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68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

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angolana, numa das madrugadas seguintes, argumentando <strong>que</strong> tinha “imunidade<br />

diplomática”. Cedeu ante a ameaça de ter a casa invadida à força e acabou sumariamente<br />

expulso.<br />

O golpe fracassou. Jovem combatente destacado na frente Norte e na batalha de Luanda,<br />

Nito Alves, <strong>que</strong> entusiasmou uma corrente do MPLA e os soviéticos com sua retórica<br />

ambaquista (falava em “morrer do ponto de vista vermelho”), foi fuzilado, como muitos<br />

dos seus partidários ou simplesmente suspeitos de conluio ou conivência com a<br />

sublevação. Um deles era o comandante Monstro Imortal, um nome de guerra <strong>que</strong> pode<br />

ter-se justificado na guerrilha anticolonial, mas falhou na luta interna.<br />

Mas houve um codinome <strong>que</strong> se justificou: Gato. Gato sobreviveu ao massacre de vários<br />

militantes do MPLA netistas, no inicio do golpe. Foi abandonado como morto debaixo de<br />

uma pilha de cadáveres.<br />

Foi o quarto e último golpe, neste caso apenas uma tentativa, a mudar radicalmente<br />

minha vida, assim como a da Lia, sua mãe Angelina e mais alguns exilados brasileiros <strong>que</strong><br />

viveram algum tempo em Angola, tentando ajudar a construção do novo país, na ilusão<br />

de participar de uma revolução. Golpes de Estado determinaram o destino de muita<br />

gente da minha geração, mas poucos viveram essa sequência: Brasil, Chile, Portugal e<br />

Angola.<br />

A maioria ainda não era militante em 1964. Era o meu caso, na época alheio às <strong>que</strong>stões<br />

políticas, um “alienado” como se dizia, embora calouro universitário. Mas o golpe militar<br />

foi decisivo na militância radical, armada em muitos casos, e no conse<strong>que</strong>nte exílio de<br />

todos. Alguns desse grupo em Angola haviam sobrevivido às torturas no Brasil e ao golpe<br />

militar chileno <strong>que</strong> condenou milhares de brasileiros e outros latino-americanos a um<br />

segundo exílio.<br />

O terceiro golpe a determinar o rumo das nossas vidas foi benigno. O 25 de abril de 1974<br />

nos tirou do gelo para viver as alegrias da democracia em Portugal. A Lia ficou ouriçada<br />

desde <strong>que</strong> recebemos, na Bélgica, a primeira noticia sobre os Capitães de Abril, através de<br />

uma radio em flamengo (o holandês falado numa parte da Bélgica), durante uma<br />

excursão a Bruges, uma jóia medieval do país. Assumiu a vanguarda e se mandou para<br />

Portugal cinco meses depois, junto com três companheiros da antiga VPR (Vanguarda<br />

Popular Revolucionária), dois deles recém retirados do Brasil, os últimos moicanos. Seu<br />

entusiasmo por Portugal democratizado só fazia crescer com a perspectiva de um novo<br />

inverno belga, num país de sol oculto quase todo o ano, onde os brasileiros mais<br />

<strong>68</strong> a geraçao <strong>que</strong> <strong>que</strong>ria mudar o mundo: <strong>relatos</strong> relaToS - aNGola 659

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