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Pelas tramas de uma cidade migrante (Joinville, 1980-2010)

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No entanto situações como aquela que relatei anteriormente<br />

expõem <strong>uma</strong> dificulda<strong>de</strong> bastante específica no processo <strong>de</strong> construção<br />

do discurso histórico <strong>de</strong>sdobrado. Tal dificulda<strong>de</strong> diz respeito ao que<br />

Portelli <strong>de</strong>nomina “ética da restituição”. Diz ele que restituir implica<br />

indagar sobre as finalida<strong>de</strong>s da história oral. Ao lidar com pessoas,<br />

sua relevância não estaria apenas na disponibilização <strong>de</strong> gravações,<br />

transcrições e publicações, mas principalmente em favorecer “<strong>uma</strong><br />

oportunida<strong>de</strong> para as pessoas com que conversamos organizarem<br />

seus conhecimentos” e produzirem discursos sobre si mesmas e sobre<br />

os outros, mesmo que tais discursos sejam encarados experimentos<br />

passíveis <strong>de</strong> interdição. Lembra que “a restituição não é neutra” 27 , tendo<br />

em vista que ela enseja <strong>uma</strong> intervenção social efetiva, proporcionando<br />

<strong>uma</strong> gama <strong>de</strong> interpretações capazes <strong>de</strong> mudar as concepções <strong>de</strong> e sobre<br />

pessoas, acontecimentos e lugares. Eis a principal lição que tirei sobre<br />

a importância da restituição das narrativas não apenas para aqueles<br />

que se dispuseram a expô-las e autorizaram integralmente o seu uso,<br />

mas também àqueles cujas interdições exprimiram igualmente o valor<br />

do encontro como possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> intervir no discurso historiográfico<br />

e interromper o isolamento <strong>de</strong> suas percepções.<br />

Nesse ponto, é preciso esclarecer ainda <strong>de</strong> que modo as narrativas<br />

<strong>de</strong> memória po<strong>de</strong>m ser consi<strong>de</strong>radas como instâncias que põem em<br />

relação sujeitos e sentidos afetados pela língua e pela história 28 . Portelli<br />

diz que n<strong>uma</strong> entrevista há significados e procedimentos narrativos<br />

que vão além do individual. De um lado, o ato interpretativo “parte <strong>de</strong><br />

comportamentos visíveis, códigos expressivos socialmente reconhecidos”,<br />

permitindo ao narrador formular hipóteses sobre o que narra. Por<br />

outro lado, a interpretação que produz “constitui um ato fundamental<br />

na construção da narrativa em si”. Por isso, a oralida<strong>de</strong> manifesta o<br />

“fatigante trabalho da palavra” 29 , que pelas interrupções, digressões,<br />

repetições e correções explicita o caráter processual, construtivista e<br />

social da narrativa e da memória.<br />

Situar aí as narrativas <strong>de</strong> memórias dos <strong>migrante</strong>s <strong>de</strong> <strong>Joinville</strong><br />

significa explicitar, inicialmente, a minha intenção <strong>de</strong> buscar nelas novas<br />

possibilida<strong>de</strong>s para compreen<strong>de</strong>r os enredos sobre a cida<strong>de</strong> que dizem<br />

respeito tanto às subjetivida<strong>de</strong>s dos narradores quanto àquelas que eles<br />

27 PORTELLI, Alessandro, 1997. Op. cit. p. 31.<br />

28 Conforme discutido no Capítulo II.<br />

29 PORTELLI, Alessandro, 1996. Op. cit. p. 65.

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