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Tocqueville e Beaumont - sobre o sistema penitenciário nos

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sozinhos, porque existe entre eles uma comunicação moral. Em Auburn, eles estão<br />

realmente isolados, embora nenhum muro os separe.<br />

A reunião dos prisioneiros <strong>nos</strong> ateliês de trabalho nada tem de perigoso; ela tem,<br />

ademais, diz-se, um mérito que lhe é própria, o de acostumar os detentos à obediência.<br />

Qual é o objetivo principal da pena relativamente àquele que a sofre? É a de lhe<br />

propiciar hábitos sociais, e, antes de tudo, lhe ensinar a obedecer. A prisão de Auburn<br />

tem, nesse ponto, dizem seus partidários, uma vantagem manifesta <strong>sobre</strong> a de Filadélfia.<br />

A reclusão perpétua em uma célula é um fato irresistível que doma o detento<br />

sem combate, e despoja assim sua submissão de toda espécie de moralidade; preso entre<br />

estreitos muros, ele não tem, propriamente falando, nenhuma disciplina a seguir.<br />

Quando ele se cala, guarda um silêncio obrigado; se ele trabalha, é para escapara do<br />

tédio que o oprime: em uma palavra, ele obedece me<strong>nos</strong> à regra estabelecida que à<br />

impossibilidade física de agir de outra maneira.<br />

Em Auburn, ao contrário, o trabalho, ao invés de ser uma consolação para os<br />

detentos, é, aos seus olhos, uma tarefa sofrível da qual seria bom, para eles, escapar.<br />

Observando o silêncio, eles são incessantemente tentados a violar a lei. São submetidos<br />

à disciplina, e, no entanto, podem não sê-lo. Eles têm algum mérito em obedecer porque<br />

sua obediência não é uma necessidade. É assim que o regime de Auburn dá aos detentos<br />

hábitos de sociabilidade que eles não encontram absolutamente na prisão da Filadélfia.<br />

Vê-se que o silêncio é a base principal do <strong>sistema</strong> de Auburn; é ele que<br />

estabelece entre todos os detentos essa separação moral que os priva de todas as<br />

comunicações perigosas, e apenas lhes permitem as relações sociais no que estas têm de<br />

inofensivo.<br />

Mas aqui se apresenta contra esse <strong>sistema</strong> outra objeção grave: os partidários da<br />

prisão da Filadélfia dizem que a pretensão de reduzir a um silêncio absoluto um grande<br />

número de malfeitores reunidos é uma verdadeira quimera, e que essa impossibilidade<br />

arruína totalmente o <strong>sistema</strong> que tem no silêncio o único fundamento 1 .<br />

Pensamos que há muito exagero nessa crítica. Seguramente não se pode admitir<br />

a existência de uma disciplina levada a um grau tal de perfeição que garanta a<br />

observação rigorosa do silêncio entre um grande número de indivíduos reunidos cujos<br />

interesses e paixões os excitem a se comunicarem uns com os outros. Pode-se dizer, no<br />

entanto, que se, nas prisões de Auburn, de Singsing, de Boston e de Weathersfield, o<br />

silêncio não é sempre estritamente observado, os casos de infração são tão raros que se<br />

tornam pouco perigosos.<br />

Admitidos, como fomos, no interior desses diversos estabelecimentos, visitandoos<br />

a qualquer hora do dia sem sermos acompanhados por ninguém, inspecionando<br />

sucessivamente as células, os ateliês, a capela e os pátios, jamais surpreendemos um<br />

detento proferindo uma única palavra; e, no entanto, consagramos, por vezes, algumas<br />

semanas inteiras à observação da mesma prisão.<br />

Há em Auburn uma disposição do lugar que facilita singularmente a descoberta<br />

de todas as contravenções à disciplina. Cada um dos ateliês onde trabalham os detentos<br />

é cercado por uma galeria da qual se pode vê-los sem ser visto por eles. Muitas vezes,<br />

desta galeria, pudemos espiar a conduta dos prisioneiros que nunca encontramos<br />

cometendo um falta. Há, aliás, um fato que prova melhor que qualquer outro até que<br />

1 Ver a Carta de Livingston a Roberts Vauxs, 1828, p. 7 e 8. Existem certamente exemplos que provam a<br />

(in)observação do silêncio em alguns casos: isso é tão verdade que, em cada uma das prisões que<br />

examinamos, houve punições infligidas aos que foram surpreendidos infringindo a regra nesse ponto;<br />

deve-se acrescentar que um certo número de contravenções permanece sempre desconhecido. Mas a<br />

questão não é saber se há algumas infrações; essas infrações têm uma natureza tal que podem destruir a<br />

ordem do estabelecimento e impedir a reforma dos detentos? Esse é o ponto a examinar.<br />

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