walter benjamin - Programa de Pós-Graduação em Filosofia - UFBA ...
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examinado mais de perto no indivíduo ocioso, como em um espelho. 48 A análise presente em Experiência e pobreza descreve primeiramente a fragmentação da narração tradicional numa multiplicidade de narrativas independentes, ao mesmo tempo objetivas. Já em O Narrador, a experiência narrativa está vinculada à reminiscência, onde o resgate do passado pela memória é o ponto de partida para o conhecimento. Com o empobrecimento gradual da experiência a partir da vivência do choque, o homem vai aos poucos perdendo a memória individual e coletiva. Quando privado da experiência, o homem é privado de sua história, e da capacidade de integrar-se numa tradição. A experiência é a matéria da tradição. Nas sociedades tradicionais a memória individual e a coletiva se fundem - é isso que nos fala O Narrador, a fusão entre passado individual e o coletivo num tipo de comunicação baseado na oralidade. É a troca de experiência que é fundamental para formação do sujeito: A reminiscência funda a cadeia da tradição, que transmite os acontecimentos de geração em geração. Ela corresponde à musa épica no sentido mais amplo. Ela inclui todas as variedades da forma épica. Entre elas, encontra-se em primeiro lugar a encarnada pelo narrador. 49 No último ensaio em vida, Sobre o conceito da história, Benjamin recorre à memória como base para a responsabilidade histórica. Com o enfraquecimento da narração oral ocorre uma desvalorização da memória como parte fundamental do conhecimento dentro da tradição. Segundo ele, é a revolução proletária que pode e deve operar a interrupção messiânica na história. Somente ela é capaz, já que se alimenta das forças da rememoração, de restaurar a experiência perdida e abolir a fúria do capitalismo. Este espírito revolucionário é uma utopia do porvir na redenção messiânica. Como observou Michel Lowy no livro Redenção e Utopia, a busca aparentemente voltada para a experiência perdida no passado algumas vezes presente no pensamento de Benjamin orienta-se na verdade para o porvir messiânico/revolucionário. Para compreender o seu pensamento messiânico/revolucionário, precisamos observar o que ele entende por “presente”. O termo “presente” é o anúncio de como parte de uma tarefa particular que está ela própria situada no equivalente a um prefácio. Ele estará sempre relacionado ao futuro, já que o antecipa e constrói. 48 Ibid. p.126-127. 49 Op.cit. p. 211. 44
Dessa forma, o que está envolvido é a compreensão da interação entre ontologia e a ação anunciada na recitação do “presente”, isto é, o posicionamento de um outro presente epocal posicionado como projetando uma tarefa a ser completada na escrita. Benjamin acreditava que a experiência existencial está invariavelmente liga a idéia de interpretação. Ao interpretarmos a história estamos interpretando a nós mesmo, e quando escrevemos sobre ela estamos escrevendo um prefácio de um presente por vir. O presente está sempre a caminho enquanto tarefa a ser completada na escrita. Ele escreve na Tese XIV do ensaio Sobre o conceito da história, que a história é objeto de uma construção cujo lugar não é o tempo homogêneo e vazio, mas um tempo saturado de “agoras”. No livro A Escola de Frankfurt, Rolf Wiggershaus analisa o que é esta predominância do “agora” no pensamento benjaminiano: Quando Benjamin falava a respeito de “dialética imóvel”, pensava na relação entre presente e passado que se instaurava graças a uma tal imobilização. Essa expressão não designava uma imobilização da dialética, mas uma dialética que só entrava em jogo na imobilidade. Para Benjamin, a predominância do “agora” nas coisas era dialética – não era, pois, uma passagem ou uma reviravolta como para Adorno ou Hegel, mas saída, fora do tempo homogêneo para entrar num tempo pleno, a explosão da continuidade histórica, do progresso que se desenrola com uma inexorabilidade mítica, mas atenuado sob dimensões decisivas. Benjamin qualificava de “dialéticas” as imagens que considerava uma presentificação do passado porque elas não estavam fora do tempo nem eram momentos de um fluxo de acontecimentos contínuo e homogêneo, mas constelações instantâneas de presente e de passado. 50 Por isso ele parte da idéia do “presente” enquanto um prefácio a ser escrito, já que o presente epocal encontra-se em aberto. Wiggershaus conclui que uma parte desprezada ou esquecida do passado afirmava-se num presente que se alargava, englobando-o. Desta forma, o passado era salvo por um presente que escapava de suas próprias limitações. Benjamin parte de uma interpretação da história onde o comentário passa por um olhar teológico. Constatamos isso no ensaio Sobre o conceito da história, onde a interação entre o tempo e a política é pensada por um olhar messiânico da história. 50 WIGGERSHAUS, Rolf. A Escola de Frankfurt: história, desenvolvimento teórico, significação política. Trad.: Lilyane Deroche-Gurcel e Vera de Azambuja Harvey. Rio de Janeiro: Difel, 2002. p. 232. 45
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Dessa forma, o que está envolvido é a compreensão da interação entre ontologia e a<br />
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Quando Benjamin falava a respeito <strong>de</strong> “dialética imóvel”, pensava na<br />
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Para Benjamin, a predominância do “agora” nas coisas era dialética –<br />
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acontecimentos contínuo e homogêneo, mas constelações<br />
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Por isso ele parte da idéia do “presente” enquanto um prefácio a ser escrito, já<br />
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50 WIGGERSHAUS, Rolf. A Escola <strong>de</strong> Frankfurt: história, <strong>de</strong>senvolvimento teórico,<br />
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