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68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

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Era difícil conseguir abrigo na<strong>que</strong>les tempos, pois <strong>que</strong>m colaborava era preso e torturado.<br />

Além disso, quase todos os nossos amigos e conhecidos também estavam sendo<br />

procurados ou já estavam presos.<br />

Assim <strong>que</strong> saí da prisão, fi<strong>que</strong>i na casa de alguns companheiros. Para meu azar, eles não<br />

se encontravam no melhor estado. Mas não tínhamos escolha. Quando saí dali, fui para<br />

casa dos pais de um antigo namorado <strong>que</strong> vieram, espontaneamente, oferecer<br />

hospedagem, assim <strong>que</strong> souberam da situação. Eles eram apenas simpatizantes e, por<br />

isso, eu corria menos perigo. Fi<strong>que</strong>i por lá talvez uns dois meses sem colocar a cabeça pra<br />

fora de casa. Primeiro, para não levantar suspeitas dos vizinhos e, segundo, para não<br />

colocar em risco a própria segurança dos meus anfitriões.<br />

As notícias de estouro de aparelhos e de novas prisões se sucediam. A situação estava<br />

ficando cada vez pior. Muitos começaram a deixar o país. Mas eu e meu marido, Lincoln<br />

Bicalho Ro<strong>que</strong>, éramos do PC do B, partido <strong>que</strong> optou por ficar no país e resistir. Nessa<br />

época, a Guerrilha do Araguaia já estava em franco desenvolvimento.<br />

Nossa casa, minha e de Lincoln, em São Cristóvão, caiu. Além da minha prisão, havíamos<br />

emprestado a casa para várias reuniões importantes e os vizinhos, em particular uma<br />

vizinha, conseguiu avisar-nos de <strong>que</strong> a “polícia” (como ela dizia) já tinha ido ao nosso<br />

endereço várias vezes. Deixamos a casa com todos os nossos pertences e a recomendação<br />

para <strong>que</strong> os novos ocupantes dessem um destino para nossas coisas. Doeu, pois montamos<br />

esta casa quando nos casamos, em janeiro de 1967.<br />

Era 1970 e fomos morar em Botafogo. Eu já estava grávida. A repressão cada vez mais<br />

organizada e impiedosa. O Lincoln foi obrigado a deixar todos os seus trabalhos, inclusive<br />

o de sociólogo do SESC. Todas as despesas da casa passaram a correr por conta das<br />

minhas duas matrículas como professora, uma primária e outra de ensino médio. Quando<br />

a repressão apertava muito, conseguia licença médica, pois um médico no órgão,<br />

simpatizante do movimento, conseguia licença para os funcionários públicos. Além disso,<br />

contava com a simpatia velada dos diretores e professores das escolas nas quais<br />

trabalhava. Na verdade, bem mais simpatia em uma das escolas <strong>que</strong> em outra.<br />

A recomendação era <strong>que</strong> nossa casa em Botafogo funcionasse como um “aparelho”:<br />

ninguém poderia ter conhecimento de onde morávamos. A única visita permitida era a<br />

da minha mãe, após muitos cuidados. Na verdade, aconselharam <strong>que</strong> eu largasse os<br />

empregos... Mas como? Quem iria nos sustentar? E a criança <strong>que</strong> estava para nascer?<br />

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