walter benjamin - Programa de Pós-Graduação em Filosofia - UFBA ...

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09.05.2013 Views

O pensamento teológico de Benjamin é construído conforme um paradigma messiânico/restitucionista de inspiração cabalista, voltado para a restauração da harmonia do Éden. Se a consciência histórica resulta da experiência do homem na história, com a atrofia da experiência, ela é comprometida. Portanto, experiência e narração no seu pensamento acontecem a partir de uma consciência histórica seguida de um desejo de justiça. Dessa forma quer se trate do passado ou do futuro a abertura da história para ele é inseparável de uma opção ética, social e política. A problemática da narração o preocupa, pois ela concentra em si, os paradoxos da modernidade. Nesse paradoxo a teologia negativa converte a experiência do nada em seu contrário, na epifania de um Deus esquecido. Nesse ponto a narração possibilita a conservação da história através da memória: 108 Um paradoxo que se esclarece, se se compreende que o verdadeiro objeto da lembrança e da rememoração não é, simplesmente, a particularidade de um acontecimento, mas aquilo que, nele, é criação especifica, promessa do inaudito, emergência do novo. Se a lembrança se contenta em conservar piamente o passado numa fidelidade inquieta e crispada, ela se torna, sub-repticiamente, infiel a ele por negligenciar o essencial: o que havia nele de renovação e que só pode repetir-se sendo outro, criação e diferença. Essa estrutura paradoxal do lembrar criador e transformador (inerente à compreensão autêntica do rito), funda a concepção benjaminiana de uma escrita da história ao mesmo tempo destrutora e salvadora. A veemência, mesmo a violência da tradição profética e a radicalidade da tradição marxista se encontram aqui na exigência de uma salvação que não consista simplesmente na conservação do passado, mas que seja também transformação ativa do presente. 141 Se a linguagem tem um papel central nos seus estudos, nela e tão somente nela, pode ocorrer a redenção da história. Seu estudo sobre a narração aponta para a ideologia do progresso ao denunciar as falhas decorrentes da perda da capacidade de narrar. Benjamin propõe construir pela narração oral as bases necessárias para as relações humanas, uma relação de aproximação. Lowy observa que para ele a rememoração das vitimas não é uma lamúria melancólica ou mesmo uma meditação mística, mas ela só tem sentido quando se torna uma fonte de energia moral e espiritual para aqueles que lutam hoje pela transformação do presente. 141 Op. cit. p. 105.

No momento em que interpretamos o estudo sobre a narração como parte das Teses da História reconhecemos que ela é o resultado final tanto da atrofia da experiência como da ausência de diálogo. É aquilo que Benjamin chama de perda de um mundo ético. A tradição profética judaica subverte o ordenamento tranqüilo do discurso estabelecido, exige do homem uma postura moral diante de um mundo esfacelado pela indiferença, ao convocar cada leitor a repensar seu papel na história. Nesse sentido não é somente o futuro e o presente que permanecem abertos na interpretação benjaminiana, mas também o passado. O passado está em aberto no momento que exige sua leitura. Fica evidente, que o messianismo é um dos principais focos espirituais do pensamento de Benjamin, é mais que uma teoria trata-se de uma fé profundamente enraizada. Essa fé se manifesta não apenas nos seus escritos de caráter teológicos (Sobre a linguagem em geral, sobre a linguagem humana, A tarefa do tradutor e O ensino da moral), mas também nos seus ensaios literários, por exemplo, Afinidades Eletivas de Goethe, onde no final ele trata do “mistério da esperança”, a esperança de um “mundo bem aventurado” e da redenção. No entanto, a teologia messiânica só aparece explicitamente no seu último escrito. Lowy escreve: 109 No momento do pacto germano-sovietico, a esperança da redenção parece fugir do mundo histórico para se refugiar na transcendência. Uma análise aprofundada dessas “Teses” escapa ao quadro histórico em que nos colocamos (1905-1923), mas elas constituem ao mesmo tempo, a síntese e o coroamento de todo pensamento de Benjamin. Trata-se na nossa opinião, de uma das manifestações mais fulgurantes, na filosofia política do século XX, da visão messiânicorevolucionária e utópico-restauradora. 142 Inspirado pelo romantismo, Benjamin ataca o mito do progresso, mito no qual sucumbiram os dirigentes stalinistas do movimento comunista, que durante muito tempo lutaram contra o fascismo, e que traíram sua própria causa ao assinar o pacto germano-sovietico com Hitler. Assim como a social-democracia, cujo reformismo tem por idéia de progresso o domínio sobre a natureza, que encontra no desenvolvimento técnico a direção indicada pelo progresso. Para sintetizar sua crítica, faz uso do Anjo da História. A tempestade afasta a humanidade do Paraíso perdido, e o “progresso” histórico não passa de um imenso campo de ruínas. Para 142 Op. cit. p. 171.

O pensamento teológico <strong>de</strong> Benjamin é construído conforme um paradigma<br />

messiânico/restitucionista <strong>de</strong> inspiração cabalista, voltado para a restauração da<br />

harmonia do É<strong>de</strong>n. Se a consciência histórica resulta da experiência do hom<strong>em</strong> na<br />

história, com a atrofia da experiência, ela é comprometida. Portanto, experiência e<br />

narração no seu pensamento acontec<strong>em</strong> a partir <strong>de</strong> uma consciência histórica<br />

seguida <strong>de</strong> um <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> justiça. Dessa forma quer se trate do passado ou do futuro<br />

a abertura da história para ele é inseparável <strong>de</strong> uma opção ética, social e política.<br />

A probl<strong>em</strong>ática da narração o preocupa, pois ela concentra <strong>em</strong> si, os<br />

paradoxos da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>. Nesse paradoxo a teologia negativa converte a<br />

experiência do nada <strong>em</strong> seu contrário, na epifania <strong>de</strong> um Deus esquecido. Nesse<br />

ponto a narração possibilita a conservação da história através da m<strong>em</strong>ória:<br />

108<br />

Um paradoxo que se esclarece, se se compreen<strong>de</strong> que o verda<strong>de</strong>iro<br />

objeto da l<strong>em</strong>brança e da r<strong>em</strong><strong>em</strong>oração não é, simplesmente, a<br />

particularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um acontecimento, mas aquilo que, nele, é criação<br />

especifica, promessa do inaudito, <strong>em</strong>ergência do novo. Se a<br />

l<strong>em</strong>brança se contenta <strong>em</strong> conservar piamente o passado numa<br />

fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> inquieta e crispada, ela se torna, sub-repticiamente, infiel a<br />

ele por negligenciar o essencial: o que havia nele <strong>de</strong> renovação e<br />

que só po<strong>de</strong> repetir-se sendo outro, criação e diferença. Essa<br />

estrutura paradoxal do l<strong>em</strong>brar criador e transformador (inerente à<br />

compreensão autêntica do rito), funda a concepção <strong>benjamin</strong>iana <strong>de</strong><br />

uma escrita da história ao mesmo t<strong>em</strong>po <strong>de</strong>strutora e salvadora. A<br />

ve<strong>em</strong>ência, mesmo a violência da tradição profética e a radicalida<strong>de</strong><br />

da tradição marxista se encontram aqui na exigência <strong>de</strong> uma<br />

salvação que não consista simplesmente na conservação do<br />

passado, mas que seja também transformação ativa do presente. 141<br />

Se a linguag<strong>em</strong> t<strong>em</strong> um papel central nos seus estudos, nela e tão somente<br />

nela, po<strong>de</strong> ocorrer a re<strong>de</strong>nção da história. Seu estudo sobre a narração aponta para<br />

a i<strong>de</strong>ologia do progresso ao <strong>de</strong>nunciar as falhas <strong>de</strong>correntes da perda da<br />

capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> narrar. Benjamin propõe construir pela narração oral as bases<br />

necessárias para as relações humanas, uma relação <strong>de</strong> aproximação. Lowy<br />

observa que para ele a r<strong>em</strong><strong>em</strong>oração das vitimas não é uma lamúria melancólica ou<br />

mesmo uma meditação mística, mas ela só t<strong>em</strong> sentido quando se torna uma fonte<br />

<strong>de</strong> energia moral e espiritual para aqueles que lutam hoje pela transformação do<br />

presente.<br />

141 Op. cit. p. 105.

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