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Pelas tramas de uma cidade migrante (Joinville, 1980-2010)

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Semanas mais tar<strong>de</strong>, um fatídico telefonema interditou completamente<br />

a narrativa, sob a promessa <strong>de</strong> produzir outra, menos contun<strong>de</strong>nte e em<br />

tom menos altivo em relação aos juízos sobre <strong>Joinville</strong>, seus habitantes<br />

e suas re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong>. Não a refiz, explicitando novamente o que<br />

havíamos firmado no início do processo. Ocorre que, posteriormente, o<br />

meu interlocutor criara outras expectativas para o seu relato. Esperava<br />

que seus familiares e <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes não soubessem dos seus reais<br />

sentimentos sobre a cida<strong>de</strong>. Ao contrário, queria entrar na história<br />

exprimindo avaliações mais positivas e afetuosas. Para tanto, contava<br />

com a minha compreensão.<br />

O fato somou-se a outros tantos que exigiram, no processo<br />

da investigação, contínuas reflexões, negociações com entrevistados,<br />

diálogos com outros pesquisadores e revisitações aos estudos 19<br />

empreendidos que propuseram possíveis respostas aos <strong>de</strong>safios teóricometodológicos<br />

que envolvem o fazer história oral. O caso relatado,<br />

especialmente, ilustra as inúmeras questões que se avizinharam sobre<br />

a “ética na história oral” 20 e a “crítica do testemunho” 21 .<br />

Sob o crivo da reflexivida<strong>de</strong> interdisciplinar, as subjetivida<strong>de</strong>s<br />

que inundam as narrativas <strong>de</strong> memória, inicialmente concebidas como<br />

problemas, passaram a realçar a importância da história oral para obter<br />

outras visões e versões acerca dos acontecimentos, para conhecer o<br />

<strong>de</strong>sconhecido, fissurar as generalizações e para aprofundar a parcialida<strong>de</strong><br />

que igualmente inunda outras fontes <strong>de</strong> pesquisa histórica 22 .<br />

Para Portelli, a subjetivida<strong>de</strong> consiste no “trabalho através do qual<br />

as pessoas constroem e atribuem o significado à própria experiência”.<br />

O paradoxo da história oral seria que, diante do entrevistador, nenh<strong>uma</strong><br />

pessoa “aceita reduzir sua própria vida a um conjunto <strong>de</strong> fatos que<br />

19 Destaco aqui a importância <strong>de</strong> duas disciplinas cursadas no <strong>de</strong>correr do doutorado. Além <strong>de</strong><br />

constituírem oportunida<strong>de</strong>s singulares para que eu apren<strong>de</strong>sse, compartilhando com colegas e<br />

professores, pois o que eu pensava conhecer sobre a história oral era bem menos do que ainda<br />

persigo conhecer, a vasta bibliografia proposta pelos professores foi retomada à medida que a<br />

minha experiência investigativa reabria problemas discutidos. As disciplinas a que me refiro<br />

são “Memória e i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> na perspectiva da etno-história”, sob responsabilida<strong>de</strong> da Profa.<br />

Dra. Ana Lúcia Vulfe Nötzold, e “História oral – instrumental e teórica”, sob responsabilida<strong>de</strong><br />

do Prof. Dr. Marcos Fábio Freire Montys<strong>uma</strong>.<br />

20 Cf: PORTELLI, Alessandro. Op. cit. p. 19.<br />

21 SARLO, Beatriz. tempo passado: cultura da memória e guinada subjetiva. São Paulo:<br />

Companhia das Letras; Belo Horizonte: UFMG, 2007. Cap. 2.<br />

22 A esse respeito ver PRINS, Gwyn. História oral. In: BURKE, Peter (Org.). a escrita na<br />

História: novas perspectivas. São Paulo: Editora da Universida<strong>de</strong> Estadual Paulista, 1992.<br />

p. 166.

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