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68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

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espalhei as crianças em casas de parentes. Um dia recebi um aviso de <strong>que</strong> Zé Maria estava<br />

na embaixada da Bolívia esperando o salvo-conduto para poder viajar para lá. Eu ia<br />

diariamente à embaixada e levava alguns de nossos filhos. No dia 3 de julho de 1964, ele<br />

partiu para o exílio no mesmo grupo do José Serra (ex-ministro da Saúde, no governo<br />

Fernando Henri<strong>que</strong>), <strong>que</strong> era presidente da União Nacional dos Estudantes. O aeroporto<br />

Santos Dumont estava cercado por militares. Eu e os meninos tivemos pouco tempo para<br />

nos despedir. A imagem <strong>que</strong> ficou foi a de uma foto belíssima dos filhos abraçando os<br />

pais, publicada no Jornal do Brasil.<br />

Com medo de perder meu emprego, voltei para Belo Horizonte com a meninada. Meu<br />

salário não dava para sustentar a família. Fui vendendo tudo na bacia das almas: as<br />

máquinas do jornal, as coisas da casa, um terreno.<br />

A sorte é <strong>que</strong> tive inúmeras manifestações de solidariedade. Minha mãe deixou o Rio<br />

para morar comigo, a família do Zé Maria me apoiava. Quando as crianças perguntavam<br />

pelo pai, eu dizia <strong>que</strong> ele voltaria logo, não deixava a peteca cair. Um dia um amigo do<br />

Hélio disse a ele: “Seu pai está exilado por<strong>que</strong> roubou a carteira de um general”. Hélio<br />

respondeu: “Meu pai está exilado por<strong>que</strong> é comunista”. Eles sempre tiveram muito<br />

orgulho do Zé Maria. No primeiro Dia dos Pais depois do golpe, a revista O Cruzeiro<br />

publicou uma reportagem com o título Nossa vida sem papai, mostrando as famílias<br />

dos exilados. Lá estava a minha foto cercada pelos filhos.<br />

Zé Maria começou a trabalhar em um jornal em La Paz. Ele me pediu para ir encontrá-lo,<br />

para a gente alugar uma casa e só depois levar as crianças. Comemorei com elas em um<br />

par<strong>que</strong>, com sanduíches e refrigerantes. Deixei os sete com minha mãe e viajei. A Bolívia<br />

vivia um momento complicado, com greves e ameaça de golpe militar. Foi só a gente<br />

começar a procurar a casa <strong>que</strong> começaram os disparos nas ruas. Um golpe derrubou o<br />

presidente Victor Paz Estenssoro e uma junta militar assumiu o poder. O sonho de reunir<br />

a família teve de ser adiado. Zé Maria tinha <strong>que</strong> ir embora por<strong>que</strong> o jornal em <strong>que</strong><br />

trabalhava apoiava o presidente deposto. Fugiu para o Chile, país <strong>que</strong> acolheu muitos<br />

brasileiros. Voltei para Belo Horizonte e passei quase um ano sem saber o <strong>que</strong> seria de<br />

nós, até <strong>que</strong> recebi um recado do Zé Maria pedindo para eu preparar a mudança para<br />

Santiago.<br />

Era dezembro de 1965. Senti um aperto no coração, o meu exílio iria começar. No avião<br />

<strong>que</strong> me levou a Santiago, meus filhos, lourinhos, chamavam a atenção. Os três mais<br />

novos ainda tomavam mamadeira, os mais velhos me ajudavam com os pe<strong>que</strong>nos. O<br />

<strong>68</strong> a geraçao <strong>que</strong> <strong>que</strong>ria mudar o mundo: <strong>relatos</strong> relaToS - exÍlio 523

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