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68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

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A revolução islâmica no Irã, em seus anos mais ferrenhamente nacionalistas, pairava<br />

sobre Londres deixando a aliança anglo-americana em estado de alerta. A China quieta,<br />

de olho no seu futuro.<br />

Eu? Eu, pacata cidadã, vivendo exilada no reino de Sua Majestade, fã de 007, fazia o <strong>que</strong><br />

podia. Defendia (ou tentava defender) os trabalhadores migrantes e imigrantes das<br />

garras do preconceito de classe, raça, gênero, cultura, religião, orientação sexual e<br />

quantos outros houvesse. De aí, o meu contato estreito com o mundo muçulmano.<br />

A imigração britânica era implacável. Nunca conheci terrorismo pior do <strong>que</strong> o praticado<br />

todos os dias, todas as horas, por parte da<strong>que</strong>les funcionários públicos <strong>que</strong> se julgavam<br />

porteiros do Éden (só <strong>que</strong> haviam se es<strong>que</strong>cido de pedir licença a Hermes, titular do<br />

posto!). Quando um deles desertou, anos mais tarde, vim a saber da seguinte história:<br />

618<br />

“...Um dia, estava de serviço em Heathrow quando uma grande família árabe se<br />

aproximou do púlpito em <strong>que</strong> me encontrava. O chefe deles entregou-me os<br />

passaportes e, ao conferi-los, verifi<strong>que</strong>i <strong>que</strong> faltava um. Tratava-se obviamente<br />

de uma família muito rica e, educadamente, perguntei pelo passaporte do<br />

homem <strong>que</strong> vinha vestido em seda, adornado com ouro e portava um anel de<br />

diamantes no dedo anular. Ninguém me respondeu. Aumentei o tom de voz.<br />

Nada. Gritei então:<br />

- P-A-S-S-A-P-O-R-T-E!<br />

O chefe me olhou como se eu estivesse pedindo algo inusitado e decidiu<br />

responder:<br />

-Ele não tem, meu senhor.<br />

-Como é <strong>que</strong> não tem? Todo mundo tem um passaporte!...<br />

-Ele é escravo.<br />

-Escravo? - Engasguei. Fi<strong>que</strong>i tão atônito <strong>que</strong> nem me ocorreu perguntar-lhe<br />

se não <strong>que</strong>ria ser um homem livre, pois segundo a lei inglesa se ele adentrasse<br />

o território britânico, tornar-se-ia liberto! Mas, também com a<strong>que</strong>la seda, o<br />

ouro e os diamantes...<br />

Tremia dos pés à cabeça sem saber como lidar com a<strong>que</strong>la situação. Chamei<br />

meu supervisor e o imbróglio foi resolvido de forma bem prática, à la inglesa:<br />

se o homem era escravo, não tinha passaporte, ninguém saberia <strong>que</strong> entrara no<br />

Reino Unido. Só <strong>que</strong> não conseguiria sair. Argumentei <strong>que</strong> iria tornar-se outro<br />

tipo de escravo, um imigrante ilegal, mas ninguém estava interessado no pobre<br />

(?!) homem, só em resolver o problema do serviço de imigração!”

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