Tocqueville e Beaumont - sobre o sistema penitenciário nos
Tocqueville e Beaumont - sobre o sistema penitenciário nos
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inconvenientes. No entanto, o senhor Elam Lynds parece sempre temer que a presença<br />
tolerada de empresários na prisão conduza cedo ou tarde à ruína completa da disciplina.<br />
Logo veremos, no artigo <strong>sobre</strong> despesas e rendimentos, que o trabalho dos<br />
prisioneiros é em geral muito produtivo. Percorrendo esses diversos estabelecimentos,<br />
fomos impressionados pelo ardor e algumas vezes pelo talento com que os condenados<br />
trabalham; o que torna o zelo deles surpreendente é o fato de agirem sem interesse. Em<br />
<strong>nos</strong>sas prisões, como na maior parte das prisões da Europa, há uma parte dos produtos<br />
dos trabalhos que pertencem aos detentos. Essa porção, que se chama de pecúlio, é mais<br />
ou me<strong>nos</strong> considerável <strong>nos</strong> diversos países: <strong>nos</strong> Estados Unidos, ela é nula. Lá, admitese<br />
o princípio que o crimi<strong>nos</strong>o deve à sociedade todo seu trabalho, para que a indenize<br />
pelas despesas com sua detenção. Assim, durante todo o tempo de suas penas, os<br />
condenados trabalham sem receber nenhum salário, e quando saem da prisão, não lhe<br />
prestam nenhuma conta do que eles fizeram. É-lhes dado algum dinheiro, para que<br />
possam ir ao lugar onde pretendem fixar uma nova residência 1 .<br />
Esse <strong>sistema</strong> <strong>nos</strong> parece ser de uma excessiva severidade. Não discutimos de<br />
forma alguma o direito, que <strong>nos</strong> parece incontestável, da sociedade procurar no trabalho<br />
do detento a indenização que este lhe deve: ignoramos, aliás, até que ponto um pecúlio<br />
considerável é útil ao condenado que, na maior parte das vezes, quando sai da prisão, vê<br />
no dinheiro juntado por ele apenas um meio para satisfazer paixões tanto mais<br />
imperiosas na medida em que foram, por muito tempo, contidas. Mas qual seria o<br />
inconveniente de dar ao zelo do condenado um leve estimulante, à sua atividade uma<br />
fraca recompensa? por que não se lançaria em sua solidão, e no meio de seus<br />
sofrimentos, um interesse de ganho que, por pequeno que fosse, teria para ele um preço<br />
imenso? Aliás, não é necessário que, no dia de sua reintegração na sociedade, ele tenha,<br />
senão somas consideráveis à sua disposição, ao me<strong>nos</strong> algum meio de existência até que<br />
alguém lhe ofereça um emprego 2 ? Por que não adotar o regime da prisão de Baltimore,<br />
onde, reconhecendo-se o princípio das outras penitenciárias dos Estados Unidos, seu<br />
rigor é abrandado? Nessa prisão, cada condenado tem sua tarefa diária fixada: quando<br />
ele a cumpre, ele não pára de trabalhar, mas começa a trabalhar para si mesmo; tudo o<br />
que ele faz depois de sua tarefa cumprida constitui, portanto, seu pecúlio; e como a<br />
restituição é feita somente depois da expiração de sua pena, está-se seguro que o<br />
dinheiro que ele ganhou dessa forma não será de forma alguma prejudicial para a<br />
disciplina do estabelecimento. Houve um tempo em que os detentos de Baltimore<br />
podiam gastar imediatamente, com alimento, o dinheiro composto por seu pecúlio. Seu<br />
trabalho era então muito mais produtivo, mas se reconheceram os inconvenientes de<br />
1 A lei do Estado de Nova Iorque não permite ao superintendente dar aos condenados que são liberados<br />
mais que 3 dólares, mas ele deve lhe propiciar o necessário para que se vistam sem que o valor para tanto<br />
exceda os 10 dólares. Ver os Novos estatutos do estado de Nova Iorque, 4ª parte, cap. 3, tit. 2, art. 2, § 62.<br />
– Na Filadélfia, o superintendente pode dar aos crimi<strong>nos</strong>os liberados 4 dólares. – Art. 8 do regulamento.<br />
Ver o Relatório de 1831. – Em Boston, ele é autorizado a dar 5 dólares, e, além disso, ele deve fornecer a<br />
cada detento liberado uma vestimenta completa (a decent suit of clothes), que equivale, diz-se, a uma<br />
soma de 20 dólares. Os inspetores da prisão de Massachussetts parecem lamentar que se dê tanto aos<br />
condenados que saem da prisão. Ver o relatório destes inspetores de 1830, p. 4. – Sobre Wethersfield, ver<br />
o Relatório <strong>sobre</strong> a prisão de Connecticut, de 1828.<br />
2 Em geral, o momento mais perigoso para os condenados liberados é o de sua saída da prisão. Não é raro<br />
que todo seu pecúlio seja gasto nas vinte e quatro horas que se seguem à sua libertação. Em Genebra, para<br />
remediar esse mal, tem-se o costume de não dar aos condenados seu pecúlio no momento de sua saída da<br />
prisão. Isso é feito um pouco mais tarde quando se estabelecem em sua nova residência. Age-se, faz<br />
algum tempo, da mesma maneira na França com os condenados que saem dos trabalhos forçados e das<br />
prisões centrais. É uma medida sábia que importa conservar.<br />
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