09.05.2013 Views

Tocqueville e Beaumont - sobre o sistema penitenciário nos

Tocqueville e Beaumont - sobre o sistema penitenciário nos

Tocqueville e Beaumont - sobre o sistema penitenciário nos

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

encarceramento solitário absoluto que, à Walnut, era somente um acidente, devia ser o<br />

fundo do <strong>sistema</strong> de Pittsburg e de Cherry-Hill.<br />

A experiência que se iria fazer prometia ser decisiva: não se economizou para dar<br />

aos novos estabelecimentos uma construção digna de seu objetivo, e os edifícios que<br />

foram erguidos pareceram me<strong>nos</strong> com prisões que com palácios.<br />

No entanto, antes mesmo que as leis que tinham ordenado sua construção fossem<br />

executadas, tinha-se, no estado de Nova Iorque, feito a experiência da prisão de Auburn.<br />

Grandes debates aconteciam, nessa ocasião, no seio da legislatura; e o público estava<br />

impaciente para conhecer o resultado das novas experiências que vinham de ser feitas.<br />

Na ala do norte, já quase terminada em 1821, foram colocados oitenta crimi<strong>nos</strong>os,<br />

dando-se a cada um deles uma célula particular. Prometeu-se um feliz sucesso com essa<br />

tentativa, mas ela foi fatal para a maior parte dos detentos: para que se reformassem,<br />

foram submetidos a um isolamento completo; essa solidão absoluta, porém, quando<br />

nada distrai o homem dela ou a interrompe, está além das forças humanas, ela consome<br />

o crimi<strong>nos</strong>o sem descanso e sem piedade; ela não reforma, ela mata.<br />

Os infelizes com os quais se fez essa experiência tombaram em um estado de<br />

enfraquecimento tão patente que os guardas ficaram sensibilizados: a vida deles parecia<br />

em perigo se continuassem mais tempo na prisão submetidos ao mesmo regime: cinco<br />

dentre eles, durante um único ano, já tinham sucumbido; seu estado moral não era<br />

me<strong>nos</strong> inquietante: um deles tornou-se louco; outro, em um acesso de desespero, tinha<br />

se aproveitado do momento em que o carcereiro lhe trazia algo, para se precipitar para<br />

fora de sua célula correndo o perigo, quase inevitável, de uma queda mortal.<br />

Tendo semelhantes efeitos, o <strong>sistema</strong> foi julgado definitivamente. O governador<br />

do estado de Nova Iorque agraciou vinte e seis dos detentos solitários; aqueles para os<br />

quais não foi concedido tal favor saíram durante o dia e foram autorizados a trabalhar<br />

<strong>nos</strong> ateliês comuns. Desde essa época (1823), o <strong>sistema</strong> de isolamento sem restrição<br />

cessou inteiramente de ser praticado em Auburn: - logo se teve a prova que esse regime,<br />

funesto para a saúde dos crimi<strong>nos</strong>os, era impotente para conseguir a reforma destes. Dos<br />

vinte e seis condenados que o governador tinha agraciado, quatorze voltaram pouco<br />

tempo depois pra a prisão devido a novas condenações 1 .<br />

Essa experiência, tão funesta para os que foram escolhidos para vivê-la, arriscava,<br />

por sua natureza, comprometer a sorte do <strong>sistema</strong> <strong>penitenciário</strong>. Depois dos desastrosos<br />

efeitos do isolamento, era de temer que não se rejeitasse inteiramente o princípio: era<br />

uma reação natural. Usou-se mais sabedoria: persistiu-se em pensar que a solidão que<br />

faz os crimi<strong>nos</strong>os refletirem, e que os separa dos outros, exerce uma boa influência; e<br />

procurou-se somente o meio de evitar os inconvenientes do isolamento, conservando-se<br />

suas vantagens. Acreditou-se chegar nesse ponto fazendo com que os condenados<br />

trabalhassem, durante o dia, <strong>nos</strong> ateliês comuns em meio a um silêncio absoluto.<br />

Os senhores Allen, Hopkins, e Tibbits, que, em 1824, foram encarregados, pela<br />

legislatura de Nova Iorque, de inspecionar a prisão de Auburn, encontraram já<br />

estabelecida, nesse lugar, essa nova disciplina. Fizeram dela um grande elogio em seu<br />

relatório, e a legislatura sancionou o novo <strong>sistema</strong> com sua aprovação formal.<br />

Aqui se apresenta uma obscuridade que não esteve em <strong>nos</strong>so poder dissipar.<br />

Vemos o famoso <strong>sistema</strong> de Auburn nascer de uma vez e surgir da combinação<br />

engenhosa de dois elementos que parecem, num primeiro olhar, incompatíveis, o<br />

isolamento e a reunião. Mas o que não percebemos claramente é quem criou esse<br />

<strong>sistema</strong>, sendo necessário que alguém o tivesse pensado pela primeira vez...<br />

1 Ver o Relatório de Gershom Powers, e a nota manuscrita de Elam Lynds.<br />

33

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!