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68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

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<strong>que</strong> era aplicada rigorosamente. Este enterrava os restos do fogão e das cinzas. A<strong>que</strong>le<br />

recolhia os grampos da barraca, ao desmontá-la; ou com a pá de sapa, enterrava suas<br />

bordas no terreno, ao armá-la. Como não havia latrinas, a ida “ao bos<strong>que</strong>” era feita com<br />

a ferramenta de sapa, <strong>que</strong> eliminaria as “provas” da presença do aprendiz de guerrilheiro<br />

ou de montanhista.<br />

As matas da região, exibindo árvores aparentemente seculares e portentosas, alternavamse<br />

com descampados, clareiras <strong>que</strong> desciam ravinas abaixo, aparentemente produzidas<br />

por incêndios. Pedro, <strong>que</strong> era da região, esclarecia <strong>que</strong> tanto eram fruto dos raios na mata<br />

seca quanto da destruição por fazendeiros. O vento noroeste, <strong>que</strong> nos sacudia o corpo,<br />

era ali responsável por parte de tudo, inclusive da inclinação das árvores menos poderosas.<br />

Por toda parte, denotavam-se as marcas da escavação milenar dos ventis<strong>que</strong>ros. Cada<br />

esquadra de marcha possuía uma barraca, um fogareiro a álcool, duas pás, uma picareta,<br />

uma cavadeira de ferro inteiriço, e dois cobertores. Com um deles se forrava o piso da<br />

cabana e outro “cobria”, ou deveria antes cobrir seus cinco “proprietários”... Portanto,<br />

utilizava-se todo o tipo de manha ou mandriice para “ficar com seu pedaço” de cobertor.<br />

Embora a composição das esquadras houvesse sido fixada na base de partida, ao longo<br />

da marcha, elas foram-se refazendo, de acordo com amizades <strong>que</strong> vinham do curso ou<br />

criadas na marcha. Esta pe<strong>que</strong>na indolência era tolerada pelo comando, chegando ao<br />

extremo de La Loca (Alda) haver “morado”, ao fim da marcha, em todas as esquadras.<br />

Lagos, como o Riñihue, o Calafquén ou o Panguipulli, exerciam verdadeiro fascínio nos<br />

caminhantes, talvez só superado pelas pirâmides magníficas dos vulcões. As povoações,<br />

os casarios ou as granjas eram, cuidadosamente, evitados. Um ou dois elementos eram<br />

mandados para efetuar “compras”, em busca de vinho, um pedaço de carne, algum tipo<br />

de aguardente, etc. Luís, chileno, trocou uma bela faca por dez litros de vinho, por<br />

exemplo, perto de Carriringue. Qual<strong>que</strong>r reforço alimentar era devorado de uma só vez.<br />

Para se ter ideia, ñachi, <strong>que</strong>, no começo da marcha, era assunto de gourmets especialistas,<br />

foi, dias depois, devorado no jantar por todos. (Trata-se de sangue cru de cordeiro com<br />

sal e muita pimenta...)<br />

Quando o corpo é, dessa forma, submetido a duro castigo, reforça-se o sentimento de<br />

solidariedade, ao menos na maioria das pessoas. No entanto, todos se tornavam<br />

verbalmente mais cruéis. Reforçam-se as estórias escabrosas, insulta-se mais ao inimigo,<br />

etc. Certamente, é uma forma de descarregar a tensão gerada pelas dificuldades. Eram,<br />

assim, fabricadas pilhérias em série com os ridículos governantes da América Latina.<br />

Detalhes escabrosos da vida particular deste ou da<strong>que</strong>le haviam – verdadeira ou<br />

falsamente – chegado aos ouvidos de membros da<strong>que</strong>le grupo. Fulano era homossexual<br />

<strong>68</strong> a geraçao <strong>que</strong> <strong>que</strong>ria mudar o mundo: <strong>relatos</strong> relaToS - CHile 557

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