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68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

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viesse a ser restabelecido. Mas, na verdade, os patrões não iriam respeitar o trato.<br />

Elaboraram uma lista de gente para ser demitida.<br />

Chegando em casa, a minha mãe comentou essa maldade durante o jantar. Mal sabia ela<br />

<strong>que</strong> eu estava fazendo parte de uma célula operária e <strong>que</strong> me sentira indignada com a<br />

traição dos donos da fábrica. Levantei da mesa, liguei para um companheiro e fomos nos<br />

encontrar para redigir um panfleto denunciando essa pouca vergonha. Eu redigi o<br />

panfleto. No outro dia, pela manhã, alguns companheiros o distribuíram na porta da<br />

fábrica. Os operários, indignados, entraram em greve. O diretor, irritadíssimo, chamou os<br />

dois assessores <strong>que</strong> tinham ouvido a conversa no dia anterior sobre a demissão. Um deles<br />

era minha mãe. Ela, inocente, jurou <strong>que</strong> não havia falado para ninguém. Jamais imaginaria<br />

<strong>que</strong> sua filha tivesse qual<strong>que</strong>r participação nesse assunto. Em casa falou do acontecido<br />

e disse <strong>que</strong> estava ameaçada de perder o emprego. Eu fi<strong>que</strong>i transtornada, mas calada,<br />

nada podia dizer. Ela contou <strong>que</strong> os operários entraram em greve depois <strong>que</strong> leram um<br />

panfleto muito bem escrito denunciando a manobra dos patrões. Eu a indaguei:<br />

- E se a senhora perder seu emprego?<br />

Ela respondeu-me:<br />

- Eu arranjo outro. Na verdade, depois <strong>que</strong> li o panfleto fi<strong>que</strong>i com vontade de entrar em<br />

greve também. Não gosto de injustiça.<br />

E viva essa mãe coragem <strong>que</strong> teve, dois anos após esse episódio, quatro filhos presos pela<br />

ditadura, <strong>que</strong> enfrentou os chefões dos cárceres com a bravura de uma mulher guerreira.<br />

Quando voltou do Chile, em 1971, onde foi visitar o túmulo de seu filho mais velho, o<br />

poeta José de Oliveira Falcón, ela foi interrogada sobre o <strong>que</strong> fora fazer na<strong>que</strong>le país. O<br />

governo Allende era considerado comunista pelos militares. Nessa época, eu e meu irmão<br />

Pery estávamos presos na cidade de Recife. Ela não se intimidou. Disse-lhes:<br />

- Fui visitar o túmulo de um brasileiro <strong>que</strong> honrou sua pátria até a morte. Um poeta <strong>que</strong><br />

nunca abandonou os injustiçados de seu país. Que foi obrigado a deixar o Brasil por amor<br />

à liberdade.<br />

Essa valorosa mulher <strong>que</strong> faleceu em março de 2002 chamava-se Bárbara Elvira de<br />

Oliveira Falcon.<br />

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