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68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

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Depois de uma simulação de fuzilamento no terraço do prédio, trouxeram as três<br />

mulheres para o apartamento, onde houve tentativa de estupro. Os homens foram<br />

capturados e levados ninguém sabia para onde. Violência. Terror.<br />

Nós, três meninas, duas irmãs e eu cunhada, empurradas pelos carabineiros até a porta<br />

do apartamento. Acho <strong>que</strong> a porta tinha batido. Não tínhamos a chave para entrar. O<br />

Capitão Gallardo, chefe dos policiais, mete a mão no bolso, puxa um volumoso molho de<br />

chaves e experimenta uma a uma. Logo encontra uma chave <strong>que</strong> abre a<strong>que</strong>la porta, para<br />

nosso espanto! Terror. Terror com muitos erres. Lilliam, Leyla e Eli. Sós. Sem SOS.<br />

Aprendi, na<strong>que</strong>le dia 12, o verdadeiro significado da expressão “tremer de medo”. O corpo<br />

todo treme, especialmente as pernas. Para manter-se em pé, ou para disfarçar tal<br />

constrangimento, a solução é encostar ou apoiar uma parte do corpo na parede, caso<br />

seja possível.<br />

Dias depois, fizemos várias tentativas de entrar em alguma embaixada. Vãs. As embaixadas<br />

estavam cercadas de policiais. A companheira Nazareth nos levou à Cruz Vermelha<br />

chilena. Eu ganhei um papel, <strong>que</strong> conservo até hoje, <strong>que</strong> equivaleria a uma identidade,<br />

onde constava <strong>que</strong> estava sob a proteção, da instituição <strong>que</strong> chamávamos “Cruz Roxa”,<br />

em castelhano Cruz Roja. Todo tempo barulho de tiros, rajadas, bombas. Tan<strong>que</strong>s nas<br />

ruas.<br />

Soubemos, mais tarde, <strong>que</strong> os meninos tinham sido levados para o Estádio de Chile e,<br />

posteriormente, para o Estádio Nacional. Não havia certeza de nada. Somente sabíamos<br />

<strong>que</strong> nesse Estádio havia maior concentração dos presos <strong>que</strong> tinham sido se<strong>que</strong>strados em<br />

Santiago. Consultei centenas de listas pregadas nos portões do Estádio Nacional,<br />

praticamente, cercado por carabineiros e soldados. Jamais encontrei os nomes dos nossos<br />

<strong>que</strong>ridos nas várias vezes <strong>que</strong> estivemos na porta da<strong>que</strong>le Estádio. Centenas de pessoas<br />

procuravam familiares e amigos, não obstante a apreensão e o medo. Levamos roupas,<br />

comida, escovas de dente e sei lá mais o quê. Entregamos esses objetos às mulheres da<br />

Cruz Vermelha Eles nunca receberam tais provisões. Estrondos. Rajadas.<br />

Não tínhamos quais<strong>que</strong>r notícias dos <strong>que</strong>, supostamente, estavam presos. Estariam,<br />

realmente, presos? Onde? Estavam vivos? Olhos arregalados. Tinha muito medo de ir lá,<br />

no Estádio, pois não tinha documentos, já <strong>que</strong> os carabineiros levaram meu passaporte.<br />

Portava a<strong>que</strong>le papel da Cruz Vermelha <strong>que</strong>, na realidade, não valeria nada, na<strong>que</strong>las<br />

<strong>68</strong> a geraçao <strong>que</strong> <strong>que</strong>ria mudar o mundo: <strong>relatos</strong> relaToS - exÍlio 509

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