério religioso. Como as crenças estão vivamente enraizadas <strong>nos</strong> costumes, até o<br />

último dos empregados da prisão tem princípios de religião. Por essa razão, ele não<br />

profere jamais uma palavra que não esteja em harmonia com os sermões do capelão. O<br />

detento <strong>nos</strong> Estados Unidos respira, portanto, na penitenciária, uma atmosfera religiosa<br />

que lhe chega de todas as partes, e ele é mais acessível a essa influência porque sua<br />

educação primeira o dispôs a ela, e porque ele sempre viveu em uma sociedade onde é<br />

professado um grande respeito pela religião.<br />

Em geral, os condenados, na França, não têm disposições tão favoráveis, e fora<br />

da prisão o ardor do zelo religioso é encontrado apenas <strong>nos</strong> ministros de culto.<br />

Se são retirados da prisão, a influência da religião desaparecerá: restará a<br />

filantropia para reformar os crimi<strong>nos</strong>os. Não se pode contestar que haja, em <strong>nos</strong>so país,<br />

homens generosos que, dotados de uma sensibilidade profunda, se preocupam em<br />

aliviar todas misérias e tratar de todas a feridas da humanidade; até o presente sua<br />

atenção, ocupada com a sorte material dos prisioneiros, negligenciou um interesse mais<br />

precioso, a reforma moral destes; concebe-se, no entanto, muito bem que, nesse terreno,<br />

sua benfeitoria logo vingará, e alguns sucessos nascerão sem dúvida de seus esforços.<br />

Mas esses homens sinceramente filantropos são raros: na maioria das vezes a filantropia<br />

é, em <strong>nos</strong>so país, apenas uma coisa imagi<strong>nos</strong>a. Lê-se a vida de Howard, cujas virtudes<br />

filantrópicas são admiradas, e pensa-se que é bonito amar como ele a humanidade; mas<br />

essa paixão, que nasce na cabeça, não chega ao coração, e muitas vezes ela vai se<br />

apagar em um artigo de jornal.<br />

Há, portanto, em <strong>nos</strong>sos costumes, e no estado atual dos espíritos na França,<br />

obstáculos morais contra os quais o <strong>sistema</strong> <strong>penitenciário</strong> teria de lutar se fosse<br />

estabelecido tal como existe <strong>nos</strong> Estados Unidos. Os obstáculos que assinalamos<br />

poderão sem dúvida deixar de existir. Uma hostilidade durável da opinião pública<br />

contra a religião e seus ministros não é uma coisa natural, e ignoramos até que ponto<br />

uma sociedade pode se conduzir muito tempo sem o socorro das crenças religiosas. Mas<br />

aqui não devemos ir além do presente; e entre os obstáculos atualmente existentes que<br />

prejudicariam o <strong>sistema</strong> <strong>penitenciário</strong> na França, o que viemos de assinalar e sem<br />

dúvida um dos mais graves.<br />

Nossa legislação também apresenta obstáculos.<br />

O primeiro resulta da natureza mesma de algumas leis penais.<br />

No tempo em que a marca estava escrita em <strong>nos</strong>so código, o <strong>sistema</strong><br />

<strong>penitenciário</strong> não poderia ter sido estabelecido de uma maneira uniforme; pois seria<br />

contraditório buscar a reforma moral dos crimi<strong>nos</strong>os estigmatizados por uma infâmia<br />

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