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68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

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“Veja ilustre passageiro o belo tipo faceiro <strong>que</strong> o senhor tem a seu lado. No entanto<br />

acredite, quase morreu de bronquite. Salvou-o o Rhum Creosotado”. Mas me faltara<br />

tempo para elaborar, <strong>que</strong>stionar, avaliar, repensar. Depressão. Salvou-me, não o Rhum<br />

Creosotado dos velhos bondes, mas a Doutora Esmeralda, ou Esperança, o <strong>que</strong> dá no<br />

mesmo. Médica espanhola, falante, compreensiva, ela receitava-me uns comprimidos cor<br />

de vinho <strong>que</strong> faziam dormir até, às vezes, mais de doze horas seguidas. Maravilha.<br />

“Não permita Deus <strong>que</strong> eu morra, sem <strong>que</strong> eu volte para lá”.<br />

1975 e 76. Nessas alturas minha relação com o Luiz Carlos, sempre instável sujeita a<br />

chuvas, trovoadas, raios, ventos de todos os quadrantes, <strong>que</strong>das de barreiras e avalanches,<br />

mantinha-se como uma sanfona desgastada. Vai e volta. Vai e volta. Vai e volta. Volta e<br />

vai. Vai.<br />

Como não consegui renovação do meu passaporte em Portugal, voltei para Estocolmo<br />

com documento de viagem sueco. O fato de não ter passaporte brasileiro me deixava<br />

solta no espaço, sem lenço e sem documento, sentia-me uma intrusa. A possibilidade de<br />

perder a nacionalidade/cidadania brasileira, para mim, era “pirante”. Fiz de um tudo para<br />

conseguir o verdinho. Só pensava naquilo. Xô!<br />

Quando voltamos de Portugal, no fim do verão de 75, saí, fui à luta, mudei-me, com o<br />

auxílio da Assistência Social, para o Fyrtalet, residência estudantil basicamente de<br />

solteiros. Vida nova! Nova? Solteira. Pela enésima vez, separei-me do Luiz Carlos.<br />

Embora meu quarto fosse cheio de objetos da terrinha, cartazes, um mapa do Brasil<br />

enorme, <strong>que</strong> cobria meia parede, criei uma relação de amor e ódio ao país. As tais uvas<br />

verdes, no caso, verde-amarelas... Eu era metida a cartomante. Tinha um baralho especial<br />

somente para esse fim. Será <strong>que</strong> eu ainda iria voltar ao Brasil? Punha cartas todos os dias<br />

para saber se um dia voltaria à pártia <strong>que</strong>rida envolvida pelo inimigo. Quando a resposta<br />

era não, eu chorava muito. Que merda!<br />

Vivia falando mal do Brasil, nação <strong>que</strong> expulsava seus melhores filhos, <strong>que</strong> vivia sob uma<br />

terrível e assassina ditadura... Entretanto não aguentava de saudades, embora tivesse mil<br />

e uma atividades em Estocolmo. Trabalhava como professora de Português com crianças<br />

e adultos, fazia traduções, dançava em um grupo folclórico de portugueses, cantava nas<br />

festas dos exilados. Estudei inglês, trabalhei nos correios como carteira... Era, como eu<br />

<strong>68</strong> a geraçao <strong>que</strong> <strong>que</strong>ria mudar o mundo: <strong>relatos</strong> relaToS - SUÉCia 647

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