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Pelas tramas de uma cidade migrante (Joinville, 1980-2010)

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ven<strong>de</strong>r seus quitutes num carrinho na calçada em frente, pois “acarajé é<br />

comida <strong>de</strong> rua e se come <strong>de</strong> pé ou andando”. Quando chovia, estacionava<br />

seu carrinho na marquise do próprio mercado. Foi ficando lá. Os<br />

comerciantes passaram a achar “um bom negócio”, pois seus clientes,<br />

ao consumirem seus acarajés, movimentavam também o mercado.<br />

Por outro lado, consi<strong>de</strong>ra que o seu negócio também proporciona<br />

encontros entre os diferentes. Gaúchos, paulistas, cariocas, mineiros e “até<br />

joinvilenses e turistas do exterior” po<strong>de</strong>m lá conhecer os nor<strong>de</strong>stinos e<br />

um pouco do Nor<strong>de</strong>ste. Diz ele: “Aqui no acarajé é um ponto <strong>de</strong> encontro.<br />

Aqui tem que ser feita <strong>uma</strong> Associação dos Migrantes Nor<strong>de</strong>stinos. Creio<br />

que aqui é o alicerce, é a cara do nor<strong>de</strong>stino. Por quê? O Mercado! O<br />

Mercado Municipal, on<strong>de</strong> passam todos os tipos <strong>de</strong> gente”.<br />

Não se trataria <strong>de</strong> reivindicar o mercado aos nor<strong>de</strong>stinos, mas<br />

submetê-lo à sua lógica. Ao mesmo tempo em que explica que “o<br />

nor<strong>de</strong>stino quando olha um para o outro já conhece as diferenças...<br />

é por causa da cabeça... o modo <strong>de</strong> falar...”, hesita, mas afirma: “Eu<br />

gosto do pessoal daqui. Eu vejo o jeito <strong>de</strong>les... [mas] tem que ser mais<br />

movimentada... a cultura em <strong>Joinville</strong> tem que melhorar”. No seu ponto<br />

<strong>de</strong> vista, os nor<strong>de</strong>stinos sabem movimentar a cultura, especialmente no<br />

espaço <strong>de</strong> um mercado. Além da gastronomia, a melhoria do local po<strong>de</strong>ria<br />

englobar música e artesanato. Para tanto, o mercado, que já é frequentado<br />

por muitos nor<strong>de</strong>stinos, teria <strong>de</strong> ser reconhecido efetivamente como o<br />

“alicerce”, “a cara do nor<strong>de</strong>stino” em <strong>Joinville</strong>.<br />

Sua reivindicação, portanto, busca extrair da diferença novos<br />

sentidos fundadores capazes <strong>de</strong> instituir novas <strong>de</strong>marcações territoriais<br />

urbanas. Por várias vezes aludiu ao meu papel como “professora da<br />

universida<strong>de</strong>”. Apenas ao interpretar sua narrativa, percebi que o que<br />

estava em jogo para ele era propor novos vínculos entre cultura e espaço,<br />

pois, na sua visagem, a “realida<strong>de</strong>” do mercado já requeria a formalização<br />

do novo território <strong>de</strong> nor<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong>. Talvez a ciência e a universida<strong>de</strong><br />

lhe acorressem fazendo repercutir politicamente a pertinência <strong>de</strong> sua<br />

reivindicação.<br />

Ao contrário do centro cultural do Sr. Cardoso, a associação do<br />

Sr. Vicente não estaria voltada à prestação <strong>de</strong> auxílio aos nor<strong>de</strong>stinos que<br />

chegam à cida<strong>de</strong>, pois isso po<strong>de</strong>ria se tornar um incentivo para aumentar a<br />

migração. O seu <strong>de</strong>sejo consistiria apenas em resolver a “situação cultural”<br />

dos nor<strong>de</strong>stinos que já estão na cida<strong>de</strong> e que, segundo pensa, praticam os<br />

mesmos trajetos, ocupam lugares semelhantes e convivem com os mesmos<br />

estranhamentos que os seus. O território nor<strong>de</strong>stino não seria apenas para

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