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Tocqueville e Beaumont - sobre o sistema penitenciário nos

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debates surgiram no Estado de Nova Iorque com respeito a saber se a presença de um<br />

inspetor era necessária para que fosse infligida a um condenado o castigo com chicote:<br />

<strong>nos</strong> termos da lei, essa garantia era indispensável; no entanto, a obrigação para os<br />

inspetores de assistir à inflicção de castigos corporais lhe causava embaraços tão<br />

freqüentes e emoções tão pe<strong>nos</strong>as, que eles pediram urgentemente que fossem<br />

dispensados desse dever, e hoje é dado aos empregados o direito de exercer a disciplina<br />

sem testemunhas oficiais 1 . Nem por isso os inspetores perderam a grande influência que<br />

têm com relação à aplicação dos castigos disciplinares. Singsing é a única prisão onde a<br />

vigilância, com respeito a esse ponto, <strong>nos</strong> pareceu superficial. A administração dessa<br />

vasta penitenciária é tão difícil, que parece não se querer disputar com os guardas a<br />

menor parte de seu poder absoluto.<br />

Não aprofundaremos aqui a questão de saber se a sociedade tem o direito de<br />

punir com castigos corporais o condenado que não se submete nem à obrigação do<br />

trabalho, nem às outras exigências da disciplina penitenciária.<br />

Essas questões teóricas são raramente discutidas em proveito da razão e da<br />

verdade.<br />

Acreditamos que a sociedade tem o direito de fazer tudo o que é necessário para<br />

a sua conservação e para a ordem estabelecida em seu seio: e concebemos muito bem<br />

que crimi<strong>nos</strong>os reunido, tendo todos infringido as leis do país, cujas inclinações são<br />

corrompidas e todos os instintos viciosos, não sejam governados na prisão segundo os<br />

mesmos princípios e pelos mesmos meios que o são os homens livres, cujas inspirações<br />

são honestas e todas as outras ações conformes às leis. Concebemos ainda que o<br />

condenado que não queira fazer nada seja violentamente obrigado a trabalhar, e que se<br />

empreguem rigores para reduzir ao silêncio aquele que não o observa; o direito da<br />

sociedade a esse respeito não <strong>nos</strong> parece duvidoso, a me<strong>nos</strong> que ela não possa, com a<br />

ajuda de meios mais brandos, chegar aos mesmos resultados; mas, para nós, a questão<br />

não está aí.<br />

Até que ponto o uso de castigos corporais pode se conciliar com o objetivo<br />

mesmo do <strong>sistema</strong> <strong>penitenciário</strong>, que é a reforma do culpado? Se essa pena é<br />

ignominiosa, ela não vai diretamente contra a finalidade que se propõe, ou seja, reerguer<br />

a moralidade de um homem caído a seus próprios olhos?<br />

Essa questão <strong>nos</strong> parece a única a ser examinada: mas não pensamos que se deva<br />

resolvê-la de uma maneira absoluta. Parece-<strong>nos</strong> que ela depende muito do sentimento<br />

que, na opinião pública e na dos detentos, se liga aos castigos corporais.<br />

O poder discricionário em virtude do qual o mais inferior dos guardas de Auburn<br />

e o último dos carcereiros de Singsing chicoteiam os detentos é pouco contestado <strong>nos</strong><br />

Estados Unidos.<br />

“O direito dos guardas <strong>sobre</strong> a pessoa dos detentos, diz-se, é o do pai <strong>sobre</strong> seus<br />

filhos, do professor <strong>sobre</strong> seus alu<strong>nos</strong>, do mestre <strong>sobre</strong> seu aprendiz, do capitão do<br />

barco <strong>sobre</strong> os homens de sua tripulação 2 ”<br />

A pena de chicote é aplicada na marinha americana, que não associa a ela<br />

nenhuma idéia de infâmia. Na origem do <strong>sistema</strong> <strong>penitenciário</strong>, ela não tinha sido<br />

admitida como meio de disciplina. Quando foi introduzida nas prisões como algo<br />

subsidiário ao regulamento, algumas vozes se elevaram para combatê-la; mas essa<br />

oposição era antes uma disputa de filosofia que uma repugnância dos costumes 3 .<br />

1 Ver os Relatórios dos inspetores de Auburn, 26 de janeiro de 1825.<br />

2 Relatório do senhor G. Powers, p. 11, 1827.<br />

3 Pensamos aqui que os autores se servem de expressões gerais além da conta. Se fosse verdade que <strong>nos</strong><br />

Estado Unidos não se associasse uma idéia especial de infâmia aos golpes de chicote dados em um<br />

prisioneiro, continuaria sendo sempre certo que a pena de chicote repugna aos sentimentos da maioria.<br />

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