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68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

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um da Air France, para Paris. Comprei os bilhetes e embar<strong>que</strong>i para o aeroporto John<br />

Kennedy.<br />

Eu pensava <strong>que</strong> o pior já havia passado, mas o pior ainda estava por vir. Antes de<br />

prosseguir, uma correção. Eu venho relatando os fatos como se a dificuldade em voltar<br />

para a Europa fosse um problema só meu. Na verdade, afetava um grupo mais ou menos<br />

numeroso de participantes do evento, entre os quais, vários brasileiros. Não citarei nomes,<br />

por duas boas razões. A primeira é a minha falta de memória: simplesmente não lembro.<br />

A segunda é <strong>que</strong> as pessoas estão vivas e não <strong>que</strong>ro provocar melindres. Abro aqui um<br />

parêntese para dizer <strong>que</strong> essa história de poder citar mortos e não poder citar vivos me<br />

soa como uma perfeita covardia. Afinal os vivos têm sobre os mortos a vantagem de<br />

poder se defender. No caso, porém, não citarei vivos nem mortos. E digamos <strong>que</strong> é por<strong>que</strong><br />

me es<strong>que</strong>ci dos nomes.<br />

Voava rumo a Nova Ior<strong>que</strong> com a atenção dividida entre o futuro imediato <strong>que</strong> me<br />

esperava em Paris e o passado recente, <strong>que</strong> eu deixara ficar definitivamente para trás,<br />

mas ainda se insinuava fresco na memória. Passara a última noite com a costarri<strong>que</strong>nse<br />

e fora uma despedida ines<strong>que</strong>cível. Ela me pedira <strong>que</strong> eu deixasse um pouco de mim com<br />

ela. Eu a penetrei, vagarosamente, e emiti golfadas de emoção. Depois, parti sem olhar<br />

para trás. Trazia opresso no espírito a certeza de <strong>que</strong> na Costa Rica ficara uma gota do<br />

meu ser. Dessa gota, eu jamais teria notícias.<br />

Havia um pe<strong>que</strong>no detalhe: eu não tinha visto de entrada para os Estados Unidos.<br />

Todavia, o vendedor da American Airlines me certificara de <strong>que</strong> não era necessário, pois<br />

eu estaria em trânsito no aeroporto John Kennedy por apenas algumas horas ou, mesmo,<br />

menos de uma hora.<br />

Quando desembar<strong>que</strong>i em Nova Ior<strong>que</strong>, ainda enlevado com as lembranças do pedaço de<br />

mim <strong>que</strong> ficara para trás, mostrei na aduana o passaporte e a passagem para o voo da Air<br />

France <strong>que</strong> partiria em seguida para Paris. O funcionário americano olhou para mim e<br />

exclamou:<br />

- Terrorista!<br />

Desentendido, olhei pros lados buscando saber de <strong>que</strong>m ele estava falando. Logo me dei<br />

conta <strong>que</strong> era de mim.<br />

<strong>68</strong> a geraçao <strong>que</strong> <strong>que</strong>ria mudar o mundo: <strong>relatos</strong> relaToS - FraNça 623

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