UMBANDA EM GOIÂNIA - Faculdade de História - UFG
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Portanto, na análise <strong>de</strong> Mário <strong>de</strong> Sá Júnior, Zélio possui todas as cre<strong>de</strong>nciais do<br />
mundo civilizado. Não era um qualquer, muito menos um negro. Em segundo lugar, a<br />
história contada pelos umbandistas submete o nascimento da Umbanda ao espiritismo<br />
kar<strong>de</strong>cista. Ou seja, a Umbanda não vem da macumba ou das práticas negras dos<br />
escravos africanos, mas sim é revelada no seio <strong>de</strong> um centro espírita, religião <strong>de</strong><br />
intelectuais das classes média e alta brasileiras. Apesar <strong>de</strong> apresentar elementos <strong>de</strong>sta<br />
macumba, como a presença <strong>de</strong> um Caboclo, espírito bastante encontrado não só nas<br />
macumbas cariocas como também nos Candomblés <strong>de</strong> uma forma geral como<br />
representante do nativo brasileiro, o fato <strong>de</strong> o fenômeno ocorrer no seio <strong>de</strong> um centro<br />
kar<strong>de</strong>cista é bastante emblemático <strong>de</strong> sua condição “superior”. Além disto, não se<br />
tratava <strong>de</strong> um Caboclo qualquer, mas em <strong>de</strong>terminado momento da narrativa, o Caboclo<br />
das Sete Encruzilhadas afirma já ter sido padre em outras vidas, o que atesta sua<br />
condição <strong>de</strong> “superiorida<strong>de</strong>” em relação a um índio qualquer.<br />
Outro fator relevante na análise <strong>de</strong>ste mito é a data em que ele ocorre. Quinze <strong>de</strong><br />
novembro é a data em que se comemora o advento oficial da República brasileira.<br />
O dia quinze <strong>de</strong> novembro tem, na história republicana brasileira, uma<br />
importância extremada. É nesse dia que ocorre a proclamação da república no<br />
Brasil. E, a cada ano, essa data é relembrada nas escolas, em cerimônias<br />
produzidas pelo governo e outros tipos <strong>de</strong> eventos. É por <strong>de</strong>mais significativo<br />
que o mito <strong>de</strong> fundação da alva nação umbandista tenha a mesma data. Isso<br />
coloca a fundação da Umbanda associada ao nascimento da república. Essa<br />
associação está contida em produções dos intelectuais umbandistas (SÁ<br />
JÚNIOR, 2004, p. 72).<br />
Percebemos, assim, que a narrativa do nascimento da Umbanda proposta pelos<br />
intelectuais umbandistas e assimilada pelos estudiosos que se <strong>de</strong>dicaram aos estudos<br />
<strong>de</strong>sta religião no Brasil serve ao propósito <strong>de</strong> legitimar a Umbanda perante uma<br />
socieda<strong>de</strong> que <strong>de</strong>sprezava a herança negro-africana do Brasil e suas práticas religiosas<br />
como representantes do atraso e da barbárie. Em contraposição valorizavam o mundo da<br />
“or<strong>de</strong>m”, racional e civilizado, valores impostos pelo mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong> européia<br />
transplantado para o Brasil pelos intelectuais representantes do evolucionismo sócio-<br />
cultural.<br />
Dentro <strong>de</strong>sta narrativa fica até contraditório a presença do negro e do índio em<br />
seus códigos rituais. Como afirma o mito, a Umbanda surge revelada <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um<br />
centro kar<strong>de</strong>cista, e hora nenhuma tal relato se refere às práticas da macumba, dos<br />
candomblés, dos calundus. Mesmo assim esta nova religião incorpora alguns elementos<br />
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