Número 11 (jan-jun/09) - Dialogarts - Uerj
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prática, contém tensões internas. (RORTY: 1991b, p.16) Os pragmáticos querem substituir a idéia de “objetividade” pela de “concordância não-forçada”. Esta última refere-se a “nós”, um “nós” etnocêntrico. Para Rorty, nós sempre podemos ampliar os “nossos” escopos observando outras pessoas ou culturas como membros ou representantes, tanto quanto nós mesmos, de alguma comunidade de investigação — tratando-os enquanto partes de um grupo, no interior do qual a concordância não-forçada deve ser buscada. O que não podemos fazer é nos lançar para além de todas as comunidades humanas numa incursão a-histórica e finita, não contingente, não etnocêntrica. Essa passagem diz respeito justamente a porção de filiação à tradição, costumes e valores que sempre nos interpela. Negar essa porção é negar os próprios limites. A democracia, nesse contexto, se inscreve como elemento que permite esse encontro sempre precipitado, que possibilita a “conversação” e o “acordo”. A “conversação” e o “acordo” como possibilidades viabilizadas pela democracia não acontece certamente sem as devidas tensões; disso o próprio Rorty está advertido. O pragmatismo não se vê iludido frente aos limites (da Linguagem, do Homem, da vida, etc.). Poderíamos até arriscar que — utilizando o jargão psicanalítico — o pragmatismo está advertido da sua castração, mas nem por isso desiste da causa que toma como sua. A valorização e prioridade rortyana das práticas democráticas e liberais sobre qualquer outra e do confronto livre e aberto para negociações é profundamente atacado por alguns dos seus críticos. De certo modo, Rorty é considerado, às vezes, apenas mais um democrata liberal americano, ou um relativista pretensioso7 . De qualquer maneira, suas posições políticas, práticas, discursivas são afinadas com posições deweyanas de igual dimensão onde a contingência, historicidade, ironia pública, solidariedade assumem um caráter norteador frente a ou- 7. O apelo rortyano à democracia parece muitas vezes pouco razoável, por exemplo, na ótica desconstrucionista derridiana, onde a democracia está sempre “por chegar”, atravessada pela indecidibilidade e mantendo para sempre aberto seu elemento de promessa (RORTY, DERRIDA et al: 1998). Caderno Seminal Digital, Ano 15, Nº 11, V 11, ( Jan / Jun 2009) - ISSN 1806-9142 132
tras práticas justificando, quando possível, cada escolha. O traço mar- cadamente etnocêntrico o faz falar a partir do lugar que lhe parece mais justo, mais próximo da possibilidade do exercício dessas práticas que tanto acalenta (solidariedade, tolerância, democracia). Certamente, seu pragmatismo não oferece nenhuma garantia, nenhuma saída fácil frente às dificuldades mais urgentes como a fome, a miséria, os regimes autoritários e perversos, a loucura, a morte, etc. Seu pragmatismo é uma aposta na esperança social, sem qualquer fundamentação objetiva ou ahistórica. Para ele, é possível apostar em tais práticas por uma condição de solidariedade não fundamentada em qualquer proposição científica, objetivamente válida ou qualquer versão humanista-cristã dos seres humanos8 (RORTY: 1991b, p.59). Da perspectiva de um discurso que acolha o pensamento de Wittgenstein, Dewey e Donald Davidson, não é possível se falar de uma teoria ou de uma descrição que seja, por si só, a “melhor explicação” do mundo. Como podemos encontrar nestes autores citados, mas também em William James, uma explicação sobre a natureza das coisas é o que é conveniente e útil aos nossos interesses e responde às nossas crenças (JA- MES, 1995). Uma explicação (científica, religiosa ou cotidiana) sempre será uma descrição que, obrigatoriamente, deverá conviver com inúmeras outras descrições alternativas. Como afirma Hilary Putnam (1992, p. 45), não podemos falar do ponto de vista do olho de Deus; não há qualquer descrição que seja “mais próxima” do mundo (RORTY: 1991b, p.60). Deste modo não temos, conclui Rorty, uma linguagem que sirva como base neutra permanente para formular todas as boas hipóteses explicativas ou a melhor chave interpretativa. Uma linguagem para observar o mundo diretamente, mas que seja neutra em relação às nossas perspectivas e interesses, é simplesmente inútil. Assim, segue ele, é improvável que a epistemologia – como tentativa para tornar todos os 8. Um exemplo dessa versão humanista-cristã lançado por Rorty é a Declaração de Helsinki, onde podemos verificar o caráter fundacionista, essencialista dos direitos humanos ali expostos (RORTY, 1995). Caderno Seminal Digital, Ano 15, Nº 11, V 11, ( Jan / Jun 2009) - ISSN 1806-9142 133
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Da perspectiva de um discurso que acolha o pensamento de Wittgenstein,<br />
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mundo. Como podemos encontrar nestes autores citados, mas também<br />
em William James, uma explicação sobre a natureza das coisas é o que é<br />
conveniente e útil aos nossos interesses e responde às nossas crenças (JA-<br />
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será uma descrição que, obrigatoriamente, deverá conviver com inúmeras<br />
outras descrições alternativas. Como afirma Hilary Putnam (1992, p. 45),<br />
não podemos falar do ponto de vista do olho de Deus; não há qualquer<br />
descrição que seja “mais próxima” do mundo (RORTY: 1991b, p.60).<br />
Deste modo não temos, conclui Rorty, uma linguagem que sirva<br />
como base neutra permanente para formular todas as boas hipóteses<br />
explicativas ou a melhor chave interpretativa. Uma linguagem para<br />
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é improvável que a epistemologia – como tentativa para tornar todos os<br />
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essencialista dos direitos humanos ali expostos (RORTY, 1995).<br />
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