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68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

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Todos os detalhes dessa história nunca foram conferidos, mas há, pelo menos, indícios de<br />

<strong>que</strong> o veículo deixara a UnB na hora do almoço. Entretanto, vai tentar explicar esses<br />

fatos todos para os homens da repressão nu, debaixo de um chuveiro de água fria e<br />

levando bordoadas, socos e pontapés!<br />

A temporada no DOPS foi curta e a tortura relativamente leve e esporádica. Três dias<br />

depois da minha prisão, num domingo à tarde, fui posto em liberdade sem maiores<br />

explicações. A polícia tinha mudado a sua tática e agora pensava em me transformar em<br />

isca para alcançar seus propósitos. Saí do DOPS apavorado, com dores no corpo inteiro,<br />

alguns hematomas, levando uma ideia fixa: “preciso deixar Brasília imediatamente”. Eu<br />

estava completamente convencido de <strong>que</strong> a repressão dentro de muito pouco tempo iria<br />

me identificar como militante da AP e, nesse caso, as perguntas seriam outras e um<br />

pouco mais difíceis.<br />

Menos de vinte e quatro horas depois de liberado pelo DOPS em Brasília, eu estava na<br />

Pauliceia. A viagem só foi possível graças a um es<strong>que</strong>ma de segurança <strong>que</strong> eu mesmo<br />

havia montado para saída de quadros da AP de Brasília em caso de emergência. Um único<br />

telefonema. Um funcionário do Tribunal de Contas totalmente desconhecido para mim<br />

apanhou-me no seu carro na rodoviária de Brasília e me deixou em Anápolis. Dali, segui<br />

para Goiânia em outro veículo com uma funcionária do Banco do Brasil, também ela<br />

desconhecida. De Goiânia para São Paulo fui de ônibus regular.<br />

Começo de junho, uma garoa chata caindo de vez em quando. À noite, já fazia um bom<br />

friozinho e eu, agora em São Paulo, sem lenço e sem documento.<br />

Durante os doze meses em <strong>que</strong> morei em São Paulo, só pude sobreviver graças ao apoio,<br />

à solidariedade e à generosidade de muitos amigos, companheiros e familiares. Sem isso<br />

não teria sido possível ficar por lá. Vale lembrar especialmente a solidariedade e o apoio<br />

dos pais da minha namorada da<strong>que</strong>les tempos: ele, deputado federal pelo MDB e ela,<br />

professora da USP. Acolheram-me em sua casa sem restrições. Continuo extremamente<br />

agradecido a todos a<strong>que</strong>les amigos, companheiros e familiares <strong>que</strong> me deram casa,<br />

comida, dinheiro e muito mais numa época em <strong>que</strong>, o simples fato de permitir <strong>que</strong><br />

alguém perseguido pela ditadura dormisse na sua casa já poderia ser o suficiente para<br />

<strong>que</strong> você fosse enquadrado na Lei de Segurança Nacional.<br />

Emprego regular não era possível, só no mercado negro, pois faltava documentação.<br />

Estudar matriculado em escola nem pensar. Moradia? Complicada. Durante a minha<br />

<strong>68</strong> a geraçao <strong>que</strong> <strong>que</strong>ria mudar o mundo: <strong>relatos</strong> relaToS - reTiraDaS 485

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