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Pelas tramas de uma cidade migrante (Joinville, 1980-2010)

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épico e trágico, percebi que <strong>uma</strong> nuvem nostálgica baixou na plateia,<br />

provocando alg<strong>uma</strong>s precipitações nos olhares dos mais sensíveis. Em<br />

seguida, cenas do cotidiano. Telefonemas e cartas aos que ficaram.<br />

Experimentações <strong>de</strong> novas comidas. Conversas com vizinhanças.<br />

Entre risos discretos e indiscretos da plateia, os atores passaram a<br />

rearranjar o cenário.<br />

Na continuida<strong>de</strong>, com <strong>uma</strong> câmera <strong>de</strong> ví<strong>de</strong>o projetaram uns aos<br />

outros n<strong>uma</strong> tela cenográfica. As falas (<strong>de</strong>poimentos) diziam respeito<br />

às rememorações sobre as conquistas, sobre como as diferenças<br />

culturais foram vivenciadas e apreendidas subjetivamente e sobre os<br />

encontros que acabaram por transformar <strong>migrante</strong>s em joinvilenses.<br />

Nesse momento, o espetáculo foi interrompido e a imprevisibilida<strong>de</strong><br />

pareceu-me pôr em risco a peça. Os atores <strong>de</strong>ixaram <strong>de</strong> lado o enredo,<br />

convidando os espectadores a rememorar suas próprias experiências<br />

migratórias e a fazer do palco o lugar para a representação da cida<strong>de</strong><br />

joinvilense <strong>de</strong> cada um.<br />

Ao contrário da timi<strong>de</strong>z que ajuda o espectador a manter <strong>uma</strong><br />

distância segura do espetáculo, novas narrativas e personagens foram<br />

pululando e pareciam se incorporar ao texto teatral. Entretanto sentime<br />

<strong>de</strong>sconfortável à medida que julgava que o risco dos atores se<br />

tornava cada vez maior diante da ansieda<strong>de</strong> que tomava conta <strong>de</strong><br />

gran<strong>de</strong> parte da plateia. Vários <strong>de</strong>poimentos foram dados em meio<br />

a <strong>uma</strong> frenética angústia coletiva em falar. As pessoas pareciam<br />

se reconhecer nos sotaques e nas situações teatralizadas, mas, ao<br />

mesmo tempo, reclamavam que muitas singularida<strong>de</strong>s tinham ficado<br />

<strong>de</strong> fora.<br />

Após alguns longos minutos, acalmei-me. Um ator encerrou<br />

as inscrições e retomou o espetáculo agra<strong>de</strong>cendo à plateia as<br />

histórias rememoradas. Anunciou que era o momento <strong>de</strong> ver como<br />

terminariam as histórias que eles próprios contavam. Voltaram ao<br />

tablado e encenaram o <strong>de</strong>sfecho <strong>de</strong>las. No final, cada um se <strong>de</strong>spiu<br />

das personagens e passou a se apresentar ao público como quem se<br />

apresenta a um <strong>de</strong>sconhecido <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> com ele ter, inusitadamente,<br />

trocado impressões sobre um ou outro assunto na efemerida<strong>de</strong> dos<br />

encontros cotidianos.<br />

Muitas pessoas permaneceram no galpão e foram conversar<br />

com os artistas, tatear objetos cenográficos e emitir pareceres sobre

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