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Tocqueville e Beaumont - sobre o sistema penitenciário nos

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França está cheia delas e podem ser encontradas em livros de todas as épocas e de<br />

todos os povos; mas nós queremos fatos”. 1<br />

A preocupação dos dois amigos sempre se voltou para o que pensavam ser<br />

realizável. Suas críticas às punições e às propostas de reformas penitenciárias referiamse,<br />

por um lado, à sua viabilidade e, por outro, à descrença na possibilidade de uma<br />

recuperação total do prisioneiro. Falam das teorias de Bentham num tom crítico e<br />

mordaz, como sendo utópicas 2 . Elogiam Edward Livingston 3 , que era considerado o<br />

mais liberal dos teóricos <strong>sobre</strong> essa questão, citando duas de suas obras como<br />

“monumentos de sabedoria e de razão, onde se encontram os detalhes mais simples<br />

misturados aos princípios da mais alta filosofia,” 4 mas discordam totalmente das suas<br />

posições a favor de um tratamento mais humanista e educativo. Mas é <strong>sobre</strong>tudo com o<br />

francês Charles Lucas que mais discutem e discordam.<br />

Charles Lucas já há muito vinha se ocupando da reforma das prisões francesas e<br />

havia publicado vários estudos <strong>sobre</strong> o tema. Entre estes, seu trabalho <strong>sobre</strong> o <strong>sistema</strong><br />

<strong>penitenciário</strong> na Europa e <strong>nos</strong> Estados Unidos foi considerado pelos dois autores como<br />

“a obra mais completa <strong>sobre</strong> o assunto, resumindo muito bem as diversas teorias das<br />

quais o <strong>sistema</strong> <strong>penitenciário</strong> tem sido objeto” 5 . No entanto, na maioria das vezes, eles<br />

se manifestam contra as propostas de Lucas, especialmente, aquelas que dizem respeito<br />

ao bem estar dos prisioneiros, em especial quando se referem a um maior convívio<br />

social.<br />

No Relatório, <strong>Beaumont</strong> e <strong>Tocqueville</strong> se referem aos três pensadores citados –<br />

Benthan, Livingstone e Lucas – como sonhadores, filantrópicos e utópicos. Michelle<br />

Perrot trata muito bem essas divergências e lembra que elas englobavam também as<br />

duas lutas mais combativas e humanitárias da época: aquela contra os castigos<br />

corporais, e a outra, contra a pena de morte. Lucas era um dos que mais defendia o fim<br />

das prisões celulares individuais, os castigos corporais e a pena de morte. Essas eram<br />

questões que agitavam o Congresso francês mesmo antes da revolução de julho de<br />

1830. À época, <strong>Tocqueville</strong> não estava tão envolvido nessa questão quanto sua família.<br />

Seu pai e seus tios já haviam assinado vários manifestos contra a pena de morte, a<br />

prisão política e os maus tratos aos prisioneiros. 6<br />

<strong>Tocqueville</strong> e <strong>Beaumont</strong> não eram contra as solitárias. As solitárias significavam<br />

isolamento, mas esse isolamento poderia ser total ou apenas noturno, com trabalho<br />

comum durante o dia. Além disso, apesar de serem contra a pena de morte, nem sempre<br />

eram contra alguns castigos. Em suas argumentações dos prós e contras desses dois<br />

aspectos, parecem muito seguros das vantagens da substituição da pena de morte por<br />

1 O.C., T. I V, v.1., p. 67<br />

2 As teorias de Jeremy Bentham <strong>sobre</strong> penas e recompensas e a importância da vigilância nas prisões<br />

explicadas em suas duas obras mais famosas, respectivamente o Tratado das penas e recompensas e o<br />

Panóptico eram muito debatidas, por ingleses e franceses, em fins do século XVIII e no XIX.<br />

3 Livingston, Edward. Introdução ao Código de reforma e de disciplina das prisões da Pensilvânia e<br />

outros estudos como o Projeto do Código penal para a Luisiana.<br />

4 O. C., T. IV, v.1, p. 52.<br />

5 Lucas, Charles: Du système pénitenciaire en Europe et aux États Unis. Cit. in O.C., T. IV, v.1, p.52.<br />

Esta obra havia conquistado o prêmio Monthyon da Académie des Sciences Morales et Politiques. (Era<br />

um militante contra a pena de morte. “Por sua iniciativa, neste sentido, uma petição assinada por<br />

quarenta e três personalidades liberais foi enviada às Câmaras em 1829. Recusada pelo ministro do<br />

Interior como anticonstitucional, ela é novamente apresentada após a revolução de julho. Le Peletier<br />

d‟Aunay, primo de <strong>Tocqueville</strong>, propõe a supressão da pena de morte em matéria política. Lamartine a<br />

fará passar apenas em 1848.” Cit. Por M. Perrot, op.cit. Id.ib.)<br />

6 Os pais de <strong>Tocqueville</strong> haviam sido presos durante a revolução de 1789 e seus avós mater<strong>nos</strong><br />

guilhotinados.<br />

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