Ideias nº 20 - incaer

Dom Edson de Castro Homem
agostinismo, presentes na Reforma, se não da tradição viva da Igreja
anterior? Muito do patrimônio recebido, inclusive o nominalismo da
Filosofia medieval, foi transformado pala própria herança anglosaxônica,
também recebida e atualizada. Também o Islamismo muito
recebeu do Judaísmo, do Cristianismo e das tribos árabes. Recebeu,
adaptou ou transformou.
Tais reflexões visam considerar a Religião não só como criadora
de Cultura, mas também transformadora de certos elementos culturais
encontrados, para recriá-los, desconstruí-los ou mesmo inibilos.
Isto pode se dar de forma pacífica. Trata-se do sincretismo ou da
justaposição. O primeiro supõe o lento discernimento da purificação
histórica no processo de inculturação e, ao contrário do que normalmente
se diz, pode respeitar e integrar se não todos, muitos valores
encontrados. A segunda, que é a justaposição, dispensa o
discernimento, ao agrupar tradições díspares independentemente da
coerência interna, especialmente a doutrinal.
A íntima relação entre Religião e Cultura só seria compreendida
e melhor valorizada, devido à descoberta moderna da historicidade,
tema ligado à concepção da Filosofia da História, a partir de Hegel.
Com o método histórico-crítico aplicado à exegese e à hermenêutica
dos textos bíblicos e dos dogmas, percebeu-se melhor o problema da
historicidade, cuja solução supera o dogmatismo católico e o
fundamentalismo protestante. Contra ambos, possibilita a releitura ou
a re-interpretação, em função da mensagem contra o invólucro cultural
já superado. Trata-se de nova aplicação do sentido da exortação
de Paulo: “a letra mata, o Espírito é que vivifica”. Não sem conflito
com o Magistério católico que condenou o Modernismo, tais tentativas
foram feitas e muitas são legítimas para a compreensão da fé
que a Religião veicula. Aqui se trata de distinguir o que é vinculativo
do que é elemento cultural ou da mentalidade de época.
III. A Religião a Desvelar Conflito
O encontro de culturas pode ser um confronto de religiões, de
forma violenta e sangrenta. Trata-se da rejeição que condena, persegue
e elimina o diferente ou oponente. Todas as perseguições contra
as crenças alheias, as cruzadas, as inquisições e as guerras religiosas,
incluindo a guerra santa dos muçulmanos, são formas de conflito
em que a Religião foi utilizada como instrumento ideológico repressor
24 Id. em Dest., Rio de Janeiro, (20) : 19-36, jan./abr. 2006