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68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

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deuses. No entanto, a indagação permanecia: <strong>que</strong>m enviara o convite? Seria alguma<br />

listagem internacional?<br />

Quando cheguei, tentei ser discreta, como prometera. Mas desconhecia os costumes<br />

árabes e, já na entrada, a minha presença foi anunciada em alto-falante e diante de<br />

câmeras de televisão:<br />

- A senhora de Bonet!<br />

Quase morri, mas ainda tive <strong>que</strong> enfrentar uma fila de árabes a me cumprimentar. Lá se<br />

havia ido a discrição.<br />

Não conhecia ninguém e fi<strong>que</strong>i rodando <strong>que</strong> nem peru até <strong>que</strong>, lá pelas tantas, avistei<br />

um grande amigo meu, jornalista do The Observer, <strong>que</strong> cobria o norte da África. Fazia<br />

sentido ele estar ali, portanto. Mas e eu? O mistério continuava.<br />

Tony me contou <strong>que</strong> fora convidado da mesma forma. Não conhecia ninguém, sua<br />

mulher também não fora convidada e ficara com ciúmes, não havia nenhuma indicação<br />

de <strong>que</strong>m partira a lembrança do seu nome. Será <strong>que</strong> fazíamos parte de alguma trama<br />

internacional?<br />

Lá pelas tantas, resolvemos relaxar e decidimos nos envolver com as festividades. A<br />

alegria era tanta <strong>que</strong> suplantava os discursos, invariavelmente chatos, como todos os<br />

discursos. Os líbios eram encantadores e o <strong>que</strong> vimos ali foi tanta simplicidade <strong>que</strong><br />

realmente não se coadunava com a imagem terrorista <strong>que</strong> o ocidente tentava desenhar.<br />

Se havia problemas internos, não sei. Não dava para perceber desta forma. Qadhafi podia<br />

até ser “ditador”, mas o <strong>que</strong> estava em jogo ali era uma ordem internacional. Ele tentava<br />

se afirmar em contraposição à dominância da sociedade ocidental e ao declínio do<br />

império soviético e eu estava feliz de ter tido a oportunidade de participar dos seus<br />

primórdios. Fosse como fosse.<br />

Eles acertaram: não resolvi o mistério, mas a figura do “sheik-espirro”, ali se contrapondo<br />

ao maior império do mundo, mesmo debochando do maior ícone da cultura anglosaxônica,<br />

até hoje habita o meu imaginário de independência. Recentemente ouvi-o<br />

falar na ONU e, não sem risos, constatar <strong>que</strong> seu intérprete chegou a passar mal e<br />

abandonar a interpretação, pois o discurso excedeu de longe os 90 minutos máximos<br />

protocolares. Vítima desse “realismo socialista”, o pobre intérprete foi hospitalizado por<br />

exaustão.<br />

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