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68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

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Sabedores das minhas dificuldades, Marianne e Erik Ahlman perguntaram-me se eu<br />

<strong>que</strong>ria ir para a Suécia. Lá, segundo eles, poderia criar minhas filhinhas em paz, trabalhar<br />

e viver sem ameaças. Semanas depois, soubemos, pelas autoridades uruguaias, <strong>que</strong> os<br />

refugiados brasileiros tinham <strong>que</strong> se apresentar uma vez por semana na Chefatura de<br />

Polícia, no Departamento de Inteligencia y Enlace, en calle Yi y San José (Na rua Yi<br />

esquina da rua San José) para confirmar sua presença no Uruguai. A ditadura brasileira<br />

tinha medo de infiltrações ou de visitas indesejadas no território nacional pelos PATRIOTAS<br />

(tenho <strong>que</strong> escrever com letra maiúscula) refugiados no Uruguai.<br />

Uma vez por semana tínhamos <strong>que</strong> nos apresentar em Yi y San José para assinar uma<br />

ata de presença. Aconteceu, então, <strong>que</strong> adoeci e, durante uma semana, não pude assinar<br />

a tal lista. Na semana seguinte, quando me apresentei, fui levado ao comissário Morán<br />

Char<strong>que</strong>ro (<strong>que</strong>, posteriormente, seria fuzilado pelos Tupamaros) e informado de <strong>que</strong>, se<br />

faltasse uma única vez mais à ata de presença, seria extraditado e entregue às<br />

“autoridades” brasileiras, para segundo ele, receber minha merecida punição por haver<br />

desertado da Marinha de Guerra.<br />

Depois do acontecido, fui aconselhado por vários companheiros a aceitar o oferecimento<br />

dos missionários suecos e partir para a<strong>que</strong>le país. Despedi-me do Caudilho, dos demais<br />

companheiros e do Almirante Aragão <strong>que</strong>, brincando, promoveu-me à Adido Naval na<br />

Suécia. Parti para o Velho Continente.<br />

Antes de deixar Montevidéu, onde havia vivido dois anos como refugiado político e onde<br />

havia nascido minha segunda filha, Zoyra-Lya, passei um dia inteiro viajando de ônibus<br />

por suas ruas e avenidas, descendo de vez em quando ao chegar em par<strong>que</strong>s e praças,<br />

num esforço para guardar na memória a linda e serena geografia da<strong>que</strong>la cidade <strong>que</strong> tão<br />

bem me havia recebido e onde, não fora o exílio, havia sido quase feliz.<br />

Não <strong>que</strong>ria deixar Montevidéu, sem despedir-me de João Goulart, meu presidente, a<br />

<strong>que</strong>m visitava periodicamente para vender livros da Editora Labor e da Pueblos Unidos.<br />

Era admirador da<strong>que</strong>le homem sereno e generoso e sabia de sua saudade profunda do<br />

Brasil. Recebeu-me como sempre, bonachão e simples e ao saber <strong>que</strong> se concretizava<br />

minha viagem para a Suécia recomendou-me algo nunca olvidado por mim: “Guilem!<br />

Vais me prometer <strong>que</strong> farás o possível para <strong>que</strong> tuas filhinhas não tro<strong>que</strong>m a bela praia<br />

do Cassino pela neve da Suécia”. Dois anos depois ao voltar do trabalho, em Hässleholm,<br />

quase chorei ao ver uma das minhas duas filhas brincando na neve…<br />

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