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walter benjamin - Programa de Pós-Graduação em Filosofia - UFBA ...

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Essa al<strong>de</strong>ia talmúdica está no centro do mundo kafkiano. O hom<strong>em</strong><br />

<strong>de</strong> hoje vive <strong>em</strong> seu corpo como K. ao pé do castelo: ele <strong>de</strong>sliza fora<br />

<strong>de</strong>le e lhe é hostil. Po<strong>de</strong> ocorrer que o hom<strong>em</strong> acor<strong>de</strong> um dia e<br />

verifique que se transformou num inseto. O país <strong>de</strong> exílio – o seu<br />

exílio – apo<strong>de</strong>rou-se <strong>de</strong>le. É o ar <strong>de</strong>ssa al<strong>de</strong>ia que sopra no mundo<br />

<strong>de</strong> Kafka, e é por isso que ele nunca ce<strong>de</strong>u à tentação <strong>de</strong> fundar uma<br />

religião. 94<br />

No momento <strong>em</strong> que cria suas fábulas e contos ele revela ao leitor lições.<br />

Diferente do conselho, a lição t<strong>em</strong> um valor universal, por isso que o verda<strong>de</strong>iro<br />

narrador s<strong>em</strong>pre t<strong>em</strong> algo a dizer. Quando Benjamin diz que aconselhar é menos<br />

respon<strong>de</strong>r a uma pergunta que fazer uma sugestão abre caminho para o que<br />

entendo por lição. A meu ver, a riqueza da obra <strong>de</strong> Kafka está <strong>em</strong> conciliar dois<br />

mundos, o mundo oriental com sua sabedoria e serenida<strong>de</strong> (forte influência oral)<br />

com o mundo oci<strong>de</strong>ntal mo<strong>de</strong>rno repleto <strong>de</strong> contradições. Do mundo oriental Rabi<br />

Nakhman é a influência direta mesmo tendo posições <strong>de</strong>finidas <strong>em</strong> sist<strong>em</strong>as<br />

diferentes, como observou Man<strong>de</strong>lbaum:<br />

Kafka e Rabi Nakhman assum<strong>em</strong> ambos posições b<strong>em</strong>-<strong>de</strong>finidas, no<br />

interior <strong>de</strong> sist<strong>em</strong>as b<strong>em</strong>-diferenciados. Um tinha como horizonte e<br />

<strong>em</strong>penho diário o campo da escrita e a prática da literatura, e é para<br />

<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>sse campo que arrasta as contingências centrais <strong>de</strong> seu<br />

existir, para fazer <strong>de</strong>las o material e o ambiente <strong>de</strong> sua incursão<br />

textual. O outro fazia <strong>de</strong> sua conexão com D´us o eixo <strong>de</strong> suas<br />

incursões investigativas e, da atualização da a<strong>de</strong>são <strong>de</strong> seu povo<br />

aos imperativos da Lei da Torá, o campo <strong>de</strong> sua atuação. Rabi<br />

Nakhman era um hom<strong>em</strong> plenamente inserido numa tradição, que se<br />

orienta <strong>em</strong> total acordo com os pressupostos que lhe vêm da sua fé,<br />

na condição <strong>de</strong> praticante. Kafka era um hom<strong>em</strong> que se interrogava<br />

sobre a condição espiritual num terreno difuso e laico. 95<br />

A ressonância judaica na estrutura narrativa <strong>de</strong> Kafka é incontestável, no<br />

entanto, precisamos tomar cuidado ao afirmar que existe uma pedagogia. Tomo a<br />

pedagogia como uma ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> formação da alma e os meios <strong>de</strong> educação como<br />

instrumentos formativos. Se existe uma função pedagógica na narração oral, e<br />

reconheço <strong>em</strong> Kafka a figura do gran<strong>de</strong> narrador, não po<strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar que sua<br />

obra é composta <strong>de</strong> preciosos ensinamentos para a humanida<strong>de</strong>. A primeira lição<br />

que po<strong>de</strong>mos tirar <strong>de</strong> Kafka é que a vida humana é uma procura orgulhosa pelo<br />

saber. Mas esse saber não é algo que liberta, transforma o hom<strong>em</strong> e o afasta da<br />

94 Ibid. p. 151-152.<br />

95 Op. cit. p.104.<br />

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