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Pelas tramas de uma cidade migrante (Joinville, 1980-2010)

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112<br />

Quando nós chamamos as etnias, cada um fez<br />

o que quis. Nós não temos aqui um grupo <strong>de</strong><br />

intelectuais que avaliam se o puchero do açoriano<br />

é bem açoriano ou se ele é espanhol. Isso não<br />

importa. Nós não estávamos fazendo <strong>uma</strong> festa<br />

voltada para esta questão <strong>de</strong> avaliação. [...] Cada<br />

etnia cuidava da sua parte, da sua forma. Então<br />

os afros queriam ven<strong>de</strong>r o acarajé, problema <strong>de</strong>les,<br />

não é? [...] Cada etnia apresentava a comida que<br />

ela achava que era <strong>de</strong> sua etnia 211 .<br />

Por meio <strong>de</strong> tal liberalida<strong>de</strong>, penso que os hibridismos<br />

gastronômicos transitaram e pu<strong>de</strong>ram <strong>de</strong>slizar pela festa como vestígios<br />

<strong>de</strong> combinações, <strong>de</strong>slocamentos e traduções feitos ao sabor dos<br />

hibridismos culturais urbanos.<br />

O Sr. Wilmar informou-nos que “o baiano lá da esquina que<br />

faz acarajé” tornou-se um referencial na festa para que <strong>migrante</strong>s<br />

nor<strong>de</strong>stinos se i<strong>de</strong>ntificassem com a cida<strong>de</strong>. Em sua avaliação, “o cara<br />

que acha que não tem nada com nada” raciocinaria da seguinte forma:<br />

“Eu sou lá do nor<strong>de</strong>ste e estou aqui morando <strong>de</strong>z anos e nunca comi<br />

um acarajé aqui. Só como quando eu vou lá”. Porém a essa experiência<br />

<strong>de</strong>gustativa po<strong>de</strong>riam ser somadas outras que possibilitariam a esse<br />

mesmo <strong>migrante</strong> conhecer “o marreco com repolho roxo” 212 ou o hot<br />

dog com chucrute, consi<strong>de</strong>rado pelo entrevistado como o verda<strong>de</strong>iro<br />

cachorro-quente alemão.<br />

Para além da diversida<strong>de</strong> dos sabores, as combinações culinárias<br />

valorizadas e <strong>de</strong>stacadas pelo entrevistado me traziam outras questões<br />

que julgo importante analisar. O típico era digerido como fast-food. Tal<br />

expressão alimentar <strong>de</strong>monstrava na festa a tendência à padronização<br />

globalizada, sob a qual o que, como, on<strong>de</strong> e com quem se come<br />

sofriam alterações profundas. A chamada comida típica não advinha do<br />

preparo artesanal, mas era fruto <strong>de</strong> enca<strong>de</strong>amentos <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s industriais<br />

alimentares que pretendiam respon<strong>de</strong>r à velocida<strong>de</strong> do tempo disponível<br />

e aos recursos financeiros dos comensais. Assim, eram transpostos para<br />

a festa os modos <strong>de</strong> viver e comer da cida<strong>de</strong> contemporânea.<br />

Alg<strong>uma</strong>s mesas localizadas na frente das barracas estavam<br />

ocupadas, outras não. Um aglomerado <strong>de</strong> pessoas em pé lentamente<br />

se movia para frente. A razão disso é que na mesma área havia<br />

211 SOUZA, Wilmar <strong>de</strong>. Op. cit.<br />

212 Id. Ibid.

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