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68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

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Fomos fechados e retirados do carro por homens armados. Juntou gente pra assistir à<br />

cena. Eram sinais dos tempos e na<strong>que</strong>les tempos esses sinais eram visíveis. Bastava olhar.<br />

Eram agentes de segurança.<br />

Ficaram com nossos documentos e nos intimaram: “Vocês compareçam amanhã ao<br />

meio-dia à delegacia de Pilares. Ou serão caçados (com ç) até o fim”.<br />

Apresentamo-nos e saímos dali direto para a prisão, na base Aérea do Galeão. Era maio<br />

de 1971. Eu tentava entender, não entrar em pânico e me perguntava o motivo de tudo<br />

aquilo – passeata? Reunião com algum militante? Curso do Gabeira? Ter estado na<br />

Rússia? Bem, por muito menos as pessoas costumavam sumir na<strong>que</strong>la época. Do Galeão,<br />

quatro dias depois, fomos para a PE (Barão de Mesquita). As razões da<strong>que</strong>le aparato todo<br />

eu só saberia – e entenderia – muito tempo depois, já em liberdade.<br />

É <strong>que</strong> na<strong>que</strong>la tarde no hospital, uma militante sentiu <strong>que</strong> ia ser presa ali na praça –<br />

cercada – e jogou-se frente a um ônibus. Deu entrada no Carlos Chagas levada pelos<br />

agentes de segurança e, forçada a revelar com <strong>que</strong>m ia se encontrar, inventou uma<br />

descrição <strong>que</strong> combinava com a nossa. Estava explicada, portanto, a razão de termos sido<br />

presos. A<strong>que</strong>les dias na prisão foi como perder a tramontana, mas não se tornou pesadelo<br />

na minha memória. Foi um episódio e como tal foi vivido. Assim mesmo, nunca es<strong>que</strong>ci<br />

dos gritos <strong>que</strong> ouvi. Pareciam inumanos, desesperados, assustadores.<br />

Anos mais tarde conheci a militante – Inês Etienne Romeu. Fomos vê-la (Elias Fajardo,<br />

Márcia de Almeida, Lucia Romeu, Ana Vianna e eu) no Talavera Bruce, onde fizemos uma<br />

grande entrevista para O Pasquim, em <strong>que</strong> Inês contava tudo o <strong>que</strong> tinha lhe acontecido.<br />

Inês era lúcida, forte e com senso de humor. Uma grande figura. Não me es<strong>que</strong>ço das<br />

palavras dela na saída do Talavera Bruce:<br />

Eu inventei uma amiga para “os homens” e ela acabou virando verdade.<br />

Nunca mais a revi. Mas torço para <strong>que</strong> esteja bem.<br />

Acredito <strong>que</strong> toda geração tem sua própria grandeza e acho <strong>que</strong> foi Marx <strong>que</strong>m disse: “O<br />

homem faz a História sem saber, traçando seus rumos no cotidiano”. Penso <strong>que</strong> ele tinha<br />

razão. Sobretudo por<strong>que</strong>, num regime <strong>que</strong> enxergava comunistas em qual<strong>que</strong>r esquina,<br />

numa época em <strong>que</strong> se começavam a definir caminhos, esses protagonistas de <strong>68</strong> lutaram<br />

3<strong>68</strong>

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