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Pelas tramas de uma cidade migrante (Joinville, 1980-2010)

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na escola <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os primeiros anos do ensino fundamental. Disse a<br />

entrevistada: “não adianta escrever livro, porque hoje a escola não conta<br />

a história dos negros como tem que ser contada”.<br />

A necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conscientização, portanto, pontuou os<br />

posicionamentos das nossas duas entrevistadas, ambas educadoras.<br />

Alessandra e Maria Laura, embora com propósitos e justificativas<br />

distintas, elegeram a história como meio capaz <strong>de</strong> cientificar os sujeitos.<br />

Para Alessandra, a história conscientizadora é aquela que “revelará”<br />

o processo <strong>de</strong> urbanida<strong>de</strong> dos afro-joinvilenses. Para Maria Laura, a<br />

história conscientizadora é aquela que, ao “revelar” o passado escravista<br />

que incidiu sobre a posição <strong>de</strong> inferiorida<strong>de</strong> dos afro-joinvilenses, irá<br />

tornar-se po<strong>de</strong>roso instrumento pedagógico para o aprendizado <strong>de</strong><br />

conteúdos que se acreditam invariáveis e válidos em qualquer contexto<br />

e época.<br />

O intrincado enredo que envolvia o estan<strong>de</strong> “África” na Festa das<br />

Tradições levou-me a refletir sobre dois problemas. Primeiramente, ele<br />

me fornecia elementos que ilustravam questões presentes nos <strong>de</strong>bates<br />

historiográficos sobre o sistema escravista e, por extensão, sobre o “ser<br />

escravo no Brasil” 58 . As polêmicas que consi<strong>de</strong>ravam os escravos como<br />

inferiores ou dóceis, violentos ou apáticos, coisificados ou senhores <strong>de</strong><br />

seu próprio <strong>de</strong>stino 59 ressoavam nas minhas reflexões sobre as opiniões<br />

e posições políticas divergentes das entrevistadas e sobre a visualida<strong>de</strong><br />

do próprio estan<strong>de</strong>. Em segundo lugar, o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> conscientizar pela<br />

história, expresso pelas nossas entrevistadas, correspon<strong>de</strong>ria à tendência<br />

atual <strong>de</strong> validar o conhecimento segundo a lógica <strong>de</strong> sua utilida<strong>de</strong> e<br />

êxito. O conhecimento histórico, assim, tornar-se-ia relevante à medida<br />

que formulasse sistemas <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias que pu<strong>de</strong>ssem ser empregados para<br />

dirigir, ou mesmo elucidar, as relações que estabelecemos no mundo.<br />

Afinal, se não for assim, para que serviria a história?<br />

Essa percepção “militante”, carregada por anacronismos, embora<br />

bastante discutida e por alguns combatida no campo da teoria e da<br />

metodologia da história, é também apontada como <strong>uma</strong> das principais<br />

armadilhas do profissional da história, já que, como sujeito do<br />

conhecimento, o tempo presente envolve o exercício <strong>de</strong> suas funções<br />

58 Refiro-me ao título do livro <strong>de</strong> Kátia Mattoso. MATTOSO, Kátia. ser escravo no Brasil.<br />

São Paulo: Brasiliense, 1982.<br />

59 A esse respeito ver QUEIRÓZ, Suely Robles Reis <strong>de</strong>. Escravidão negra em <strong>de</strong>bate. In:<br />

FREITAS, Marcos Cezar (Org.). Historiografia brasileira em perspectiva. São Paulo:<br />

Contexto, 1998. p. 103-117.<br />

59

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