Tocqueville e Beaumont - sobre o sistema penitenciário nos
Tocqueville e Beaumont - sobre o sistema penitenciário nos
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Quando, portanto, se quer apreciar o mérito de uma prisão e do <strong>sistema</strong><br />
<strong>penitenciário</strong> nela em vigor, é preciso observar, não a moralidade da sociedade em<br />
geral, mas somente a dos indivíduos que, depois de terem sido encarcerados nessa<br />
prisão, voltaram para a sociedade: se eles não cometem nenhum novo delito, pode-se<br />
acreditar que a influência do encarceramento <strong>sobre</strong> eles foi salutar; se eles se tornam<br />
reincidentes, fica provado que a prisão não lhes tornou melhores.<br />
Se é verdade que o maior ou menor número de reincidências é a prova do vício ou<br />
da eficácia de uma prisão, é preciso acrescentar que é impossível obter nesse ponto uma<br />
constatação perfeitamente exata.<br />
De uma parte, consegue-se com muito esforço a evidência que condenados que<br />
foram libertados tiveram uma conduta honesta, e, de outra parte, nem sempre se<br />
conhecem os novos crimes que eles cometem.<br />
A essas considerações que <strong>nos</strong> pareceram necessárias para colocar a questão em<br />
seus verdadeiros termos, acrescentaremos uma última que <strong>nos</strong> pareceu igualmente<br />
importante não perder de vista, qual seja, para apreciar os efeitos do <strong>sistema</strong><br />
<strong>penitenciário</strong>, não é preciso considerar a época de sua criação, mas o tempo que se<br />
segue a ela. Essa verdade, que parece ocioso enunciar, tem, no entanto, sido esquecida<br />
por escritores de grande mérito; citaremos um exemplo.<br />
Já dissemos que em 1790 um novo <strong>sistema</strong> de encarceramento foi estabelecido na<br />
Filadélfia: como conseqüência, a prisão de Walnut-Street foi organizada a partir de um<br />
plano que reconhecemos como totalmente vicioso: no entanto, devido a uma<br />
circunstância fortuita, ou cuja causa é, pelo me<strong>nos</strong>, desconhecida, o número de crimes<br />
na Pensilvânia durante os a<strong>nos</strong> 1790, 1791, 1792 e 1793, foi muito me<strong>nos</strong> considerável<br />
do que <strong>nos</strong> a<strong>nos</strong> precedentes. O senhor Livingston e o senhor Roberts Vaux, <strong>nos</strong><br />
Estados Unidos, e os senhores duque de La Rochefoucauld-Liancourt e Charles Lucas,<br />
na França, tiraram dessa diminuição dos crimes a prova da eficácia do <strong>sistema</strong> 1 ; mas o<br />
raciocínio deles <strong>nos</strong> parece fundado <strong>sobre</strong> um fato mal apreciado. Para atribuir esse<br />
resultado ao novo regime de prisões, teria sido necessário provar que os indivíduos que<br />
saíram da prisão de Walnut-Street não tinham cometido novos crimes: mas essa prova<br />
não poderia ser obtida. Com efeito, o <strong>sistema</strong> começa em 1790, e é <strong>nos</strong> a<strong>nos</strong> 1791, 1792<br />
e 1793 que se buscam os efeitos, quer dizer, antes que a maior parte dos encarcerados<br />
tenham saído da prisão.<br />
É fácil compreender que o efeito do <strong>sistema</strong> <strong>penitenciário</strong> só pode ser considerado<br />
depois de certo número de a<strong>nos</strong>, e unicamente depois que os condenados, postos em<br />
liberdade com a expiração de suas penas, tiveram tempo de cometer novos crimes ou<br />
dar exemplo de uma vida honesta.<br />
Devemos, por essa razão, negligenciar os resultados obtidos pelas novas<br />
penitenciárias da Filadélfia, de Singsing, de Boston e de Baltimore: recusando os<br />
argumentos que construiríamos a partir dessas diferentes prisões, restringimos<br />
infinitamente o círculo de <strong>nos</strong>sa discussão, mas, por outro lado, temos a vantagem de<br />
dar a <strong>nos</strong>sos raciocínios apenas bases sólidas.<br />
Comparemos, portanto, os efeitos produzidos pelas antigas prisões dos Estados<br />
Unidos com os que resultam do novo <strong>sistema</strong> em vigor nas penitenciárias de Auburn e<br />
de Wethersfield, os únicos que foram estabelecidos faz um tempo suficientemente longo<br />
para que já seja possível julgar sua influência.<br />
1 Ver Edward Livingston, Introductory report to the code of prison discipline explanatory of the<br />
principles on which the code is founded., p. 7; Roberts Vaux, Notices of the original and successive<br />
efforts to improve the discipline of the prison at Philadelphia and to reform the criminal code of<br />
Pennsylvania, p. 53-54; e Charles Lucas, Du système pénitentiaire en Europe et aux Etats-Unis.<br />
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