08.05.2013 Views

Pelas tramas de uma cidade migrante (Joinville, 1980-2010)

Pelas tramas de uma cidade migrante (Joinville, 1980-2010)

Pelas tramas de uma cidade migrante (Joinville, 1980-2010)

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

52<br />

Tal perspectiva confirma o que apontou a historiadora Maria<br />

Bernar<strong>de</strong>te Ramos Flores em seu estudo sobre as festas das cida<strong>de</strong>s<br />

dos vales do Itajaí-Açu e do Itapocu: “A imagem da cida<strong>de</strong> germânica,<br />

com todos os atributos que aí se instituíram – o trabalho, a <strong>de</strong>dicação,<br />

a origem – reveste os produtos industriais, acrescentados por esta<br />

simbologia” 43 . Isso teria permitido que as próprias festas <strong>de</strong> outubro, com<br />

suas metodologias <strong>de</strong> divulgação e <strong>de</strong> marketing, fossem transformadas<br />

em vitrines <strong>de</strong>ssas cida<strong>de</strong>s industriais, contribuindo para consolidar<br />

Santa Catarina n<strong>uma</strong> grife 44 .<br />

Entretanto a narrativa <strong>de</strong> Wilmar <strong>de</strong> Souza sobre o caráter<br />

germânico <strong>de</strong> <strong>Joinville</strong> revestia-se <strong>de</strong> <strong>uma</strong> iconoclastia perturbadora.<br />

Se para Ternes era impossível <strong>de</strong>svincular a história da cida<strong>de</strong> da saga<br />

dos i<strong>migrante</strong>s alemães e <strong>de</strong> seus <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes, para Souza bastava<br />

“olhar” para essa história e constatar que “nunca foi alemã <strong>de</strong> fato”.<br />

Expor a pertença étnica alemã na Festa das Tradições consistiria, então,<br />

em continuar investindo n<strong>uma</strong> grife que agregava valor ficcional ao<br />

presente e ao passado urbano?<br />

A problemática aberta não se refere à autenticida<strong>de</strong> ou à<br />

artificialida<strong>de</strong> do germanismo, mas às tensões que articulam esse<br />

processo <strong>de</strong> transformação imagética e simbólica, pelo qual <strong>Joinville</strong><br />

<strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser apenas <strong>uma</strong> cida<strong>de</strong> alemã encravada no sul do Brasil para<br />

tornar-se <strong>uma</strong> cida<strong>de</strong> “multicultural”. Isso inci<strong>de</strong> sobre o conjunto<br />

<strong>de</strong> questionamentos acerca da cida<strong>de</strong> do presente e <strong>de</strong> como os seus<br />

moradores a historicizam.<br />

Segundo o historiador François Hartog, vivemos sob um novo<br />

regime <strong>de</strong> historicida<strong>de</strong> 45 , o qual dá relevo crescente ao presente<br />

enquanto tal, tornando-o “massivo, invasor, onipresente, que não tem<br />

outro horizonte além <strong>de</strong>le mesmo, fabricando cotidianamente o passado<br />

e o futuro do qual ele tem necessida<strong>de</strong>” 46 . Assim, po<strong>de</strong>-se consi<strong>de</strong>rar que<br />

esse “presentismo” – que inunda os enunciados históricos <strong>de</strong> <strong>uma</strong> dada<br />

43 FLORES, Maria Bernar<strong>de</strong>te Ramos. oktoberfest: turismo, festa e cultura na estação do<br />

chopp. Florianópolis: Obra Jurídica, 1997. p. 154.<br />

44 Id. Ibid. p. 124.<br />

45 Conforme Hartog, por regime <strong>de</strong> historicida<strong>de</strong> se po<strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r as formas segundo as quais<br />

<strong>uma</strong> socieda<strong>de</strong> experimenta o tempo, incluindo as narrativas produzidas sobre o seu passado, bem<br />

como a maneira própria do social em <strong>de</strong>finir <strong>uma</strong> consciência <strong>de</strong> si. HARTOG, François. Tempo<br />

e patrimônio. varia Historia, Belo Horizonte, v. 22, n. 36, 2006. Disponível em: .<br />

Acesso em: 15 maio 2008.<br />

46 Id. Ibid.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!