06.05.2013 Views

68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

68 a Geração que Queria Mudar o Mundo: relatos - DHnet

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

16.2 saQuinHo de Mel - baCuri<br />

Júlio César Senra Barros<br />

Não sou testemunha ocular da tragédia <strong>que</strong> se abateu sobre todos os presos do DOPS/SP<br />

na época do assassinato do Bacuri. Refiro-me aos <strong>que</strong> acompanharam a<strong>que</strong>la farsa<br />

montada para a execução do heroico companheiro Eduardo Leite “Bacuri”. Entretanto,<br />

sofri na pele, sob a forma da mais violenta sessão de torturas por <strong>que</strong> passei no DOPS/Rio<br />

Grande do Sul - quando da minha “<strong>que</strong>da” -, na OBAN/SP - durante os quinze dias de<br />

novembro de 1970 em <strong>que</strong> lá fui interrogado e torturado - e na Polícia do Exército, na<br />

Vila Militar do Rio de Janeiro.<br />

Bacuri, ao ser informado, por um preso <strong>que</strong> entregava a comida nas celas, o Gaúcho, ou<br />

Peruquinha, como era conhecido, a respeito da notícia da sua fuga plantada no jornal,<br />

enviou para cada cela um pacotinho, um sachê de plástico flexível, como um travesseirinho<br />

de mel, <strong>que</strong> foi colado com esparadrapo nos calendários <strong>que</strong> existiam em todas as celas.<br />

Quando eu e meus companheiros chegamos no DOPS/SP, já encontramos o referido<br />

pacotinho de mel nas celas. O próprio Gaúcho explicou-nos a origem do referido<br />

saquinho, assim como a triste história do companheiro morto em vida e da revolta<br />

desesperada dos presos na noite de sua retirada da cela forte onde ele se encontrava.<br />

Após uma revista às celas, o calendário foi apreendido e eu, aleatoriamente, fui levado<br />

para as devidas “explicações” sobre o marco <strong>que</strong> a repressão já sabia <strong>que</strong> significava o dia<br />

da saída do “Bacuri” para o seu martírio e morte.<br />

Como nós não estávamos nas dependências do DOPS na época em <strong>que</strong> o Bacuri foi<br />

arrastado da cela, segui tranquilo, pois já tinha passado da fase do pau, pela OBAN, e<br />

possuía uma história bem montada sobre a minha militância em São Paulo. Foi minha<br />

surpresa quando comecei a ser agredido ainda no elevador, pelo policial <strong>que</strong> não se<br />

conformava com o meu desconhecimento da autoria da<strong>que</strong>la “tremenda afronta à<br />

ditadura”, <strong>que</strong> se considerava imune e acima de qual<strong>que</strong>r versão <strong>que</strong> não fosse a oficial.<br />

Assim <strong>que</strong> cheguei à sala de interrogatório a equipe já estava preparada para todo o tipo<br />

de atrocidades. Colocaram-me, imediatamente, no “pau de arara”, devidamente ligado<br />

aos fios elétricos nas orelhas e no pênis, com sessões ininterruptas, além de chutes nas<br />

<strong>68</strong> a geraçao <strong>que</strong> <strong>que</strong>ria mudar o mundo: <strong>relatos</strong> relaToS - PriSõeS / ViolÊNCia iNSTiTUCioNal / Terror De eSTaDo 351

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!