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68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

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De uma feita, nos ordenaram – um grupo de dez homens – <strong>que</strong> os acompanhássemos aos<br />

porões para carregar alguns colchões <strong>que</strong> seriam usados pelos oficiais. Logo ao descer os<br />

primeiros degraus, passamos mal com o forte cheiro de sangue coagulado <strong>que</strong> impregnava<br />

a<strong>que</strong>le espaço subterrâneo. Em um longo corredor, havia um enorme monte de cadáveres<br />

empilhados uns sobre os outros. A maioria estava completamente irreconhecível, com<br />

toda a cabeça esmagada, com feridas tão grandes no peito e no abdômen – maiores do<br />

<strong>que</strong> o tamanho de uma mão – <strong>que</strong> dava para enxergar as entranhas.<br />

Fora do estádio, juntavam-se pais e parentes dos prisioneiros, uma gigantesca massa de<br />

gente, angustiados e temerosos com a sorte de seus entes <strong>que</strong>ridos. Muitos dos <strong>que</strong> eram<br />

esperados lá fora não estavam mais vivos. Os soldados receberam ordens de atirar contra<br />

o povo.<br />

Havia, no estádio, um pára-<strong>que</strong>dista, sargento das famosas “forças especiais” (treinadas<br />

em tortura e técnicas de terror no Panamá, financiadas pela CIA). Ele tinha o apelido de<br />

Toro e era especialista em <strong>que</strong>brar cabeças a coronhadas de fuzil.<br />

Após cinco dias na<strong>que</strong>le cárcere, recebemos, como único alimento, alguns goles de água.<br />

Nossos corpos estavam enfra<strong>que</strong>cidos e muitos desmaiavam – sobretudo os velhos e<br />

doentes – e, imediatamente, eram executados por esse “crime”. Fi<strong>que</strong>i com a boca cheia<br />

de feridas por causa da acidez estomacal causada pela falta de comida.<br />

Quinta noite CoMo Prisioneiro<br />

Na quinta noite de prisão, recebemos ordem de, mais uma vez, entrar nos ônibus.<br />

Puseram-nos de joelhos entre os bancos, com as cabeças nos assentos, para não sermos<br />

vistos pelo lado de fora. Estávamos a caminho de onde teríamos uma permanência mais<br />

longa, mas não menos angustiante e arriscada, nossa última parada: o Estádio Nacional,<br />

o campo de futebol mais popular do Chile, cujas arquibancadas nunca antes se lotaram<br />

de pessoas submetidas a tão terríveis circunstâncias.<br />

O grupo do qual eu, agora, fazia parte compunha-se de cerca de duzentos prisioneiros,<br />

quase todos trabalhadores. Havia, também, alguns estudantes estrangeiros, convidados<br />

pela Universidade do Chile. Fomos trancafiados em um exíguo compartimento <strong>que</strong> dava<br />

para um pe<strong>que</strong>no pátio, do lado de fora das arquibancadas, da qual ficávamos separados<br />

por uma enorme grade de ferro <strong>que</strong> garantia nosso cativeiro.<br />

<strong>68</strong> a geraçao <strong>que</strong> <strong>que</strong>ria mudar o mundo: <strong>relatos</strong> relaToS - CHile 569

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