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Pelas tramas de uma cidade migrante (Joinville, 1980-2010)

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Nessa perspectiva, as lições do historiador Michel <strong>de</strong> Certeau foram<br />

enriquecedoras. Na operação historiográfica voltada à investigação das<br />

<strong>tramas</strong> do cotidiano, seria mister ao historiador “reapren<strong>de</strong>r operações<br />

comuns e fazer da análise <strong>uma</strong> variante do seu objeto”. Assim, ele sugere<br />

que mais do que intenções é necessário “apresentar a paisagem <strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

pesquisa e, por esta composição <strong>de</strong> lugar, indicar os pontos <strong>de</strong> referência<br />

entre os quais se <strong>de</strong>senrola <strong>uma</strong> ação” 16 .<br />

Portanto, a “paisagem” da minha pesquisa engloba a busca e a<br />

indicação <strong>de</strong> alguns pontos <strong>de</strong> referência para explicar <strong>Joinville</strong> como<br />

lugar praticado pelos joinvilenses, <strong>migrante</strong>s ou não. Para tanto, lida<br />

com as maneiras <strong>de</strong> fazer dos sujeitos no processo <strong>de</strong> apropriação<br />

do território urbano, buscando compreen<strong>de</strong>r como operaram i<strong>de</strong>ias e<br />

princípios i<strong>de</strong>ntitários, empregaram objetos ao promover festivida<strong>de</strong>s,<br />

estetizaram etnicida<strong>de</strong>s, (re)interpretaram pertenças, produziram<br />

memórias sobre seus <strong>de</strong>slocamentos, espetacularizaram enredos sobre o<br />

passado, mercantilizaram cultura, inventaram clichês, criaram hierarquias,<br />

incluindo as simbólicas, e produziram discursos historiográficos sobre o<br />

passado e o presente.<br />

Até pelo menos a meta<strong>de</strong> da década <strong>de</strong> 1990, sob o impulso dos<br />

fluxos contemporâneos – especialmente os migratórios – e na polifonia 17<br />

da cida<strong>de</strong>, havia vozes um pouco <strong>de</strong>safinadas, mas bastante estri<strong>de</strong>ntes<br />

que buscavam aclamar e i<strong>de</strong>ntificar <strong>Joinville</strong> como cida<strong>de</strong> alemã. A<br />

intencionalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tal aclamação contrastava com o olhar estatísticopopulacional<br />

dos órgãos <strong>de</strong> pesquisa.<br />

Ocorre que, a partir dos anos <strong>1980</strong>, <strong>Joinville</strong> passou a se <strong>de</strong>stacar no<br />

cenário catarinense, entre outros aspectos, como a cida<strong>de</strong> mais populosa,<br />

em função da vinda e do estabelecimento <strong>de</strong> <strong>migrante</strong>s oriundos <strong>de</strong> várias<br />

regiões brasileiras. Até que ponto a estridência do brado etnicizado<br />

ressoava pelas ruas, moradias, fábricas e <strong>de</strong>mais espaços <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong><br />

urbana? A interrogação abriu a possibilida<strong>de</strong> para estudar as formas e<br />

os motivos para representar “<strong>Joinville</strong> como cida<strong>de</strong> alemã”, buscando<br />

não apenas o trabalho <strong>de</strong>ssa representação, mas os processos com os<br />

quais se construíam seus sentidos diante dos outros, os diferentes, aqueles<br />

aparentemente ininteligíveis, supostamente obscuros e indiferenciáveis:<br />

os <strong>migrante</strong>s.<br />

16 CERTEAU, Michel <strong>de</strong>. a invenção do cotidiano: artes <strong>de</strong> fazer. 10. ed. Tradução <strong>de</strong> Ephraim<br />

Ferreira Alves. Petrópolis: Vozes, 1994. p. 35.<br />

17 Termo do antropólogo Massimo Canevacci. Para ele, a cida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser comparada “a um<br />

coro que canta com <strong>uma</strong> multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vozes autônomas que se cruzam, relacionam-se,<br />

sobrepõem-se <strong>uma</strong>s às outras, isolam-se ou se contrastam. CANEVACCI, Massimo. a cida<strong>de</strong><br />

polifônica. 2. ed. São Paulo: Livros Studio Nobel, 1993. p. 17.

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