06.05.2013 Views

68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

houvesse, deveria ser levado a efeito no Brasil e não vindo de Cuba. Não tinha sentido<br />

racharmos na Ilha e, em seguida, voltar ao Brasil, procurando contatos <strong>que</strong> não sabíamos<br />

como estavam. Não tinha sentido sermos compartimentados da ALN e deixar de discutir<br />

com os companheiros <strong>que</strong> lá estavam e não tinham noção de nossas posições.<br />

Entramos a Gastone no Natal de 71 e eu no Ano Novo 71/72. Fomos para um “aparelho”<br />

do Lana com a Bela Morena. Lá, ficamos alguns dias até <strong>que</strong> alugamos, em um cortiço na<br />

Mooca, um quarto e cozinha separados, com banheiro coletivo. Começamos a viver o<br />

novo clima de clandestinidade, período de pouco dinheiro, muita repressão e <strong>que</strong>das sem<br />

explicação plausível. A classe média <strong>que</strong> nos recebia com carinho e admiração, na<strong>que</strong>le<br />

momento, nos evitava o <strong>que</strong> podia, por medo da polícia. Ao mesmo tempo, envolvia-se<br />

com a ilusão do “milagre econômico”. Tal cho<strong>que</strong> de realidade os <strong>que</strong> retornavam da Ilha<br />

tinham <strong>que</strong> assimilar, para sua própria sobrevivência.<br />

Transcorriam os primeiros dias de 72, eu e a Gastone fomos integrados ao Grupo Tático<br />

Armado (GTA) de <strong>que</strong> o Lana era o coordenador. Tínhamos um “ponto” por dia com o<br />

Lana e procurávamos conhecer São Paulo. Algumas vezes, encontrávamos o Aimberê <strong>que</strong><br />

era da Coordenação Nacional e aproveitávamos para nossas discussões políticas, sempre<br />

em desacordo. Ele, talvez, impossibilitado pela realidade e eu ainda sem a noção exata de<br />

nossa situação.<br />

No dia 18 de janeiro de 72, tivemos a <strong>que</strong>da de um casal de companheiros. Um deles, o<br />

Churrasquinho, abriu o ponto de segurança <strong>que</strong> tinha com seu Coordenador de GTA e<br />

tivemos dois companheiros mortos no dia 20 de janeiro, um dos quais era muito amigo<br />

da Gastone. Tinham um carinho muito especial um pelo outro. No dia 21, quando lemos<br />

as manchetes dos jornais e soubemos de maiores detalhes com o Lana, a Gastone passou<br />

a chorar muito, inconsolável, chamava a atenção dos <strong>que</strong> por nós passavam e, como<br />

éramos procurados, deveríamos passar como invisíveis na sociedade, chamar a atenção,<br />

nem pensar. Mas o <strong>que</strong> fazer?<br />

Nessa noite, fi<strong>que</strong>i lendo todas as notícias para nós dois e fazendo carinho nela, assim ela<br />

dormiu. No dia seguinte, 22 de janeiro, fomos para nosso ponto diário com o Lana.<br />

Acordei extremamente nervoso. Tosse difícil de controlar. Esse é meu sintoma, a<br />

manifestação de quando sinto <strong>que</strong> algo não vai bem. Neste encontro, ele me disse <strong>que</strong><br />

iríamos cobrir os pontos de segurança dos companheiros <strong>que</strong> faziam parte dos GTAs dos<br />

companheiros mortos. Nosso carro parecia um arsenal de guerra, fuzil, metralhadora,<br />

bombas diversas, muita munição, fora nossas armas pessoais.<br />

<strong>68</strong> a geraçao <strong>que</strong> <strong>que</strong>ria mudar o mundo: <strong>relatos</strong> relaToS - PriSõeS / ViolÊNCia iNSTiTUCioNal / Terror De eSTaDo 423

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!