Tocqueville e Beaumont - sobre o sistema penitenciário nos
Tocqueville e Beaumont - sobre o sistema penitenciário nos
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vezes o me<strong>nos</strong> rebelde na prisão. Ele é mais dócil que os outros, porque ele é mais<br />
inteligente, e ele sabe se submeter quando não tem condições para se revoltar. Ele é<br />
ordinariamente mais presto e mais ativo no trabalho, <strong>sobre</strong>tudo quando lhe é indicada<br />
uma recompensa futura como fim de seus esforços; quando, pois, são dados aos<br />
detentos privilégios em razão de sua conduta na prisão, arrisca-se e muito abrandar os<br />
rigores do encarceramento para o crimi<strong>nos</strong>o que mais lhes mereceu, e privar de todos os<br />
favores aqueles que seriam dig<strong>nos</strong> desses deles.<br />
Talvez, no estado atual de <strong>nos</strong>sas prisões, fosse impossível governá-las sem o<br />
socorro de recompensas dadas ao detento pelo seu zelo, atividade e talento. Mas, <strong>nos</strong><br />
Estados Unidos, onde a disciplina das prisões caminha apoiada no terror do castigo, não<br />
se tem necessidade, para dirigi-las, de uma influência moral.<br />
O interesse dos detentos exige que não sejam jamais ociosos: o da sociedade<br />
quer que eles trabalhem da maneira mais útil. Não se vê nas novas penitenciárias<br />
nenhuma dessas máquinas usadas na Inglaterra, que os prisioneiros movem sem<br />
inteligência e com a ajuda das quais exercem unicamente sua atividade física.<br />
O trabalho não é somente bom porque ele é o contrário da ociosidade; quer-se<br />
ainda que, trabalhando, o condenado aprenda uma profissão cujo exercício o fará viver<br />
quando sair da prisão.<br />
Ensinam-se aos detentos, portanto, somente trabalhos úteis; e, entre estes<br />
últimos, tem-se o cuidado de escolher aqueles que são mais proveitosos e cujos<br />
produtos encontrem um escoamento mais fácil.<br />
Criticou-se muitas vezes o <strong>sistema</strong> da Filadélfia por tornar impossível o trabalho<br />
dos detentos. É seguramente mais econômico e mais vantajoso fazer trabalhar em certo<br />
número de operários em um ateliê comum que dar emprego a cada um deles em um<br />
lugar separado. É ainda verdade dizer que um grande número de indústrias não podem<br />
ser empreendidas, de forma vantajosa, por um único operário em um lugar muito<br />
estreito; no entanto, o exemplo da penitenciária da Filadélfia, onde todos os detentos<br />
trabalham, prova que as profissões que podem ser exercidas por homens isolados são<br />
numerosas o suficiente para que estes fiquem ocupados utilmente 1 . A mesma<br />
dificuldade não é encontrada de forma alguma nas prisões onde os condenados<br />
trabalham em comum. Em Auburn, em Baltimore, exercem-se uma grande variedade de<br />
profissões. Essas duas prisões oferecem o aspecto de vastas manufaturas que reúnem<br />
todas as indústrias úteis. Em Boston e em Singsing a ocupação dos detentos foi até o<br />
presente mais uniforme. Nessas duas prisões, a maior parte dos detentos é empregada<br />
em talhar pedras. Wethersfield apresenta, em uma pequena escala, o mesmo espetáculo<br />
de Auburn.<br />
Em geral, o trabalho dos detentos é adjudicado a um empresário, que paga certo<br />
valor por cada jornada e recebe, em troca, tudo o que é manufaturado pelo detento.<br />
Existem diferenças essenciais entre esse <strong>sistema</strong> e o que é praticado em <strong>nos</strong>sas<br />
prisões. Em <strong>nos</strong>so país, o mesmo homem é o adjudicatário do alimento, da roupa, do<br />
trabalho e da saúde dos detentos, regime prejudicial ao condenado e à disciplina da<br />
prisão 2 ; ao condenado porque o empresário, que vê apenas em tal mercado um negócio<br />
lucrativo, especula <strong>sobre</strong> os víveres e <strong>sobre</strong> os trabalhos; se ele perde com a vestimenta,<br />
compensa com o alimento; e se o trabalho produz me<strong>nos</strong> que ele esperava, ele se<br />
indeniza gastando me<strong>nos</strong> com a manutenção que está a seu cargo. Esse <strong>sistema</strong> é<br />
1 As profissões praticadas pelos detentos na Filadélfia são as de tecelões, sapateiros, alfaiates,<br />
marceneiros, etc. Ver os Relatórios anuais dos inspetores da penitenciária da Pensilvânia (1831).<br />
2 Na prisão central de Melun, há uma biblioteca bastante considerável para uso dos detentos. Ela é<br />
fornecida pelo empresário, ao qual os prisioneiros pagam a locação de cada volume que lêem. Pode-se<br />
julgar por esse fato a natureza dos livros que compõe a biblioteca.<br />
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