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Pelas tramas de uma cidade migrante (Joinville, 1980-2010)

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<strong>de</strong>stacar que tal representação generaliza e, <strong>de</strong> certa maneira, <strong>de</strong>ixa<br />

<strong>de</strong> lado a multiplicida<strong>de</strong> e a complexida<strong>de</strong> do fenômeno migratório<br />

em <strong>Joinville</strong> a partir dos anos <strong>1980</strong> 204 .<br />

“Raízes partidas” 205 é <strong>uma</strong> expressão que retirei do último capítulo,<br />

<strong>de</strong>nominado “Vidas transplantadas”. Nele, a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> <strong>de</strong>senraizamento<br />

ganha vigor argumentativo. Niehues insinua que os sujeitos, como<br />

as plantas, possuem raízes sólidas e que ao serem arrancadas <strong>de</strong> um<br />

terreno po<strong>de</strong>riam ser cravadas em outro, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que pu<strong>de</strong>ssem retirar<br />

os nutrientes necessários para mantê-las vivas, tal como sempre foram.<br />

Penso que, metaforicamente, por raízes a autora concebe a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>,<br />

a migração, o processo <strong>de</strong> quebra e transplantação da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>, e a<br />

cida<strong>de</strong>, como terreno impróprio para sua (re)fertilização.<br />

Haveria aí marcações um tanto i<strong>de</strong>alizadas para fundamentar<br />

o conceito <strong>de</strong> perda da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> dos <strong>migrante</strong>s no mundo urbano<br />

(igualmente i<strong>de</strong>alizado), representado como solo das angústias, dos<br />

medos, da melancolia, da exclusão e do silêncio. Parece-me que a<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> para a autora é marca do sujeito, adquirida pelos padrões <strong>de</strong><br />

comportamento, valores e hábitos no meio rural. Soterrada pelas novas<br />

experiências, emerge a sensação <strong>de</strong> perda e <strong>de</strong>snaturação.<br />

A<strong>de</strong>mais, a cida<strong>de</strong> para Niehues é aquela esquadrinhada pela<br />

fábrica, pelo capital. Suas sociabilida<strong>de</strong>s são <strong>de</strong>terminadas pela lógica do<br />

espaço fabril. Não haveria fronteira entre fábrica e cida<strong>de</strong>, e os <strong>migrante</strong>s<br />

seriam vítimas <strong>de</strong> ambas. A ilusão simbólica das flores <strong>de</strong>veria, assim,<br />

ser quebrada tal como as raízes dos <strong>migrante</strong>s.<br />

Referindo-se a Bosi, <strong>de</strong>staca que, “ao per<strong>de</strong>r as referências, [o<br />

<strong>migrante</strong>] obriga-se a encontrar formas que lhe dêem o direito <strong>de</strong> pertencer<br />

a um grupo, para dar sentido à vida”. Contudo encontra inúmeras<br />

dificulda<strong>de</strong>s. Como operário, “é tomado pela fadiga porque é obrigado<br />

acompanhar o ritmo da produção”, o que o leva, “inevitavelmente,<br />

à alienação”. Nos finais <strong>de</strong> semana, “inconscientemente, continua<br />

exercendo ativida<strong>de</strong>s que requerem esforços físicos, repetitivos, às<br />

204 Em primeiro lugar, como já discuti no Capítulo I, <strong>migrante</strong>s oriundos <strong>de</strong> outros centros urbanos<br />

brasileiros, escolarizados e qualificados, não são vistos, pelo menos sob a ótica empresarial e<br />

<strong>de</strong> alguns segmentos políticos, como problema, haja vista as vantagens empregatícias que lhes<br />

são colocadas. Em segundo lugar, no processo <strong>de</strong> recomposição econômica da cida<strong>de</strong> nos anos<br />

<strong>1980</strong> e 1990 (a qual inclui a reestruturação industrial com vistas à inserção das empresas no<br />

mercado global, bem como a terceirização e o projeto para tornar <strong>Joinville</strong> polo <strong>de</strong> turismo<br />

<strong>de</strong> eventos e negócios), a representação da migração por meio <strong>de</strong> um jogo <strong>de</strong> vocábulos que<br />

se excluem parece-me alimentar e inspirar as caracterizações sobre quem são ou se tornam<br />

sujeitos problemas ou soluções para o presente e o futuro urbano.<br />

205 NIEHUES, Val<strong>de</strong>te Daufemback. Op. cit. p. 186.

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