Tocqueville e Beaumont - sobre o sistema penitenciário nos
Tocqueville e Beaumont - sobre o sistema penitenciário nos
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leis de 5 de abril de 1790 e de 22 de março de 1794, de enviar para a prisão de Walnut<br />
os condenados que precedentemente tinham sido detidos nas cadeias particulares dos<br />
condados, não tardou a se transformar, para esta prisão em um empecilho tal, que as<br />
dificuldades de classificação aumentaram ao mesmo tempo que tornou-se insuficiente o<br />
número de células 1 .<br />
Em verdade, não havia ainda um <strong>sistema</strong> <strong>penitenciário</strong> <strong>nos</strong> Estados Unidos.<br />
Se se pergunta por que esse nome foi dado ao regime de encarceramento que<br />
vinha de ser estabelecido, responderemos que então, como hoje em dia, confundia-se na<br />
América a abolição da pena de morte com o <strong>sistema</strong> <strong>penitenciário</strong>. Dizia-se: Ao invés de<br />
matar o culpado, <strong>nos</strong>sas leis o colocam em uma prisão: portanto, nós temos um <strong>sistema</strong><br />
<strong>penitenciário</strong>.<br />
A conseqüência não era justa. É certo que a pena de morte aplicada na maior parte<br />
dos crimes é inconciliável com um regime de encarceramento; mas, uma vez essa pena<br />
abolida, o <strong>sistema</strong> não existe virtualmente: é preciso ainda que o crimi<strong>nos</strong>o, do qual se<br />
poupou a vida, seja colocado em uma prisão cujo regime o torne melhor. Pois, se esse<br />
regime, ao invés de reformá-lo, apenas o corrompesse ainda mais, isso não seria um<br />
<strong>sistema</strong> <strong>penitenciário</strong>, mas somente um mau <strong>sistema</strong> de encarceramento.<br />
Durante muito tempo, na França, cometeu-se o erro dos america<strong>nos</strong> nesse caso.<br />
Em 1794, o duque de La Rochefoucauld-Liancourt publicou um texto interessante <strong>sobre</strong><br />
a prisão da Filadélfia: ele declarou que essa cidade tinha um excelente <strong>sistema</strong> de<br />
prisão, e todo mundo o repetiu 2 .<br />
No entanto, a prisão de Walnut-Street não podia produzir nenhum dos efeitos que<br />
se espera desse <strong>sistema</strong>. Ela tinha dois vícios principais: ela corrompia, pelo contágio de<br />
comunicações mútuas, os condenados que trabalhavam juntos; ela corrompia pela<br />
ociosidade os indivíduos mergulhados no isolamento.<br />
O verdadeiro mérito de seus fundadores foi abolir as leis sanguinárias da<br />
Pensilvânia, e, introduzindo um novo <strong>sistema</strong> de detenção, chamar a atenção pública<br />
para esse ponto. Infelizmente não se distinguiu desde o início o que, nessa inovação, era<br />
digno de elogios do que merecia desaprovação.<br />
A pena de isolamento aplicada ao crimi<strong>nos</strong>o para conduzi-lo à reforma pela<br />
reflexão repousa <strong>sobre</strong> um pensamento filosófico e verdadeiro. Mas os autores dessa<br />
teoria não a haviam incrementado para que pudesse se tornar praticável e salutar. No<br />
entanto, o erro deles não foi rapidamente percebido, e o sucesso da prisão de Walnut-<br />
Street, ostentado <strong>nos</strong> Estados Unidos mais ainda do que na Europa, fez serem aceitos<br />
pela opinião tanto seus vícios como suas vantagens.<br />
O primeiro estado que se dispôs a imitar a Pensilvânia foi o de Nova Iorque, que,<br />
em 1797, adotou com novas leis um novo <strong>sistema</strong> de prisão.<br />
O encarceramento solitário sem trabalho foi admitido neste estado bem como na<br />
Filadélfia; mas, da mesma forma que em Walnut-Street, ele foi reservado para aqueles<br />
que eram especialmente a ele condenados pelas cortes de justiça, e para os infratores do<br />
regulamento da prisão. O encarceramento solitário não foi, portanto, o regime ordinário<br />
do estabelecimento, ele era um compartimento exclusivo dos grandes crimi<strong>nos</strong>os que,<br />
antes da reforma das leis penais, tivessem sido condenados à morte. De resto, os<br />
culpados de uma ordem inferior eram reunidos indistintamente na prisão;<br />
diferentemente dos detidos em células, eles deviam trabalhar durante o dia, e o único<br />
1 Ver Letter from Samuel Wood, to Thomas Keltera, Philadelphia, 1831. E também Notices of the original<br />
and successive efforts to improve the discipline of the prison at Philadelphia, and to reform the criminal<br />
Code of Pennsylvania, by Roberts Vaux.<br />
2 Ver Des prisons de Philadelphie, par um européen (La Rochefoucald-Liancourt), ano IV da república,<br />
Paris.<br />
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