06.05.2013 Views

68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Fazer o quê? Ninguém mais nos <strong>que</strong>ria... Marginalizados, recém fugidos do Chile de<br />

Pinochet, portando um salvo-conduto panamenho, um pedaço de papel <strong>que</strong> insistíamos<br />

em transformar em passaporte (chegamos até a comprar uma capa escrita Passaporte<br />

para nos iludir ainda mais), eu e meu companheiro estávamos aceitando qual<strong>que</strong>r coisa.<br />

Mas não... Tão conformada estava em passar o resto dos meus dias na Bélgica (pelo<br />

menos aprendia francês), <strong>que</strong> resolvi fazer uma brincadeira. Voltei-me para meu<br />

companheiro e disse:<br />

- Sabe de uma coisa? A princesa Ann está passando pelo Panamá, em lua-de-mel e, em<br />

homenagem a ela, deveríamos cumprimentar o cônsul britânico e aproveitar para pedir<br />

um visto de entrada em seu país - (nada sério, é claro, mas já havíamos sofrido tanto, <strong>que</strong><br />

resolvemos nos engajar na brincadeira).<br />

E não é <strong>que</strong> deu certo? O cônsul nem discutiu, cobrou-nos US$ 10,00 e mandou carimbar<br />

os “passaportes”. Ficamos perplexos, mas solicitamos nossas passagens para a terra de Sua<br />

Majestade. E lá fomos nós no voo da British Airways, com direito a camarão e lagosta,<br />

para Londres, onde aterrissamos com um frio de rachar e um breu digno de filme de<br />

vampiros.<br />

Tudo era muito estranho. As pessoas todas enroladas em seus sobretudos elegantes,<br />

muitos negros nas ruas exibindo roupas finíssimas (aqui no Brasil, na época, negro, o<br />

regime só deixava ser malandro ou favelado...), a<strong>que</strong>la língua <strong>que</strong> eu havia aprendido na<br />

escola e <strong>que</strong> agora me traía. Havia até tan<strong>que</strong>s no aeroporto por conta da greve dos<br />

mineiros em Gales e na Escócia.<br />

Saímos do aeroporto e fomos direto para a Anistia Internacional, instituição <strong>que</strong> entrara<br />

em contato comigo ainda no Panamá. Eram as únicas pessoas <strong>que</strong> “conhecíamos” no<br />

Reino Unido (exceto pela grande surpresa <strong>que</strong> nos aguardava...). Chegamos lá, ficaram<br />

muito contentes em nos ver, foram procurar lugar para ficarmos e eu, então, cansada de<br />

guerra, fui dormir um pouco por<strong>que</strong> a viagem transatlântica arrebentara comigo.<br />

Mas não é <strong>que</strong>, no meio do meu sono, a inglesinha lá me acorda, dizendo <strong>que</strong> havia<br />

alguém <strong>que</strong> <strong>que</strong>ria falar comigo ao telefone. Fi<strong>que</strong>i “pra lá de” cabreira, pois não conhecia<br />

ninguém, mas ela me garantiu <strong>que</strong> a pessoa chamara pelo meu nome. Caramba, pensei,<br />

só pode ser da polícia (a paranóia também era muito comum na época...)! Mas fui atender.<br />

614

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!