08.05.2013 Views

Pelas tramas de uma cidade migrante (Joinville, 1980-2010)

Pelas tramas de uma cidade migrante (Joinville, 1980-2010)

Pelas tramas de uma cidade migrante (Joinville, 1980-2010)

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

267<br />

acontecimentos), com as quais indiciam elementos para forjar novas<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s, assim como para fazer emergir “outras histórias”, o caminho<br />

certamente não po<strong>de</strong> culminar n<strong>uma</strong> espécie <strong>de</strong> lançar fora a água do<br />

banho com aquele que se banha. Desse modo, embora as narrativas <strong>de</strong><br />

memória se façam sob a primazia da primeira pessoa, elas permitem<br />

a<strong>de</strong>ntrar nos meandros do individual para apreen<strong>de</strong>r, problematizando,<br />

não o indivíduo em sua generalida<strong>de</strong>, mas o específico como traço<br />

significativo <strong>de</strong> sua generalida<strong>de</strong>.<br />

É preciso esclarecer melhor essa questão situando-a num<br />

exemplo. Com o objetivo <strong>de</strong> fissurar as representações generalizantes<br />

sobre os <strong>migrante</strong>s <strong>de</strong> <strong>Joinville</strong>, entrevistei vários <strong>de</strong>les que provinham<br />

<strong>de</strong> diferentes regiões e cida<strong>de</strong>s brasileiras. O Sr. Luiz Vicente é<br />

pernambucano nascido em Timbaúba (zona da mata do estado do<br />

Pernambuco). Chegou a <strong>Joinville</strong> em 1994 <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> ter passado por<br />

São Paulo e Rio <strong>de</strong> Janeiro. Nesse percurso, apren<strong>de</strong>u a cozinhar e em<br />

<strong>Joinville</strong> abriu o “Ponto <strong>de</strong> Acarajé” nas imediações do Mercado Público<br />

Municipal. Sua narrativa é dotada <strong>de</strong> <strong>uma</strong> coerência autobiográfica<br />

surpreen<strong>de</strong>nte que permitiria facilmente consi<strong>de</strong>rá-lo como um ícone<br />

da odisseia nor<strong>de</strong>stina para <strong>Joinville</strong> ou mesmo um signo da diversida<strong>de</strong><br />

da população urbana, cuja ausência (ou <strong>de</strong>sprezo) po<strong>de</strong>ria ser agora<br />

reparada por um impulso moral emblematizado pela minha escrita<br />

histórica. Contudo não busco transformar as narrativas dos sujeitos<br />

em ilustração <strong>de</strong> <strong>uma</strong> diversida<strong>de</strong> <strong>migrante</strong>; se assim fosse, colocaria<br />

esta tese n<strong>uma</strong> cilada terrível, visto que até aqui, a cada linha, procuro<br />

me contrapor às práticas e representações que sustentam a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />

diversida<strong>de</strong> cultural joinvilense, na qual se mobilizam a migração e os<br />

<strong>migrante</strong>s como argumento seguro.<br />

Importa-me discutir o que <strong>de</strong> específico po<strong>de</strong> ser perscrutado na<br />

narrativa construída pelo próprio sujeito Luiz Vicente, capaz <strong>de</strong> a um<br />

só tempo problematizar a representação generalista dos <strong>migrante</strong>s e os<br />

elementos que ele astutamente mobiliza para enca<strong>de</strong>ar suas próprias<br />

experiências e sensibilida<strong>de</strong>s como referência para o reconhecimento<br />

histórico <strong>de</strong> <strong>uma</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> nor<strong>de</strong>stina <strong>de</strong> <strong>Joinville</strong>. Disse ele: “Aqui no<br />

Acarajé é um ponto <strong>de</strong> encontro. Aqui tem que ser feita <strong>uma</strong> associação<br />

dos <strong>migrante</strong>s nor<strong>de</strong>stinos. Creio que aqui é o alicerce, é a cara do<br />

nor<strong>de</strong>stino” 41 . Há que se consi<strong>de</strong>rar nessa proposição, além <strong>de</strong> seus<br />

óbvios interesses comerciais e o seu explícito <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> encarnar <strong>uma</strong><br />

41 VICENTE, Luiz. Depoimento. entrevista concedida a Fernanda ozório da Conceição,<br />

Fernando Cesar sossai e ilanil Coelho. <strong>Joinville</strong>, 10 <strong>de</strong>z. 2009.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!